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Campanha agressiva mostra falta de rumo na utilização do horário eleitoral

Território da TV


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Divulgação

Faltando três dias para o país decidir o seu próximo presidente após a mais acirrada eleição desde a redemocratização, é quase impossível resumir essa campanha de forma lógica como as anteriores.

Com uma tragédia e uma virada no meio do caminho, a eletrizante disputa tomou conta do noticiário subitamente com a tragédia aérea em Santos, ocorrida uma semana antes do início das propagandas obrigatórias no rádio e na televisão.

Por causa disso, praticamente todos os postulantes iniciaram suas trajetórias televisivas prestando homenagens para Eduardo Campos.

Em princípio, os presidenciáveis davam as caras ou vozes em dias alternados excluindo-se o domingo e dividiam tempo com os postulantes ao Legislativo e governos estaduais.

Durante o primeiro turno, apenas um direito de resposta foi concedido: a coligação de Dilma Rousseff tomou praticamente todo um programa do PSC, que tinha o pastor Everaldo como candidato.

Mas mesmo sem punições, teve destaque a união entre Dilma e Aécio Neves para a chamada desconstrução da candidata Marina Silva. Ambos os programas centraram suas armas na ex-ministra do Meio Ambiente em uma estratégia que se mostrou bem sucedida com a terceira colocação obtida por ela.

Ambos foram favorecidos por terem tempo bem superior ao de Marina, já que a distribuição feita pelo Tribunal Superior Eleitoral divide a fatia de televisão pelo número de vagas no Congresso dos partidos apoiadores, o que torna tão importante assim a agregação de legendas até mesmo de histórico duvidoso.

Agora, em pelo menos 10 estados, todo o tempo é de Dilma e Aécio. E em fatias iguais, como é regra no segundo turno. 10 minutos para cada. E se eles tinham uma inimiga em comum no primeiro turno, dessa vez se distanciaram completamente entre a disparada de ataques.

Tudo em rede nacional de rádio e televisão aberta duas vezes ao dia com dinheiro bancado por nossos impostos. Independentemente do que se ache sobre os métodos de governo dos candidatos, os de campanha se mostraram espantosos.

O jornal português Público, por exemplo, vê perigos até mesmo para governabilidade do próximo eleito graças ao clima exacerbado de divisão, que antes ficava restrito aos eventos de rua com militantes, mas dessa vez ganhou o palanque eletrônico.

No espaço financiado pelo dinheiro do povo, as propostas ficaram em segundo plano, concluiu em entrevista ao jornal O Globo o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Dias Toffoli.

O ministro segue a opinião da maioria da população. Segundo uma pesquisa do Datafolha, 71% dos brasileiros acham que o nível de agressividade foi além do normal.

Para o ministro, “Se tem tempo para ficar agredindo, ao invés de falar de proposta, é porque tem muito tempo sobrando. Para que seis semanas de horário eleitoral gratuito no primeiro turno e três semanas no segundo turno? (...) As pessoas assistem os primeiros ou os últimos. Acaba havendo um desgaste. E o custo disso? Os programas são feitos com recursos tecnológicos, pirotecnias. E a atividade do Congresso Nacional fica paralisada”.

Ou seja, pela primeira vez se há uma discussão real sobre a necessidade de paralisar as programações de rádios e TVs por meses, causando sérios prejuízos de audiência, sendo que boa parte dos eleitores ou tem o voto definido por tendências históricas ou deixa a decisão para a reta final.

Dias Toffoli ainda deixou claro que não existe uma censura e que a jurisprudência estabelecida é aplicada para todos os lados. “O horário eleitoral é pago pelo cidadão, e o cidadão não estava satisfeito com esse uso”, refletiu ele ao impresso carioca sobre as proibições feitas para diversas peças das duas coligações baseadas em ataques pessoais aos seus adversários.

Os 28 partidos com representação no Congresso Nacional, número recorde, certamente tentarão frear qualquer discussão mais avançada sobre o assunto. Afinal, está aí “A Voz do Brasil” nas rádios há décadas.

Caso isso realmente empaque e aguardemos inertes pela próxima batalha com discursos óbvios em 2018, perde o telespectador em meio ao tiroteio nada propositivo, perdem as emissoras, que mesmo compensadas financeiramente demoram a readequar o público com suas grades, e perdem telespectadores fisgados por outras plataformas e também a nossa jovem democracia.

Em tempo

Dilma Rousseff e Aécio Neves fazem hoje (24) à noite na Globo o último debate da campanha. Após o auge da baixaria nos confrontos da Band e do SBT e uma versão mais light de ambos na Record, fica o mistério sobre as cartadas para o duelo mais decisivo.

E antes que algum telespectador mais desatento se confunda, a Globo também transmite o UFC, porém somente amanhã após o “Altas Horas”. José Aldo defende o seu cinturão em luta realizada no Rio de Janeiro, mas no Maracanãzinho, não no Projac.

“Epidemia”

O problema de deturpação do uso original do caro e nobre horário eleitoral não é somente dos presidenciáveis.

O Rio de Janeiro, que detém a mais relevante campanha estadual desse segundo turno, chegou a ver edições inteiras de programas sem que o candidato da coligação aparecesse. Todo o tempo foi focado em ataques contra o adversário na ocasião.

E o tom não foi diferente no debate da Globo desta quinta-feira (23). A mediadora Ana Paula Araújo teve trabalho em tentar controlar, sem sucesso, os ânimos da plateia durante os confrontos mais acalorados entre Luiz Fernando Pezão e Marcelo Crivella.

Diante de tanto “fogo”, o alarme de incêndio tocou acidentalmente por três vezes. A apresentadora chegou a chamar um intervalo comercial para resolução do problema, mas nesse exato instante ele foi controlado.

Assim como muitas das falas e promessas feitas ao longo do debate, o alarme foi falso, como a própria Ana Paula ainda explicou ao dizer que estavam todos bem “nesse debate muito animado”.

 

No NaTelinha, o colunista Lucas Félix mostra um panorama desse surpreendente território que é a TV brasileira.

Ele também edita o https://territoriodeideias.blogspot.com.br e está no Twitter (@lucasfelix)

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