Opinião

O que Alma Gêmea tem a ensinar às novelas inéditas da Globo?

Reprise termina nesta semana, dando um banho de repercussão nas outras tramas em exibição

História e personagens marcantes garantiram sucesso de Alma Gêmea 18 anos após a exibição original - Fotos: Divulgação/Globo
Por Walter Felix

Publicado em 02/12/2024 às 07:00:00,
atualizado em 02/12/2024 às 10:19:59

Exibida originalmente entre 2005 e 2006, Alma Gêmea chega ao fim de mais uma exibição na Globo nesta semana, novamente com grande sucesso. A reprise do Vale a Pena Ver de Novo termina na sexta-feira (6), com uma audiência que, por vezes, superou as tramas inéditas na TV. Também não foi raro ler nas redes sociais que a produção de quase 20 anos atrás era a melhor entre as histórias atualmente no ar.

O que, então, Alma Gêmea tem a ensinar às novelas inéditas da Globo? O folhetim criado por Walcyr Carrasco, com direção geral de Jorge Fernando (1955-2019), de fato reúne características – entre qualidades e defeitos – que foram fundamentais para seu sucesso e que não têm sido vistas em produções da emissora.

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Novela com cara de novela

Acima de tudo, Alma Gêmea é uma novela assumida, sem vergonha de ser. Não busca referência em séries estrangeiras, mas no modelo clássico dos folhetins, que sedimentou as novelas brasileiras. Todos elementos que costumam nortear o formato estão ali, a começar pela mocinha incorruptível e a vilã diabólica. O melodrama é levado às últimas consequências, o que costuma ser infalível com o grande público.

Não só o texto, mas a direção traz uma inconfundível “cara de novela”. As cenas são coloridas, vivas, bem iluminadas, diferente de tudo o que a Globo tem feito.

Engane-se quem pensa que ali não há um cuidado estético – o figurino de Cristina (Flávia Alessandra), que fica mais sombrio ao longo da trama, à medida em que a vilã enlouquece, é uma prova disso. Ainda há espaço, em uma cena ou outra, para uma fotografia mais elaborada, como alguns internautas identificaram. Confira:

Momentos catárticos e bom ritmo

O autor soube preparar momentos catárticos para mexer com as emoções do público. Por capítulos a fio, Débora (Ana Lúcia Torre) inferniza os empregados, até que Zulmira (Carla Daniel) se cansa e dá uma surra na patroa. Mais adiante, Eurico (Ernesto Piccolo) organiza a posição das taças em uma bandeja para não levar uma bronca e acaba ocasionando, sem saber, a morte da megera, que havia envenenado uma das bebidas.

A história está sempre progredindo e raramente estaciona. Não há falsas reviravoltas, aquelas que supostamente movimentam os capítulos, mas fazem com que a trama continue no mesmo lugar. Há um ótimo ritmo, sem que a história se atropele, diferentemente do que se vê em Mania de Você, atual cartaz das 21h, por exemplo.

Atores de verdade

Os méritos passam ainda pelo elenco, formado por atores de verdade e dedicados a construir tipos marcantes. Flávia Alessandra encarnou de modo convincente – e às vezes comovente – uma das vilãs mais ensandecidas da nossa TV. Cristina não tinha uma loucura gratuita, e sua intérprete soube ser exagerada como precisava ser, mas nunca canastrona.

Quando o núcleo principal desacelera, os coadjuvantes têm carisma e apelo popular suficientes para segurar o interesse do telespectador. Nas tramas paralelas, muitos destaques: Drica Moraes (Olívia), Fernanda Souza (Mirna), Emílio Orciollo Netto (Crispim), Rita Guedes (Kátia), Fúlvio Stefanini (Osvaldo), Nicette Bruno (Ofélia), Neusa Maria Faro (Divina), Nívea Stelmann (Alexandra), entre outros talentos.

Menos, às vezes, é mais

Carrasco tem um estilo muito próprio de contar suas histórias. Há um apelo constante à pieguice e diálogos expositivos para explicar e reiterar os acontecimentos. Com a adesão tão forte a arquétipos, o texto também abre mão de tipos mais humanos e menos maniqueístas, apesar de reservar complexidades à maioria deles. Ainda que não agrade a todos, não há como negar que o autor foi bem-sucedido em suas intenções.

Fato é que a novela envolve o público como poucos títulos recentes foram capazes. A atração desperta o interesse mesmo naqueles que enxergam o exagero nos tons com que a história é contada. Tentativas de inovar e transgredir o formato são sempre bem-vindas, mas só dão certo quando feitas com a mesma honestidade com que a equipe de Alma Gêmea entregou um novelão clássico.

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