Como o 8 de janeiro mudou a cobertura política na TV
Emissoras de TV que antes pegavam leves, enfrentaram a tentativa de golpe
Publicado em 08/01/2024 às 06:45,
atualizado em 08/01/2024 às 10:29
A tarde do 8 de janeiro de 2023 jamais será esquecida na TV brasileira. Enquanto parte da população no Brasil assistia atônita a uma invasão de milhares na Praça dos Três Poderes em Brasília, a programação de praticamente todos os canais foi caindo para uma intensa cobertura do que ficou marcado como uma tentativa de golpe contra a democracia brasileira. Acontece que aquela data mudou, provavelmente para sempre, a forma como os canais passaram a tratar um assunto delicado: os apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Para entender a cobertura, que agora completa um ano, é preciso voltar um pouco no tempo, para o início de novembro, logo após o segundo turno das eleições que coroaram Luiz Inácio Lula da Silva (PT) como o presidente do Brasil a partir de 1º de janeiro de 2023. Antes da posse, apoiadores de Bolsonaro começaram a se reunir em quartéis e pedir por uma intervenção militar, pela suspensão das eleições e que o candidato derrotado continuasse no poder.
+ Advogado do caso Marília Mendonça morre em queda de avião
+ Preta Gil diz que ex tentou acusá-la no divórcio: "Queria me culpar"
Todos os canais do Brasil cobriram as manifestações, com diversos analistas falando do assunto. Porém, houve diferenças nas coberturas. A Globo, por exemplo, em todos os seus telejornais, após mostrar as manifestações, lembrava que a Constituição não permitia uma intervenção militar que suspendesse as eleições, embora não usasse, ao menos nos editoriais, o termo "golpe".
Canais mais ligados ao bolsonarismo durante o mandato do antigo presidente eram mais explícitos. A Jovem Pan, por exemplo, viu alguns comentaristas passando os últimos meses de 2022 não só apoiando, como incentivando os acampamentos em que se pedia intervenção militar. Mais de uma vez advogados foram até o programa para falar do artigo 142 da Constituição, como se ele liberasse esse tipo de movimento.
Quem também usava os termos manifestantes e cobria como um movimento válido era a Record e parte significativa da CNN Brasil. Por outro lado, a GloboNews e a Band tratavam o tema de forma mais dura, com comentaristas repudiando os protestos e chamando as pessoas ali presente de golpistas.
Tudo muda no 8 de janeiro. Praticamente todos os canais cobriram em tempo real a invasão ao Palácio do Planalto, ao Congresso Nacional e à sede do STF (Supremo Tribunal Federal). Comentaristas e apresentadores atônitos usavam a mesma expressão: "O Brasil vive uma tentativa de golpe de estado".
Naquele momento, a exceção foi a Jovem Pan, que seguiu dando voz a apoiadores fiéis de Jair Bolsonaro, que continuaram defendendo, inclusive a quebradeira. Isso custou caro para a emissora e também para estes profissionais, alguns dias depois e obrigou o canal a mudar completamente sua linha editorial.
Após a prisão de mais de mil pessoas e a vitória da democracia, todas as emissoras de TV passaram a usar a data de 8 de janeiro como uma tentativa de golpe de estado e a corrigir comentaristas ou convidados que dissessem o contrário ao vivo.
Agora, um ano depois, os canais fazem documentários, especiais e preparam materiais colhidos ao longo de um ano para relembrar a data. Mas praticamente nenhuma dela se lembrou de que, entre outubro e dezembro, tomavam o cuidado de chamar as pessoas nos quartéis apenas de manifestantes, ainda que elas estivessem pedindo um golpe de estado.