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Cobertura da morte de Cristiano Araújo divide Brasil em nova e velha mídia

Estação NT


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Divulgação

Artista em ascensão do chamado sertanejo universitário morre aos 29 anos em um acidente de carro ao lado da namorada. Todos os elementos que, reunidos, estimulam não só a televisão a explorar o assunto à exaustão como voltar às suas origens, não necessariamente pelo lado positivo.

Justamente em uma época em que se discute as novas formas de se fazer TV, a cobertura da trágica morte do cantor Cristiano Araújo, ocorrida em Goiás na madrugada da última quarta-feira (24), desfilou todos os clichês sem pudor.

Desde o “Hoje em Dia” na Record, passando pelo “Brasil Urgente” na Band até o “Vídeo Show” na Globo, era corrente a sensação de que se assistia às mesmas cenas, como se o espectador estivesse preso em uma matrix midiática.

Em tons mais ou menos sensacionalistas, dependendo da atração, da emissora e dos apresentadores, o clima geral era de consternação forçada, sentimento causado pelo destaque dado não ao falecimento em si, mas aos símbolos em torno dele (o estrelato, a juventude, o casal que perde a vida, as lágrimas da família).

Este recorta-e-cola, feito pela televisão há décadas, explicaria a profusão de imagens e declarações repetitivas que nada significavam de novo. Como, por exemplo, as ferragens do carro na estrada, as manifestações de artistas nas redes sociais, trechos de shows de Araújo, paramédicos contando os detalhes do resgate e o pai do cantor, já enlutado, questionando a existência de Deus. Frase que, por sua vez, não escapou das análises psicológicas vazias diante das câmeras, tal qual se viu na Record e na RedeTV!.

Até mesmo a Globo, com fama de engessada em coberturas ao vivo, dedicou grande parte de sua programação ao acontecimento. Na tentativa de se adaptar aos concorrentes, cancelou a “Sessão da Tarde”, esticou programas e escorregou nas gafes: durante o “Encontro”, Fátima Bernardes anunciou a morte de Cristiano Ronaldo, jogador de futebol do Real Madrid, enquanto Otaviano Costa do “Vídeo Show” disse, no ar, estar espantado com a repercussão do fato, pois nunca tinha ouvido falar em Cristiano Araújo.

O ato falho de ambos os apresentadores, misturado ao liquidificador de informações promovido por todas as emissoras, escancarou o curto-circuito entre a mídia tradicional e a nova, os vícios de uma e a rapidez de outra, mas principalmente, como a televisão tentou alcançar e até reproduzir o conteúdo dos blogs, sites e redes sociais, já coalhados, desde a madrugada do acidente, de referências ao cantor e à sua namorada, Allana Moraes.

A legião de fãs de Araújo na Internet, em contraste com o seu suposto anonimato na grande mídia (como Fátima Bernardes e Otaviano Costa demonstraram tão bem), acrescenta mais faíscas ao tema.

Por baixo de todo o espalhafato por audiência nas diversas mídias (imagens do corpo do cantor circularam pelo WhatsApp afora), é importante não perder de vista as brechas que foram expostas na cobertura desta tragédia, ou seja, um Brasil digitalizado, que produz seus próprios ídolos, porém, sensacionalista; e um outro, analógico, em crise de identidade, mas que ainda é acessível a grande parte do público.
 

Ariane Fabreti é colunista do NaTelinha. Formada em Publicidade e em Letras, adora TV desde que se conhece por gente. Escreve sobre o assunto há sete anos.

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