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"Verdades Secretas" se consagra entre o clichê e a ousadia

Estação NT


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Fotos: Reprodução

Se a dramaturgia da Globo se tornou uma esfinge nas últimas décadas, com fuga de audiência e a transformação do gênero novela diante das séries americanas, o autor Walcyr Carrasco parece ter indicado um caminho através de “Verdades Secretas”, a trama das 23h que chegou ao seu último capítulo nesta sexta-feira (25).

Com grande audiência e repercussão ainda maior, “Verdades Secretas” mostrou, sem pudores, a história de Cinderela com toques de mundo-cão: a adolescente Arlete/Angel (a novata Camila Queiroz, com carisma de sobra para o papel) que vai para São Paulo realizar o sonho de ser modelo, incentivada pela mãe, Carolina (Drica Moraes). No então chamado mundo fashion, as personagens, mais especificamente a protagonista, entram na ciranda de drogas, sexo, poder, hedonismo e etc.

A inovação de Carrasco aqui foi brincar com núcleos fluidos, todos ligados ao elenco principal, apagando os limites engessados entre o drama e o humor. Em torno de Arlete/Angel orbitaram a dona da agência de modelos Fanny (Marieta Severo) e o seu amante Anthony (Reynaldo Gianechinni) às voltas com Fábia, a mãe alcoólatra (Eva Wilma, impecável) o funcionário Visky (Rainer Cadete), os jovens ricos-sem-rumo Giovanna e Bruno (Agatha Moreira e João Vitor Silva).

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Com desfecho épico, "Verdades Secretas" já é a novela do ano da Globo


A direção de Mauro Mendonça Filho, parceiro também de Carrasco em “Amor à Vida”, novela de 2013, imprimiu ainda mais crueza às cenas, cujo realismo em alta voltagem deu o tom. A São Paula cinza da cracolândia onde transitava a modelo viciada em drogas Larissa (Grazi Massafera, que se entregou ao papel a ponto de descolar de si a pecha de “ex-BBB”), com a cidade mais sofisticada, em cores fortes e cenas noturnas frenéticas, além dos movimentos dos atores em cena deixarem espaço aos vários olhares do público. Neste ritmo, “Verdades Secretas” fez a direção, o roteiro e as interpretações caminharem no fio da navalha, pra sorte e azar do telespectador.

Azar pelo fato de Carrasco, lá pela metade da trama, se perder e deixar os personagens andarem em círculos, como o romance entre a protagonista e o seu padrasto, Alex (Rodrigo Lombardi), sempre na expectativa de ser descoberto por Carolina, enquanto Visky, gay assumido, se atrapalhava em um constrangedor caso hetero. Tudo intercalado por diálogos óbvios e cenas chamariz de sexo e nudez.

As belas cenas de Mauro Mendonça Filho algumas vezes desandavam para o videoclipe moderninho, mas vazio (closes longos em personagens alucinados por drogas, por exemplo). Ou para a violência gritante, que seria mais perturbadora através da sugestão (como o estupro coletivo sofrido por Larissa). Ou seja, o autor oscilou entre a ousadia e o conservadorismo, cujas personagens femininas eram, com frequência, as mais sacrificadas.

Entretanto, na balança do Ibope e das redes sociais, “Verdades Secretas” saiu com saldo positivo, atendendo a um público muito mais voltado à ambiguidade tardia de Arlete/Angel, que após assassinar Alex, se casa na igreja com direito a beijo em imagem sacra.
 

Ariane Fabreti é colunista do NaTelinha. Formada em Publicidade e em Letras, adora TV desde que se conhece por gente. Escreve sobre o assunto há sete anos.

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