Publicado em 13/04/2022 às 04:00:10,
atualizado em 13/04/2022 às 09:16:37
Há alguns anos, os filmes deixaram de ser prioridade na programação da TV aberta brasileira. A corrida para para fechar contrato com os grandes estúdios e ter a possibilidade de exibir blockbusters com exclusividade, não existe mais. A proliferação da internet e o surgimento de plataformas de streamings fizeram com que este filão perdesse valor e fosse escanteado por grande parte das redes abertas. Mas, de que maneira o mercado mudou?
Primeiro, é preciso entender como o mercado funcionava. Não até muito tempo atrás, os grandes estúdios negociavam com grandes pacotes e todos os anos havia o recebimento de uma lista por parte dos parceiros, conforme relata o atual executivo de uma grande emissora, mas que prefere se manter no anonimato. No caso da Globo, por exemplo, os contratos aconteciam sempre com o prazo de três anos, sempre seguindo a ordem lógica de uma janela depois que um filme é lançado no cinema. Venda de DVD, locação, canais premium, fechado e por fim, aberto. Ainda há muitas regras de mercado neste esquema, mas duas empresas já operam em esquemas diferentes, casos da Paramount e Sony.
O executivo com quem o NaTelinha conversou relata que Paramount e Sony trabalham exatamente como as pequenas sempre trabalharam. A negociação ocorre de maneira simples e direta. Se a TV quer algo, basta oferecer alguma quantia e a negociação se inicia até chegar em um denominador comum, diferente de outros tempos. E sem mais grandes pacotes, onde vários filmes de menor apelo e pouco interessantes teriam que ser adquiridos pelo "filé". Hoje, paga-se pelo que realmente será transmitido.
Por conta do início da abertura desses grandes estúdios é comum a exibição de um mesmo filme da Sony em três ou quatro canais na televisão por assinatura - na TV aberta, negocia com mais de um player -, o que não ocorre com a Disney e Warner. O conglomerado Disney entende que para gerar valor para seus próprios produtos, é necessário a venda apenas para um player de cada janela. A Warner também trabalha com esse sistema de exclusividade e por isso o público não verá a saga Harry Potter, por exemplo, perambulando por outro lugar que não seja em um canal do próprio grupo.
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A Globo puxou a fila para um novo modelo de contrato em 2016, quando fechou um acordo de três anos com a Warner. Naquela época, a empresa vinha de uma longa parceria com o SBT, mas o canal carioca só aceitou fechar sob suas condições: sem pacotes enormes com filmes que ela jamais usaria na TV aberta. Passou-se a adquirir somente aquilo que ela de fato exibiria nas suas sessões de cinema.
Esse problema começou, conforme relata este executivo, porque os catálogos não chegavam no valor de pacote anual. "Escolha 30 filmes pelo preço de US$ 5 milhões", dizia o estúdio. "Não, eu quero sete", rebatia o comprador. Hoje, as grandes redes batem nas portas dos estúdios e propõe um modelo que é chamado de picking selection. Isto é, se você quer comprar oito filmes, pagará o preço pelos oito. Antigamente, as TVs compravam 500, 600 filmes, mas só conseguiam exibir um terço disso, já que vinha muitas produções questionáveis e made for TV. A concorrência e sede pela exclusividade obrigavam as redes a aceitarem esse tipo de acordo para poder transmitir os grandes títulos.
Para vender às TVs, os estúdios se baseiam em bilheterias internas dos filmes. Algumas trabalham com o que as produções conseguiram arrecadar nacionalmente, mas a maioria é daquilo que o mercado chama de bilheteria doméstica, envolvendo apenas Canadá e Estados Unidos. Quanto mais bilheteria um filme teve, mais caro ele custa, o que nem sempre reflete no mercado brasileiro, vide As Branquelas (2004), da antiga Fox, que é amado pelos brasileiros, mas não teve a mesma aceitação no seu país de origem.
Com o surgimento de dezenas de plataformas de streaming, as TVs deixaram de se interessar por filmes como em outros tempos, mas executivos de grandes estúdios continuam tendo que bater metas e não vendem com a mesma facilidade que nos áureos tempos. A Sony e Paramount foram as primeiras a entenderem que o consumo de TV continua na classe CDE e existe um valor para que o filme possa ser revisto.
Hoje em dia, não se vende mais exclusividade ou ineditismo. Nenhum canal consegue segurar o público linearmente, e entendeu-se que isso está tudo bem. Já viu o filme? Assista de novo.
Antes, também havia um velho acordo que era de praxe para uma grande produção: dois anos pela obra e três exibições. Não se mexia nisso, mas agora isso mudou. Tudo é negociável, inclusive seu número de exibições. Basta acordar.
Com menos investimentos na área nos últimos anos, estima-se que pode haver retorno comercial. Tudo depende das cifras e estratégias pensadas, mas no caso da Globo, que é quem mais destina espaço na grade de programação para longas-metragens, a injeção de dinheiro está na casa dos milhões de dólares para um retorno na casa de milhares de reais.
Em outras palavras, o investimento na maior emissora do país se dá não ao retorno financeiro que este segmento traz, mas pelo valor que ele agrega.
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