Cara e Coragem: Clarice não está em coma, dizem especialistas
Mocinha tem pensamentos e ouve o que é dito; isso não é coma, segundo os médicos
Publicado em 08/09/2022 às 05:21,
atualizado em 08/09/2022 às 08:48
Na novela Cara e Coragem, a grande virada foi a descoberta de que Clarice (Taís Araújo) está viva. Mas o plano da mocinha de forjar a própria morte deu errado e o telespectador a viu como se estivesse em coma. Porém, a protagonista responde a estímulos ouvindo o que é dito e tem pensamentos sobre o que lhe é falado, com o público inclusive ouvindo, com narração em off, o que a personagem pensa. Segundo os médicos ouvidos pelo NaTelinha, ela não pode estar em coma, mas com outra situação: a Síndrome do Encarceramento.
Desde que Clarice apareceu viva, vira e mexe a personagem é vista numa cama, com equipamentos de UTi (Unidade de Terapia Intensiva) e sob cuidados de uma equipe médica. Sua secretária, a única que sabe a verdade, é a responsável por aparecer vez ou outra para lhe contar os acontecimentos da empresa. E é justamente nesses momentos que o público ouve o que Clarice está pensando, com o recurso da narração em off na voz de Taís Araújo.
A reportagem questionou especialistas se um paciente em coma ouve o que é dito ao redor e pode organizar pensamentos. "Paciente em coma ele não tem pensamento real modulado. Existem documentações de pessoas que entraram em coma, que falam que não sabe o que aconteceu durante o tempo do coma, que não ouviam nada. Tem pessoas que falam de coisas como se fossem sonhos loucos, fora do contexto. Sabia que tinha alguém ali, sabia até da presença de algumas pessoas. Mas nada da pessoa ter um pensamento coerente, uma pergunta com algum comentário feito no grupo que tá em volta dela", a afirmação é da médica Ines Bissoli, coordenadora do CTI (Centro de Terapia Intensiva) no Hospital Badim.
E ela explica que a situação de Clarice acontece, mas tem outro nome. "Quando acontece isso, da questão da pessoa estar entendendo, ouvindo e pensando, mas não consegue responder, a gente chama de síndrome do encarceramento. Pode até simular um coma, mas não é coma. Mas ela tem outras respostas, às vezes, que a gente consegue identificar que é síndrome do encarceramento e não coma", garante.
Clarice com Síndrome do Encarceramento em Cara e Coragem?
A doutora Ines explica que não existe possibilidade alguma do paciente ouvir algo quando estiver em coma. "Em coma não ouve, só se for por sedação e a sedação estiver baixa porque pode ouvir uma coisa ou outra. Agora coma por trauma não ouve".
"A síndrome do encarceramento não é coma, é uma sequela de um paciente que teve um evento neurológico. Ele não consegue se comunicar, às vezes não consegue nem se mexer, mas ele entende tudo que acontece em volta dele. Ele abre o olho, mas não consegue falar e às vezes não consegue se mexer também, mas não é coma, é síndrome do encarceramento."
Inês Bissoli
O que é a Síndrome do Encarceramento
Para entender o assunto, o NaTelinha procurou Thiago Aguiar, neurologista que atua também no Hospital Badim, que fica no Rio de Janeiro.
"Coma é o mais baixo grau de um estado do nível de consciência de um indivíduo, ele está totalmente responsivo. Ele é incapaz de despertar, mesmo que você faça um estímulo forte nele, ele não acorda. É como se ele estivesse num sono muito profundo, mas sono ainda é um estado de consciência melhor que o coma, tá num nível maior. No coma ele não acorda, não importa o que você faça", descreve ao explicar o que é o coma.
Sobre a possível doença de Clarice, na novela Cara e Coragem, o especialista ensina. "A síndrome do encarceramento é uma das piores que pode acontecer com uma pessoa na medicina. Ela perde todos os movimentos do corpo, mas ela mantém o nível de consciência".
"Isso quer dizer que ela está acordada, ela sabe o que está acontecendo com ela, mas ela é incapaz de mover todos os músculos do corpo, a não ser alguns movimentos com os olhos".
Thiago Aguiar
Ele vai além. "Isso é uma lesão no tronco cerebral, uma parte profunda do cérebro, aí você interrompe a parte do cérebro dar os comandos motores para pessoa se mexer, você interrompe aquele circuito ali e aqueles comandos não conseguem chegar até os músculos. E aí o individuo fica encarcerado em si mesmo".
E ele completa. "É um conjunto de sinais e sintomas, não é uma doença, uma entidade clínica em si. Ela é provocada por uma lesão bem específica na região do tronco cerebral. Isso pode ser ocasionado por qualquer coisa que provoque ali, um AVC, um acidente. Pode ser por tratamento também", conclui.