Publicado em 09/04/2020 às 10:49:32
Em seu monólogo de abertura como mestre de cerimônia da edição deste ano do Globo de Ouro, realizada no início de janeiro em Los Angeles, o ator e comediante britânico Ricky Gervais, sempre polêmico, resolveu atacar o calcanhar de Aquiles das celebridades norte-americanas."Vocês dizem que acordaram, mas as empresas para as quais trabalham são Apple, Amazon, Disney; se o Estado Islâmico começar um serviço de streaming, todos vocês iriam ligar correndo para seus agentes... vocês não estão em posição de ficar dando lição de moral ao público sobre qualquer coisa", cravou o comediante, divertindo alguns e constrangendo quase todos os presentes.
Gervais se referia, especificamente, à hipocrisia da classe artística e da mídia mainstream ianques. No entanto, o seu comentário, resguardadas as devidas proporções, serviria também para algumas figuras públicas brasileiras, que agem bem diferente daquilo que pregam. Cairia como uma luva, por exemplo, ao jornalista e apresentador da GloboNews e da TV Globo Marcelo Cosme, flagrado na última terça-feira, 07, em plena caminhada no calçadão de uma praia carioca, enquanto recomendava alguns dias antes, nas suas mídias sociais, o isolamento social da população em virtude da pandemia do novo Coronavírus.
A "fugidinha" de Cosme não passou despercebida. O jornalista foi reconhecido e filmado por um telespectador identificado como Alexandre Monteiro, que ficou revoltado com a postura do apresentador em abandonar a quarentena. O vídeo foi postado nas mídias sociais e ganhou repercussão na internet. "Quero filmar bem a sua cara, pra mais tarde você, lá no GloboNews em Pauta, dizer que é um absurdo as pessoas estarem na praia, né?" questionou o telespectador. "Você me respeita. Você está me perseguindo há dois dias. Não sou do grupo de risco", retrucou Marcelo Cosme. "Ah, não é? Mas a população toda é? Não pode trabalhar, não pode fazer nada que você faz escândalo no GloboNews em Pauta, né? Seu lacrador. Hipócrita! Você é um hipócrita, rapaz", berrou Alexandre Monteiro, hostilizando o jornalista com palavrões. Marcelo Cosme deixou o telespectador falando sozinho, enquanto retomou a caminhada e apressou o passo para sair do local.
Titular do GloboNews em Pauta no canal homônimo, além de apresentador eventual do Hora 1 e do Jornal hoje, na Globo, Marcelo Cosme vem conquistando espaço no jornalismo das emissoras aberta e fechada. Procurada pelo NaTelinha, a comunicação da Globo defendeu o jornalista: "a recomendação do Ministério da Saúde é de que exercícios físicos podem ser praticados ao ar livre por quem não está no grupo de risco, desde que se mantenha a orientação", frisou a emissora.
De fato, o profissional não integra o grupo de risco, e, pelas imagens, parecia estar seguindo as recomendações das autoridades de saúde. Porém, em publicações recentes nas mídias sociais, ele próprio havia enfatizado a importância do isolamento social para evitar a propagação e a contaminação pela Covid-19. Também postou sobre a necessidade do uso de máscaras de proteção e ainda deu dicas sobre como se exercitar durante a quarentena, com utensílios caseiros, sugerindo que as pessoas não abandonassem o isolamento. Soou hipócrita, pois o vídeo postado na internet pelo telespectador evidenciou exatamente o contrário: que ele não estava seguindo as próprias recomendações.
O "ato falho" do profissional foi um equívoco que as personalidades públicas não podem se dar ao luxo de incorrer. Elas precisam entender que vivem sob escrutínio constante, gostem ou não. Celebridades, atletas, políticos, além de formadores e influenciadores de opinião dos mais variados perfis: todos aqueles que têm uma projeção pública, em alguma medida, estão sob vigilância. É como se vivessem 24 horas em uma espécie de vitrine: tudo o que fazem publicamente, e até na esfera privada em alguns casos, é visto, apontado, analisado e criticado. É preciso que sejam coerentes com o que afirmam e pregam, sob o risco de comprometerem seus nomes, suas imagens e, principalmente, suas reputações. Não há espaço para contradições. O público sempre cobrou congruência: da Antiguidade até os dias de hoje. A diferença é que, agora, com a hiperconectividade viabilizada pelas mídias sociais, esse elemento tem ficado mais evidente. O conhecido e péssimo ditado 'faça o que digo, não o que faço', definitivamente, não tem mais espaço no mundo de hoje.
