Nívea Maria avalia saída da Globo: "Momentos do país levaram a mudanças drásticas"

Nívea Maria deixou a Globo em março, após 51 anos como contratada da emissora. A atriz de 75 anos quer manter abertas as portas da empresa, assim como as da concorrência. Nesta entrevista exclusiva ao NaTelinha, ela comenta a volta da minissérie A Casa das Sete Mulheres (2003), que chegou nesta semana ao Globoplay. Sua personagem, de tão violenta, acabou fazendo com que a veterana desse dois tapas em uma colega durante uma cena tensa.

“Na minha saída da Globo, foram muito respeitosos e carinhosos comigo. Com a experiência que eu tenho, sei que esses momentos que acontecem no país levaram a essas mudanças drásticas, mas isso não desestabilizou a minha relação com a Globo”, comenta Nívea Maria. “Nós atores estamos sempre no mercado, e a porta da Globo está aberta, assim como a da Record, do SBT, da Band”, afirma a atriz.

A emissora carioca não tem renovado contratos de longo prazo com os atores. Agora, a maior parte dos artistas fecha acordos por obra certa. Logo após sair do canal, Nívea Maria ganhou um papel na série A Divisão, do Globoplay, em que interpreta a mãe de um empresário sequestrado, personagem de Marcelo Adnet. No teatro, ela encena a peça Ensina-me a Viver, que ficou anos em cartaz com Glória Menezes no papel principal.

De volta no Globoplay, a minissérie A Casa das Sete Mulheres – sobre a Guerra dos Farrapos, baseada no livro homônimo de Letícia Wierzchowski, adaptado para a TV por Maria Adelaide Amaral e Walther Negrão – deu a Nívea Maria o papel da amarga Maria, bem distante das mulheres doces e românticas a que deu vida na TV. Pelo desempenho, há 19 anos, foi eleita a melhor atriz da televisão pela APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte). “Em todas as cenas, parecia que a minha personagem sangrava no ar”, recorda a veterana.

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Leia a íntegra da entrevista com a atriz Nívea Maria

NT: A Maria de A Casa das Sete Mulheres foi uma personagem diferente na sua carreira?

Foi uma conquista. Já tinha uma carreira longa, com várias personagens românticas, e sempre primei em fazer papéis diferentes para que o público não visse características de outros trabalhos que eu já havia feito. A minissérie foi uma boa experiência tanto artística e profissionalmente quanto para a minha vida pessoal. Estava em um momento sensível, e a minissérie veio como um desafio, uma explosão para colocar para fora as coisas que estavam me fazendo mal.

A história, além de ser linda, dá primazia a mulheres fortes, independentes, que se responsabilizavam com a casa enquanto os homens iam para a guerra. Todas elas sofriam nas mãos da Maria, que era uma mulher desencantada com o casamento, nada afetuosa. Ela tinha uma revolta com a vida pelo fato de não se sentir amada e livre. Para se colocar na vida, era agressiva, dura e até má, porque usava até de violência física com as filhas.

NT: Acha que a história, por falar da guerra colocando o foco sobre as mulheres, tinha uma abordagem feminista?

Com certeza. Com a guerra, os homens se tornaram ausentes dentro de casa e na vida da família. As mulheres então tomaram o poder ali dentro, mesmo aquelas que não tinham o temperamento da Maria, que eram mais meigas.

NT: Quais são suas principais recordações nos bastidores?

Havia uma união e um afeto muito grande entre nós, atrizes. Às vezes, chorávamos com as cenas, nos emocionávamos de verdade. Aliás, em todas as cenas, parecia que a minha personagem sangrava no ar, até nos momentos mais calmos, nos diálogos dos cafés-da-manhã. Era uma mulher muito negativa, sombria até nas roupas que ela usava.

“Tive uma cena muito violenta com a Samara Felippo, em que a Maria não acredita que a filha ainda seja virgem e tenta agredi-la. Dentro da cena, acabei dando dois tapas na Samara, e fiquei muito chocada com a minha reação.”

Nívea Maria

NT: A Globo não produz mais esse formato de minisséries. Sente falta?

Eram oportunidades de sairmos um pouco do arroz-e-feijão da novela. Não que as novelas sejam ruins, pelo contrário, contam histórias de famílias, de comportamentos... Só que nas séries podemos ousar e aprofundar um pouco mais as abordagens, até pelos horários em que elas passam.

“Sinto falta de trabalhar (risos). Sinto falta de estar atuando, porque acho que meu trabalho de atriz é muito importante e tem uma missão de ajudar na cultura do nosso país. Gente que não consegue estudar, por exemplo, pode se informar por meio de uma série como foi A Casa das Sete Mulheres.”

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Nívea Maria

No início da teledramaturgia, tínhamos as adaptações de romances brasileiros no horário das seis. Era uma forma de pessoas que não tinham condições de ler conhecerem os grandes nomes da nossa literatura. Gostaria que a televisão e também as plataformas de streaming não parassem de produzir esse tipo de conteúdo, porque também é uma forma de educar o público.

NT: Você está em cartaz com o espetáculo Ensina-me a Viver, que por anos foi encenado pela Glória Menezes. Chegou a conversar com ela sobre essa experiência?

Não tive um contato direto com a Glória, mas soube que ela ficou muito feliz com a escolha do meu nome para fazer o espetáculo. O Arlindo Lopes [ator e produtor] trouxe agora uma montagem atualizada, mais ágil. Descobrimos que a peça fala de coisas muito atuais, como o lugar da terceira idade na sociedade, com pessoas ativas aos 70 e 80 anos, além da depressão e dos sofrimentos dos mais jovens.

O espetáculo está dando muito certo, porque o público, mesmo quem assistiu à outra montagem, está aceitando, se emocionando e se divertindo com a nova versão. A peça mostra que pode acontecer o amor entre um jovem, perdido na vida, e uma mulher mais velha, que está sempre aplaudindo e jogando a vida para o alto.

NT: Também tem projetos na TV?

Estou terminando de filmar a segunda temporada da série A Divisão para o Globoplay. Para mim, tem sido muito importante essa experiência no streaming, porque não podemos parar de nos informar, de nos atualizar. Quero estar sempre atuante e tentando me renovar. Faço a mãe do Marcelo Adnet, um ator que é conhecido pela comédia, e também está se destacando no drama, com um talento enorme.

NT: Há algum plano de voltar às novelas?

Estou aberta. Nós atores estamos sempre no mercado, e a porta da Globo está aberta, assim como a da Record, do SBT, da Band… Na minha saída da Globo, foram muito respeitosos e carinhosos comigo. Com a experiência que eu tenho, sei que esses momentos que acontecem no país levaram a essas mudanças drásticas, mas isso não desestabilizou a minha relação com a Globo.

NT: Falando deste momento do Brasil, o que espera das eleições?

“Não tenho uma perspectiva muito grande do que vai acontecer. Não estou conseguindo entender muito bem as propostas dos candidatos. Estão trazendo as mesmas metas que já usaram no passado e que não deram certo. Será que só eles não percebem? Tem que vir com alguma coisa nova.”

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Nívea Maria

O mundo está em um momento difícil, e precisamos de luz e raciocínio para resolver os nossos problemas. Precisamos pensar em coisas diferentes. Espero que quem for eleito consiga entender isso. Essa é a minha esperança.