Nego do Borel e a insistência de alguns artistas em comprometer o próprio legado
Cantores se envolvem em polêmicas e parecem não se preocupar com a carreira artística
Publicado em 19/01/2021 às 04:00
Status é um conceito que, em Sociologia, abrange o conjunto de direitos e deveres de alguém, portador de determinada posição, dentro de uma sociedade. Pode ser adquirido ou atribuído. É adquirido quando depende do esforço pessoal para a conquista. Ou seja: através de habilidades e capacidades individuais, a pessoa compete com outras e triunfa sobre elas. Já o status atribuído independe da capacidade do indivíduo para a obtenção. Um artista que ralou e que, com talento, garra e muita determinação, conquistou o seu “lugar ao sol” possui status adquirido. O seu parceiro, por sua vez, a título de exemplo, pelo fato de relacionar-se com uma estrela, possui o atribuído. O que esse papo conceitual tem a ver com escândalos recentes envolvendo (e manchando) o nome, a carreira e o legado de alguns artistas brasileiros? Tudo.
De conhecimento geral da nação, o fim do noivado de Nego do Borel e Duda Reis vem dando o que falar desde o final do ano passado. Os últimos dias, então, foram movimentadíssimos: teve vazamento de áudio de suposto romance extraconjugal; acusações de violência doméstica; e denúncias de portes de armas e de grandes quantias de dinheiro. Leno Maycon Viana Gomes (nome de batismo do cantor em homenagem a John Lennon e a Michael Jackson) terá muito trabalho pela frente. Assim como a sua assessoria de imprensa.
Analisando os últimos episódios apenas pelo viés da gestão da reputação, sem entrar no mérito da veracidade das alegações dos envolvidos (trabalho da polícia e da Justiça), uma coisa é fato: a imagem e a carreira de Nego do Borel, não de hoje, vêm sendo implodidas. Assim como aconteceu com Victor Chaves e como também ocorre agora com Arthur Aguiar. Coincidentemente, o cantor e o ator também foram acusados publicamente por ex-cônjuges. Perderam fãs, prestígio, contratos e muito dinheiro. Tiveram os seus nomes manchados e as suas reputações abaladas. Tanto no pessoal, quanto, sobretudo, no profissional.
Alcançar o Olimpo no mundo do entretenimento não é missão das mais fáceis. Muito pelo contrário: é um ato heroico, que demanda uma série de investimentos e, principalmente, de renúncias. É preciso talento, esforço, obstinação, networking, senso de oportunidade e uma boa dose de paciência. Não é rápido, como muitos imaginam. Trata-se de um processo gradativo. Uma carreira artística bem sucedida estará permanentemente em construção.
As polêmicas de Nego do Borel
Eis alguns dos motivos pelos quais, na minha opinião, soa imbecil comprometer tanta dedicação com escândalos da vida pessoal. Ao se associarem a controvérsias gratuitas, alguns artistas podem colocar em risco suas reputações, e, por tabela, comprometerem os seus legados. Os mais inteligentes são exatamente aqueles que preservam a esfera pessoal (ou que expõem o mínimo, sempre de maneira estratégica e muito bem pensada). Me refiro a nomes, por exemplo, como Djavan, Iza, Carlinhos Brown, Roberto Carlos e Marisa Monte. Para esses (e muitos outros), o espetáculo acontece somente e tão somente no palco, sob a luz dos holofotes e os aplausos do público. Eles entenderam que aquilo que “foge” do profissional e descamba para o lado pessoal vira excesso. Ou seja: sobra.
Não é de hoje que Borel se envolve em polêmicas que não agregam em nada à sua carreira. A ele, sugiro a mesma “fórmula” que já propus há algum tempo ao Biel, outro que, volta e meia, se mete em escândalos: reconhecer sinceramente os próprios equívocos, ser genuíno ao lidar com eles, assumir as responsabilidades que lhes forem devidas e, principalmente, adotar um novo comportamento: mais equilibrado, maduro e, acima de tudo, discreto - longe de tumultos.
Nego do Borel tem uma história de vida poderosa: o cantor, compositor, ator e comediante já viveu em situação de extrema pobreza. Chegou a passar fome na comunidade carioca que lhe empresta o sobrenome artístico. Sonhava, aliás, com a carreira na música desde os 10 anos, quando passou a frequentar shows na própria comunidade, pedindo a DJs locais para subir no palco e abrir shows de outros artistas. Com os primeiros cachês como profissional, reformou a casa da mãe e comprou uma prótese dentária (pois tinha quase todos os dentes estragados), destinando o primeiro dinheiro ganho na música para cuidar da saúde bucal. Nego do Borel não é apenas um cantor. Pela história, pelo talento e por todas as conquistas que alcançou na carreira e na vida, o artista traduz o próprio conceito de representatividade. E é justamente em virtude do status que adquiriu, e por tudo aquilo que representa, que deveria cuidar melhor do nome, da carreira e, acima de tudo, do próprio legado.
* Higor Gonçalves é jornalista especializado em personal branding (gestão estratégica de marca pessoal).