Desalma é cópia de Dark? Por que o brasileiro tem complexo de vira-lata
Discussão no Twitter sobre Desalma gerou debate e chegou ao viralatismo
Publicado em 27/10/2020 às 04:30
Na última semana o Globoplay lançou sua nova série original, Desalma. Logo nos primeiros dias, a produção acabou - indiretamente - abrindo uma discussão nas redes sociais porque foi comparada a Dark, história alemã da Netflix. Os debates acabaram se tornando exaltados e foram ampliados por gente que acusou os críticos do produto nacional de viralatismo sempre preferindo obras internacionais. O NaTelinha mergulhou no assunto para tentar responder a pergunta: Por que o brasileiro tem complexo de vira-lata com produções nacionais?
A reportagem falou com Telma Nascimento, socióloga formada na UNESP, para entender o que é o tal complexo de vira-lata. "O brasileiro foi criado para admirar o que vem de fora porque sempre acreditamos que aqui nada presta. Faz parte da formação moral do brasileiro muito antes da TV, mas a televisão certamente ajudou com esse raciocínio", afirma ela.
Telma explica que o complexo se dá porque o Brasil é um país que ficou no quase. "A gente nunca conseguiu dar um salto de qualidade em praticamente nenhuma área. A educação, a saúde, tudo parece ser pior aqui do que em países desenvolvidos. Sempre fomos o país do futuro e nunca o país do presente", lamenta a socióloga, que também explica ser culpa do capitalismo.
"A cultura do consumo nos ensinou, pelo rádio, depois pela TV e agora pela internet, que o que vem de fora é melhor. O celular mais descolado é o fabricado em outro país, o melhor carro é o da marca internacional. Até grifes de outros países ganham a preferência. Isso falando da classe média alta, mas isso é facilmente visto pela classe mais pobre também".
Desalma e o complexo de vira-lata
Telma conclui que a discussão sobre Desalma vai muito além da qualidade da série e de sua suposta proximidade com uma atração gringa. "É extensivo, o brasileiro foi treinado para achar tudo de fora melhor e faz parte da alma humana o comparativo. Raramente conseguimos elogiar ou criticar algo apenas com base naquilo, sempre precisamos de um olhar comparativo, alternativo. Esse caso é uma soma da nossa necessidade de colocar dois produtos lado a lado e também do viralatismo que faz parte de nossa população", explica ela ao ler o fio sobre o tema.
Por falar no fio, a discussão começou quando um usuário do Twitter escreveu sobre Desalma. "Globoplay vai lançar o filme Desalma, que conta a história de uma cidade que PAROU NO TEMPO, justamente NO FIM DOS ANOS 80 kkkkkkkkkk. O Brasil é o país da fuleragem mesmo...", escreveu em tom jocoso ao manter uma thread sobre o assunto. A partir daí, o usuário passou a comparar duas fotos lado a lado, uma de Dark e outra de Desalma, mostrando que a produção nacional é cópia da outra.
O NaTelinha convidou Paulo Irikura, diretor de teatro e especialista em dramaturgia, para acompanhar Desalma e Dark e comparar as produções e ele foi taxativo: "A fotografia, de fato, se aproxima muito uma da outra e o tom dado pela trilha sonora as aproximam, mas o roteiro em si carrega pouca semelhança". Para ele, a avaliação está equivocada porque não leva em conta o desenvolvimento de cada uma das produções.
guicadoiss
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Desalma é diferente de Dark
"A crítica não faz muito sentido porque parece ser feita por quem não assistiu uma das produções ou talvez nenhuma. Dark e Desalma trazem propostas bastante diferentes entre si, quando falamos de roteiro, principalmente. A temática também não carrega semelhança e pode ser confundido por quem lê algum resumo, mas não assiste às produções", explica. E Desalma ainda tocou num tema que já foi tratado na TV brasileira, na novela Eterna Magia.
Paulo conta que a estética semelhante não chega a ser novidade. "De fato, a estética é próxima, mas inúmeras séries utilizam de estéticas de outras e isso não é cópia, é inspiração", conclui. E por falar em semelhanças que não são cópias, o tuíte que gerou a confusão acabou se tornando alvo de zombaria por parte de outros usuários, que lembraram de supostas cópias de outros países da TV brasileira.
Utilizando a mesma dinâmica do tuíte, os perfis se espalharam com ironia e compararam Fleabag (2016) a Mulheres Apaixonadas (2003), Modern Family (2009) com A Grande Família (2003) e muitas outras porque carregam história que lembram umas às outras.
Desalma e a defesa dos produtos brasileiros
Paulo Irikura fez questão de lembrar que o Brasil ainda engatinha quando o assunto é série. "A gente é acostumado a fazer novelas e séries é uma linguagem bastante diferente, por isso ainda estamos aprendendo", justifica lembrando ainda que o país faz poucas séries na comparação com os principais países do mundo neste tipo de formato.
"Mas em novelas somos imbatíveis e respeitados no mundo todo. O brasileiro comprou a ideia de que novela é sub-arte porque o americano tem essa ideia com as soap operas. Mas franceses, ingleses e até suecos adoram assistir novelas e sempre elogiam as tramas brasileiras por conta de sua capacidade de investir no melodrama com qualidade rara, até superior que o México, por exemplo", garante.
A briga foi tanta por causa disso que até Deborah Secco decidiu se manifestar. "Mania de tentar colocar o audiovisual do Brasil pra baixo. A gente faz sucesso em todo e qualquer festival, evento, premiação pelo mundo e aqui dentro é só paulada. Uma produção com atrizes do calibre de Claudia Abreu e Cassia Kis em qualquer lugar do mundo é razão de orgulho absoluto e reverência. Não sejamos diferentes. Estou falando sobre #Desalma. Nova série @globoplay que conta com essas gênias que amo tanto! #Cacau #CassiaKis Assistam!", escreveu a atriz no Twitter em tom de desabafo.
dedesecco
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