Publicado em 23/12/2024 às 08:00:00,
atualizado em 23/12/2024 às 10:22:32
Personagens de Selton Mello e Matheus Nachtergaele, Chicó e João Grilo voltam à cena em O Auto da Compadecida 2. O projeto de continuação da comédia dividiu opiniões desde que foi anunciado, e deve continuar assim agora que chega ao grande público. Estreia desta quarta-feira (25) nos cinemas, o novo filme diverte, mesmo sem o brilho e o frescor do original, lançado em 2000.
Dirigido por Guel Arraes e Flávia Lacerda, O Auto da Compadecida 2 se passa 20 anos depois da primeira história e mostra a pacata rotina de Chicó (Selton Mello) na cidade de Taperoá, no sertão da Paraíba. Ele vive da venda de santinhos esculpidos em madeira e de contar a história da ressurreição de João Grilo (Matheus Nachtergaele), que sumiu no mundo.
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A ação começa quando João Grilo volta para Taperoá cheio de planos mirabolantes para o amigo. Também reaparecem: Rosinha (Virgínia Cavendish), que abandonou Chicó misteriosamente depois de se casar com ele; e o jagunço Joaquim Brejeiro (Enrique Diaz), agora a serviço de um coronel.
Novos personagens entram em cena: Arlindo (Eduardo Sterblitch), radialista sem escrúpulos que quer se eleger prefeito; Coronel Ernani (Humberto Martins), líder político e provedor de água para a região; Clarabela (Fabiula Nascimento), filha do coronel, moça da capital que se interessa por Chicó; e Antônio do Amor (Luis Miranda), malandro carioca e parceiro de golpes de João Grilo.
O primeiro filme era baseado na peça clássica de Ariano Suassuna (1927-2014), e o autor não escreveu uma continuação – vem daí a grande crítica feita ao segundo filme. Contudo, a família do autor acompanhou os trabalhos, e os roteiristas e diretores se preocuparam em respeitar o universo do escritor. Tanto que trouxeram referências de outra peça dele, A Farsa da Boa Preguiça.
Atenção: O texto a seguir contém revelações sobre o enredo de O Auto da Compadecida 2.
O novo filme continua dialogando com temas bem brasileiros, como a miséria e a exploração da fé. João Grilo não acredita no milagre que lhe aconteceu no passado - crê que sua morte foi apenas uma “pilora”, ou seja, um mal-estar, um delírio. Ainda assim, usa a história contada para Chicó para vencer a pobreza e enfrentar os poderosos do sertão.
O filme de 2000 guia todos os caminhos deste de 2024. Trechos de algumas cenas são reproduzidos e falas são replicadas integralmente. O roteiro também é bastante parecido com o que já foi visto antes, o que impede que o espectador encontre qualquer grande novidade na história: João Grilo apronta todas, tem uma experiência de quase-morte e apela à Nossa Senhora (Taís Araujo) para voltar à vida.
Não há grandes momentos na história que aqui é contada. Os novos personagens criados para a continuação, sem o carisma dos originais, também não permitem destaques do elenco. O longa cresce na tela quando o foco está na amizade entre os protagonistas, que ganha o telespectador já familiarizado com essa relação.
A produção também sofre de limitações técnicas, que ora imprimem um oportuno tom teatral, ora dão uma incômoda cara de estúdio às cenas externas. Alguns efeitos especiais e caracterizações – como os dentes de João Grilo, amarelados só na frente – dão a impressão de que o novo filme está mais defasado que o de 24 anos atrás.
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A trilha sonora tem uma bela gravação original de Maria Bethânia, intitulada A Compadecida, e também a releitura de Canção da América na voz de João Gomes – um acerto para as cenas de Chicó e João Grilo. Ainda há espaço para músicas originais do grupo Sa Grama, tão marcantes no primeiro filme.
Já nas últimas cenas, Rosinha diz a Chicó sobre a nova ressurreição de João Grilo: “Sempre vai ter quem ache a primeira história melhor”. A fala indica que não houve a pretensão de superar ou nem mesmo competir com o primeiro filme. Reverenciar esse bem-sucedido histórico é louvável – e inevitável –, mas reproduzir o arco narrativo já visto antes não foi o caminho mais criativo.
O Auto da Compadecida 2 vale pela nostalgia, por algumas boas piadas e, principalmente, pela emoção que Selton Mello e Matheus Nachtergaele demonstram em reviver Chicó e João Grilo. A dupla segue entrosada e garante, ainda que sem tanto êxito quanto da outra vez, um quinhão de bom gosto às comédias nacionais.
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