Pantanal da Manchete teve críticas a Collor, que virou fã da novela
Então presidente chegava a viajar levando fitas da trama para assistir no fim de semana
Publicado em 03/06/2022 às 05:43,
atualizado em 03/06/2022 às 11:27
O remake de Pantanal, atualmente no ar pela Globo, dificilmente vai reproduzir uma das características da primeira versão da história – exibida na Manchete em 1990. Na época, o texto assinado por Benedito Ruy Barbosa era carregado de comentários políticos, comuns aos trabalhos do autor. Alguns deles causaram polêmica e foram encarados como críticas ao então presidente da República, Fernando Collor, que era fã da novela.
Naquele ano de 1990, o Brasil atravessava o Plano Collor, no primeiro ano de governo do presidente. A situação econômica da época, muito lembrada pelo confisco das cadernetas de poupança, chegou até à televisão. Reportagem da Folha de S.Paulo, de março daquele ano, apontou que, a uma semana da estreia, Pantanal só tinha metade do patrocínio necessário, o que cobriria pouco mais da metade dos custos da novela.
O corte de gastos das empresas não seria um empecilho nas semanas seguintes, já que Pantanal se mostrou um sucesso de audiência e passou a ser requisitada pelas marcas. A crise financeira, presente no dia a dia dos brasileiros, não foi ignorada na trama. Não demorou muito para que os personagens passassem a falar de política, refletindo sobre o contexto da época.
Em um capítulo do mês de junho, registrou reportagem do Jornal do Brasil, Tadeu (Marcos Palmeira) disse que iria escrever uma carta para o Banco Central pedindo a retirada dos cruzados novos retidos em meio ao Plano Collor, obtidos com a venda de uma boiada. “Estávamos recebendo uma média de 60 cartas por dia. Vimos esse número saltar para 500 depois deste capítulo de Pantanal", relatou uma funcionária do BC, em entrevista.
“Quero ajudar as pessoas a abrir o olho”, defendeu Benedito Ruy Barbosa, autor de Pantanal, em 1990
Em julho, em texto para Folha, o jornalista Humberto Saccomandi criticou o tom didático de “diálogos pretensamente políticos” na trama. Em uma conversa entre José Leôncio (Cláudio Marzo) e Irma (Elaine Cristina), o fazendeiro mostrou indignação contra a corrupção no país e a apologia das promessas do governo de Collor, que foi eleito sob a alcunha de “o caçador de marajás”.
À coluna, Benedito Ruy Barbosa se defendeu: “Não estou nem a favor nem contra o governo. Quero ajudar as pessoas a abrir o olho”. Para ele, José Leôncio era um símbolo do homem honesto. “Um país não se muda da noite para o dia. É preciso primeiro mudar a mentalidade do povo” e “Nesse país, ladrão não pode mais ser herói” foram frases ditas pelo protagonista.
Nem mesmo o cunho político afastou a audiência do chefe do Executivo, entretanto. O Jornal do Brasil registrou, em maio daquele ano, que Collor havia embarcado em seu porta-aviões para passar o fim de semana em Minas Gerais levando na bagagem, além do videoteipe do jogo amistoso entre Brasil e Bulgária, uma fita com o capítulo do dia da novela da Manchete.
Temas políticos aparecem com frequência nos trabalhos do autor Benedito Ruy Barbosa. No retorno à Globo após o sucesso de Pantanal, ele trataria de forma mais clara questões como a reforma agrária e movimento sem-terra, com personagens como Luana (Patrícia Pillar), e a honestidade na política, com o Senador Caxias (Carlos Vereza), em O Rei do Gado (1996), por exemplo.
O NaTelinha divulga todos os dias os resumos dos capítulos, detalhes dos personagens, entrevistas exclusivas com o elenco e spoiler da novela Pantanal. Confira!