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Assistir Sintonia dói porque série esfrega na cara um Brasil que ninguém quer ver

Segunda temporada da produção é arrasadora ao mostrar desigualdades do país


Cena de Sintonia com a morte de um personagem após chacina
Sintonia mostra um Brasil que ninguém quer ver - Foto: Reprodução/Netflix

Quando a pandemia interrompeu o início das gravações da nova temporada de Sintonia, em março de 2020, parte de público e crítica sentiu o baque, afinal tratava-se da melhor série da Netflix Brasil e o coronavírus colocou em dúvida até o futuro da produção da Kondzilla. Mas a espera valeu à pena e o retorno triunfal da nova leva de episódios, liberados na semana passada, mostrou um crescimento e amadurecimento dos protagonistas Doni (Jottapê), Nando( Christian Malheiros) e Rita (Bruna Mascarenhas), mas dói assistir porque a história mostra um Brasil que ninguém quer ver.

A vida do trio de amigos da favela mudou muito de um ano para o outro e também houve evolução importante na vida de cada um deles. Enquanto Doni já não é mais um menino sonhador, mas realizou o desejo de virar um MC e começa a colher os frutos do sucesso e do dinheiro, Nando virou o chefe da favela e comanda o mundo do tráfico e do crime. Já Rita, diferente dos dois, começou a crescer em sua vida dentro da igreja, após ter aceitado Jesus.

E se há um acerto nos seis episódios liberados da segunda temporada de Sintonia é a aposta em fazer algo que tornou a Globo a super produtora de dramaturgia nos anos 70 e 80: os roteiristas apostaram em mostrar um Brasil real para que, quem assista, veja identificação com a obra. Tanto que, até personagens coadjuvantes ou figurantes lembram profundamente pessoas reais que cruzam a vida no cotidiano.

O retrato real da favela de Sintonia é intenso, a começar pela fotografia real do evangélico, sem caricatura ou zombaria e também mostrando como a religião tem braços por toda a periferia e, daí, a força da influência na vida das pessoas, afinal é a fé e a igreja que estende a mão para o pobre, preto e favelado, enquanto o Estado finge que ele não existe. Ao mesmo tempo, a série também mostra um mundo que só o jovem da periferia é capaz de entender: o sonho de, através da música, dar uma vida melhor para a família e tirar todos daquele lugar.

Assistir Sintonia dói porque série esfrega na cara um Brasil que ninguém quer ver

Todo mundo em Sintonia tem orgulho da favela, mas ninguém quer permanecer nela porque sabe que o local é visto como o esgoto do mundo. Tanto que o governo não alcança suas amarras ali e dá a oportunidade para o crime se estabelecer. E não se trata de um crime que maltrata ou reprime, ao contrário, é o crime quem cuida e protege dos desmandos da própria polícia.

Enquanto outras produções apostam num Brasil imaginário, Sintonia coloca o dedo na ferida, inclusive com a chacina de policiais como vingança por uma guerra de polícia e bandido e quem morre é sempre o favelado inocente. A sequência do assassinato de três jovens com sonhos e a culpa cair em disputa por território de guerras (inclusive com a participação especial de Datena), esfregou na cara do brasileiro a situação real do país.

Assistir Sintonia é maravilhoso porque a produção é um acerto em cheio e com musculatura que faz inveja até em produções da Globo. Mas também dói porque a série te obriga a ver um Brasil esquecido e jogado para debaixo do tapete, um Brasil que ninguém quer ver.

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