Por que a mocinha de Amor Sem Igual não pode se converter?
Mocinha vai virar evangélica no final da novela
Publicado em 10/01/2021 às 08:31
Um dos assuntos mais comentados nas redes sociais nos últimos dias foi o desfecho preparado para a mocinha da novela Amor Sem Igual, da Record. Segundo os spoilers da trama de Cristiane Fridman, Poderosa (Day Mesquita) se converterá ao protestantismo no fim da história e abandonará a vida de prostituição e, por causa disso houve fortes críticas por parte dos usuários da web dando a entender que a decisão da autora foi uma espécie de imposição da emissora, ligada a Igreja Universal do Reino de Deus. Mas, pensando um pouco além da caixa, por que ela não pode se converter ao protestantismo?
O Brasil é o país em que os evangélicos mais crescem percentualmente em relação ao restante da população e estima-se que, em poucos anos, a religião predominante por aqui será o protestantismo. E precisamos ser honestos quando pensamos que praticamente nenhuma novela leva a sério a relação de fé que o brasileiro tem com este mote da crença no cristianismo - que, embora parecida, tem muitos pontos divergentes do catolicismo.
Precisamos lembrar que a Globo, maior produtora de teledramaturgia no Brasil, trata do catolicismo há muitos e muitos anos. Inclusive atualmente o Viva exibe a reprise de Mulheres Apaixonadas, folhetim de 2003 que mostrou as tentações de um padre para se manter na profissão de fé quando apaixonado por uma mulher. E não é só os católicos que são representados dentro da dramaturgia da emissora carioca, outras religiões também o são.
Vale lembrar que, em Joia Rara (2013/2014), um dos momentos mais marcantes da trama foi a oração feita pela menina Pérola (Mel Maia), que era a reencarnação de um monge budista, para a cura de seu avô Ernest (José de Abreu). Podemos citar ainda a atual produção do Globoplay, Desalma, que mostra de uma forma muito peculiar o universo da bruxaria, outra religião.
Quando a Globo decidiu tratar dos evangélicos em suas novelas, quase sempre foi com a caricatura equivocada e que em nada lembra a força da fé que a religião professa no Brasil. Seja em América (2005), com a falsa crente Creuza (Juliana Paes) ou até em Duas Caras (2009), que colocou a primeira música evangélica na trilha sonora de uma novela, mas que mostrava dois evangélicos completamente fora da casinha em seu fanatismo.
É bem verdade que o fanatismo faz parte do credo dos protestantes brasileiros e não se pode negar. Mas Silas Malafaia e afins não são os únicos representantes da religião no país e a segunda maior crença do Brasil precisa ser vista e representada nas nossas novelas porque faz parte da sociedade. Já passou da hora dos autores enxergarem as razões que levam pessoas simples a terem atos impensáveis em nome dessa religião, ao invés de apenas categorizá-los como loucos ou ignorá-los, como quase sempre acontece na dramaturgia.
Ninguém deve ser inocente ao pensar que a Record não tem interesses por trás dessa decisão criativa. Tanto tem que já liberou o QR Code na tela durante os capítulos de Amor Sem Igual, que leva o telespectador diretamente para o site do Templo de Salomão, sede da Igreja Universal do Reino de Deus no Brasil. Uma das maiores organizações evangélicas do país não iria perder a oportunidade de, ao evangelizar por meio da novela, indicar qual o melhor caminho para aqueles que querem se converter.
Independente dessa decisão controversa de fazer propaganda da Igreja dentro da novela, não se pode ignorar que o final de Amor Sem Igual é criativo e inédito na TV brasileira e é inegável que o folhetim pegou. Já tivemos novelas com personagens indo para o convento ou mesmo abraçando seu sincronismo dentro do espiritismo. Qual o problema de um personagem aceitar Jesus e virar evangélico? Qualquer um que veja isso como uma aberração na dramaturgia precisa assumir que sua opinião é apenas e exclusivamente preconceito. Nada além disso.