Funcionários da Jovem Pan detonam TSE e pedem a cabeça de colegas
Apoiadores de Bolsonaro pedem a cabeça de jornalistas progressistas
Publicado em 01/11/2022 às 18:31,
atualizado em 01/11/2022 às 19:30
A data é 21 de outubro, pouco tempo depois do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) proibir a Jovem Pan de insistir com fake news contra o então candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT). No grupo de WhatsApp de um dos programas de maior audiência da casa, o clima era de revolta, pressão e desrespeito à democracia. "É normal o TSE pode ser usado a favor do PT? Que isso", disse um profissional da direção, mostrando o "respeito" que a cúpula do canal tem pela Corte brasileira.
O NaTelinha teve acesso a diversos diálogos em que há pressão para que os funcionários da JP critiquem a decisão do Tribunal. "Tutinha é coração bom demais, Jesus. Colocar um inimigo dentro da empresa. O cara tenta normalizar a censura contra a própria emissora em que trabalha", diz uma comentarista ligada ao presidente derrotado no último domingo (30).
Embora a Jovem Pan venda a imagem de "a única emissora isenta do país" sob a capa de ter comentaristas voltados para os dois campos ideológicos políticos, na prática não é o que se vê. A direção do canal vem sendo pressionada para demitir profissionais ligados ao campo progressista e quem faz a pressão são comentaristas próximos ao presidente Jair Bolsonaro (PL). Ao mesmo tempo em que os próprios diretores usam de pressão para definir qual deve ser a opinião de seus contratados.
Em outro trecho, uma das chefes é ainda mais enfática na pressão. "É sério que vocês vão defender o TSE? É sério que vão minimizar? Cadê o tesão pelo trabalho?", pede. O caso em que ela cita é o do momento em que o Tribunal proibiu a Jovem Pan de praticar fake news contra Lula. Mesmo que a cúpula da emissora tenha tratado o caso como censura, juristas confirmam que não foi o que aconteceu e que o canal poderia até ter sido tirado do ar.
Comentaristas pedem a cabeça de colegas na Jovem Pan
A pressão, no entanto, é o de menos. A reportagem conversou com três ex-funcionários da Jovem Pan que confirmaram a mesma prática. Um comentarista influente e que já foi até preso costuma pedir a cabeça de rivais diretamente para o proprietário. Esse jornalista teria acesso facilitado a Tutinha, o dono da empresa, e sempre é atendido, segundo as fontes ouvidas.
Em uma das histórias ouvidas pela reportagem, foi enviado um vídeo mostrando o climão. Numa discussão a respeito de Lula e Bolsonaro, o comentarista de extrema-direita ofende o colega com xingamentos e palavras de baixo calão. "Vai tomar no **", diz a plenos pulmões antes de ter o microfone desligado. Este mesmo profissional, em outra ocasião, fez uma jornalista, então colega, chorar no ar por conta de acusações e xingamentos misóginos.
Num dos casos, o jornalista chegou a fazer participações em mais de um programa do canal de notícias, mas sem contrato. Todas as vezes que ele cobrava a assinatura, uma desculpa era dada até que o colega, que o via como inimigo, pediu sua demissão e, com isso, as participações deixaram de acontecer.
Segundo os três ex-funcionários da Jovem Pan ouvidos pela reportagem, este mesmo comentarista teria pedido a cabeça de um dos profissionais demitidos na última segunda-feira (31).
O NaTelinha procurou a Jovem Pan, que acabou por não respondendo as questões. Embora a emissora tenha enviado uma declaração formal (leia no final da reportagem), não houve respostas para perguntas importantes. A reportagem questionou por que diretores da emissora ligaram o TSE ao PT e incentivaram ao não-cumprimento de ordem judicial, também foi perguntado se houve pressão para comentaristas chamarem de censura a decisão. O canal preferiu atacar seus profissionais demitidos.
Jovem Pan promove caça às bruxas
De acordo com fontes ouvidas pela reportagem, as demissões feitas pela Jovem Pan é para evitar atrito com o STF (Supremo Tribunal Federal). Mas nos bastidores todos concordam que trata-se de um jogo de cena e uma oportunidade para se livrar de profissionais mais questionadores e que não são queridos por quem tem maior ascensão com o dono e os diretores.
Embora haja a possibilidade de que outros nomes ligados à extrema-direita sejam demitidos em breve, funcionários confirmaram que o viés de ultradireita vai continuar. Porque os dois principais comentaristas, o que pede a cabeça de todos e o outro, que mora fora do país, continuam aterrorizando colegas nos bastidores.
O clima nos corredores da Jovem Pan é de velório. Ao menos dois dos demitidos recentemente eram muito queridos e parte da redação gosta de ambos. Diferente das estrelas da emissora, a redação não é adepta de Jair Bolsonaro e continua no emprego por conta do salário, mas reclama do terrorismo para publicar reportagens em favor do presidente. A pressão é tanta que ameaças de desligamento continuam.
Jovem Pan e Bolsonaro
A relação da Jovem Pan com Bolsonaro sempre foi tratada como polêmica. Por mais de uma vez, a emissora foi apontada como bolsonarista, o que sempre foi negado por parte da direção da casa. No início da campanha, em conversa com o NaTelinha, os diretores chegaram a afirmar que abririam espaço isonômico para os dois candidatos em igualdade de condições, inclusive afastando profissionais de extrema-direita das sabatinas.
A relação, no entanto, nunca aconteceu com o petista. Ele se recusou participar das entrevistas e a situação degringolou a ponto do contato entre a Jovem Pan e Bolsonaro ter sido contestado por Lula na Justiça com um pedido de liminar para que o canal oferecesse tratamento igual para ele e Bolsonaro. Isso dias depois do canal levar uma série de aliados do presidente em plena campanha eleitoral.
Leia a íntegra da nota da Jovem Pan
"É lamentável que um ex-colaborador, por frustração, revanchismo ou, pior ainda, de caso pensado, se dê ao trabalho de vazar prints de grupos do trabalho no WhatsApp para veículos de imprensa. Mais lamentável ainda que essas mensagens tenham sido descontextualizadas com a finalidade de criar uma narrativa para descredibilizar a Jovem Pan. Nossa posição em defesa do cumprimento de decisão judicial que nos impôs censura é pública, não havendo necessidade de vazar mensagens de forma maldosa para revelar isso. Esse episódio prova que a rescisão do contrato foi uma medida acertada, além de mostrar que a Jovem Pan está no caminho certo. Só isso explica tanta atenção dada à emissora por veículos de imprensa que deveriam estar discutindo, neste momento, os rumos do país."