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Bruna Marquezine
Ao afirmar recentemente que não sabia para quem torcer no último paredão triplo do BBB20, formado pelos participantes Babu Santana, Flayslane Raiane e Marcela McGowan, a atriz foi acusada de hipocrisia por alguns seguidores. O imbróglio se deu porque, na semana anterior, Marquezine havia publicado no Instagram, ao lado de outras famosas, uma postagem condenando os comentários de cunho racista feitos em uma live pelo ex-diretor de TV Rodrigo Branco, a respeito da participante Thelma Assis, também do BBB20, e da jornalista Maria Júlia Coutinho.
A atriz foi questionada nas mídias sociais por, na opinião de alguns, manter dois pesos e duas medidas. "Todo ser humano é hipócrita. Todo. Imparcialidade é uma grande ilusão. Ninguém é 100% desconstruído e coerente. Pelo menos eu sigo disposta a escutar, aprender e evoluir, sabendo que eu não sei nada mesmo sobre a vida", postou Bruna Marquezine.
Alyssa Milano e Rose McGowan
Protagonistas da badalada série "Charmed", Alyssa Milano e Rose McGowan se engalfinharam há poucos dias nas mídias sociais em virtude da posição política antagônica que parecem manter frente às eleições presidenciais deste ano nos Estados Unidos. O quiprocó teve início quando Alyssa, uma ferrenha defensora do movimento #MeToo, decidiu ficar em silêncio a respeito das denúncias de assédio sexual envolvendo o pré-candidato democrata à Casa Branca Joe Biden.
Rose McGowen, que foi vítima de abuso no passado, aproveitou para criticar o posicionamento da ex-colega de elenco: "Você é uma fraude. Isso se trata de responsabilizar a mídia. Você vai atrás de Trump e Kavanaugh dizendo 'acredite nas vítimas', você é uma mentira. Você sempre foi uma mentira. O DNC corrupto está envolvido no trabalho de difamação de Tara Reade, você também. VERGONHA", postou McGowan no Twitter.
Pepê e Neném
Outro imbróglio envolvendo política e uma dupla famosa aconteceu em 2017, com as cantoras brasileiras Pepê e Neném. Assumidamente lésbicas e casadas na ocasião, as artistas afirmaram, num vídeo postado em julho daquele ano, que eram contra demonstrações de afeto em público por parte de casais homossexuais.
Disseram também que eram favoráveis à candidatura do então deputado federal Jair Bolsonaro à Presidência da República. As imagens, divulgadas no perfil oficial do político no Facebook, causaram revolta na comunidade LGBTQ+. A controvérsia surgiu porque Bolsonaro havia sido acusado diversas vezes de homofobia.
Angélica
Um contrato publicitário milionário teve o poder de fazer Angélica mudar os próprios hábitos alimentares. Sem consumir carne vermelha havia 27 anos, em 2015 a apresentadora apareceu num comercial de uma conhecida marca de alimentos frigoríficos mordendo um cachorro-quente feito, ao que tudo indicava, com uma salsicha comum.
O embaraço se deu porque Angélica sempre afirmou ser adepta de uma alimentação sem carnes. Em entrevista ao site do programa "Estrelas", no ano anterior, a apresentadora endossou o hábito alimentar que excluía animais. "Não incluo peixe na categoria bichos", disse na ocasião, aos risos. Foi "cancelada" na internet, embora o termo ainda não existisse na época.
Roberto Carlos
Um ano antes do episódio envolvendo Angélica, em 2014 o rei Roberto Carlos já havia aceitado abrir mão de mais de três décadas de vegetarianismo para estrelar uma poderosa campanha publicitária de uma marca de processamento de carne bovina.
Em um comercial, o cantor aparecia num restaurante trocando uma macarronada com legumes por um pedaço de bife. Tudo isso ao som do refrão: "eu voltei, agora para ficar", que insinuava que estaria voltando a comer carne após mais de 30 anos de abstinência. Detalhe: Roberto Carlos sequer tocava no bife durante o comercial. A rejeição foi tanta que a marca acabou rescindindo o contrato com o cantor. Na época, o rei foi alvo da crítica (e da fúria) dos fãs e do público vegano. Virou meme e é lembrando até hoje pelo "ato falho".
* Higor Gonçalves é jornalista especializado em personal branding (gestão estratégica de marca pessoal).
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