Opinião

Atuação da Semana: Caio Blat se entrega a papel menor e faz misérias em Mar do Sertão

Ator brinca com personagem que vai de vilania ao humor e passa pela loucura


Cena de Mar do Sertão com Caio Blat
Caio Blat brilha em Mar do Sertão - Foto: Reprodução/Globoplay

Quando Pajeú entrou, já com Mar de Sertão com vários capítulos exibidos, houve um susto por parte de quem via. Como Caio Blat tinha aceitado um papel tão pequeno, quase um bibelô na trama? No pontapé inicial da trajetória do jagunço na história de Mário Teixeira, a sensação era de que se trataria uma participação especial, porém não era isso. Como coadjuvante, o ator já consagrado não se preocupou e mergulhou na brincadeira proposta, fazendo misérias e surpreendendo.

Caio nunca foi um mau ator ou algo que o valha. Ele já se provou em papéis de ampla envergadura, como em Império (2014) ou Joia Rara (2013). Dono de trabalhos louváveis em papéis coadjuvantes, Caminho das Índias (2009) e Lado a Lado (2010), para citar dois, o ator se transformou em um dos grandes nomes da Globo e cavou seu próprio espaço em tramas, como aconteceu com Liberdade, Liberdade (2016).

Em Mar do Sertão, o artista surgiu com um papel diferente. Como Pajeú, um jagunço capaz de matar qualquer pessoa, o personagem serviu apenas como alegoria para movimentar a trama de Candoca (Isadora Cruz), pouco após a volta de José (Sérgio Guizé) e o processo de separação de Tertulinho (Renato Góes). Ali, o mirabolante vilão dava sinais de humor folhetinesco e mostrava potencial.

A ideia de juntar Pajeú como amante de Deodora (Débora Bloch) foi interessante. Primeiro porque humanizava a vilã que, até então, agia apenas para fazer maldades. Segundo porque recolocava o matador de aluguel dentro do núcleo central, ainda que de forma alegórica. Se na primeira perna a participação de Caio era interessante, nesta fase ele ficou irresistível.

Quem acompanha o cinema nacional enxerga na composição de Pajeú muito de personagens icônicos como Frederico Evandro, de Marco Nanini em Lisbela e o Prisioneiro e até o inesquecível cangaceiro de Domingos Montagner, em Cordel Encantado. Mas Caio fez diferente, desceu o tom e transformou um matador de aluguel, homem temido em toda Canta Pedra, num sujeito não apenas encantador e humano, mas absolutamente medroso e manipulável. Impossível não se apaixonar.

Nos últimos capítulos, a forma como ele vive balançando numa ponte imaginária entre obedecer as ordens de quem acredita ser seu grande amor ou cumprir a promessa divina que fez ao ver seu filho curado e nunca mais matar é sensacional. Caio faz caras e bocas que vai do desejo ardente, à coragem visceral, passando pelo choro infantilóide.

Daniel César

Os conflitos do personagem não ajudam a trama central a andar, principalmente porque ele é incapaz de fazer mal a uma mosca. Embora tenha sequestrado Xaviera (Giovana Cordeiro), não conseguiu impedi-la de entregar os documentos. Mesmo que tenha ficado irritado com Tertulinho, nada vez. E agora, sob ordem de matar José, já deixou claro que não consegue apertar o gatilho. Isso impede que sua personalidade seja mais complexa e transversal, mas mesmo na superficialidade, a composição de Caio transforma o papel em interessante de se ver.

Caio Blat conhece bem os caminhos da pedra e certamente aceitou Pajeú, mesmo sendo um papel menor, por saber que poderia navegar por águas desconhecidas em sua carreira. Ator com qualidade rara, como mostrou em Mcmáfia, série britânica de 2018, teve a oportunidade de aparecer para a TV aberta brasileira em mais um tipo, como ele adora colecionar - e brilhando sempre. 

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