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Novas homenagens emocionam e abrem caminho para a Chapecoense de 2017

Território da TV


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Fotos: Reprodução

Desde o sumiço do voo 2933 da LaMia dos radares nas proximidades de Medellín na madrugada do último 29 de novembro, o futebol não foi mais o mesmo. Nem o jornalismo.

2017 começou com um emaranhado de fatos também relevantes. A crise penitenciária, a posse de Donald Trump, a morte de Teori Zavascki... Mas vai ser difícil superar no imaginário dos brasileiros a dimensão do desastre com a Chapecoense.
 
Apesar de o pífio público carioca decepcionar na reciprocidade aos colombianos, em um assunto que não cabe ser alongado nesse espaço televisivo, por milhares de quilômetros além do Engenhão o país voltou a se conectar para homenagear o seu segundo time.

Após as homenagens do luto, chegou a hora da reconstrução. E se no último sábado (21) a Globo falhou feio ao restringir inexplicavelmente apenas para paulistas e catarinenses a transmissão do primeiro jogo da nova Chape diante do Palmeiras, o mesmo adversário da derradeira partida antes da tragédia, dessa vez o novo Jogo da Amizade, agora entre Brasil e Colômbia, teve situação bem diferente, sem um “Caldeirão do Huck” e uma opção duvidosa de programação que impedisse o país inteiro de acompanhar o confronto nesta quarta-feira (25).

A CBF, de forma inédita, abriu o sinal de exibição da partida para todos os interessados. Foram muitos. E não apenas no mercado interno. Pelo mundo, diversos canais esportivos transmitiram o duelo. Outros tantos deslocaram correspondentes.

Mas nenhum jornalista consegue cobrir de forma tão intensa esse processo de renascimento da Chapecoense quanto Rafael Henzel, um dos sobreviventes do acidente. Ele dividiu a narração na Globo com o novamente gigante Galvão Bueno. A emissora, aliás, mobilizou a maior parte do público mesmo diante da larga variedade de opções.

A transmissão teve a sensibilidade de focar no que realmente importava no estádio. E o canal não foi sensível apenas nisso. Numa ação coordenada com diversos patrocinadores, alguns que nem mesmo anunciam tradicionalmente no futebol, quase 4 milhões de reais serão doados diretamente para o furacão do Oeste de Santa Catarina.

A quantia arrecadada pela TV supera com folga o valor oriundo da baixíssima renda (pouco mais de R$ 1 milhão). E o que importa, independente da fonte, é que o valor atingido deixa o objetivo maior de ajudar o time e as famílias alcançado.

Se a equipe reergue-se repleta de caras novas, quatro rostos até 60 dias atrás conhecidos em Chapecó e desde então revelados ao mundo, também dão rumo para as suas novas vidas, no mais amplo sentido possível.

Alan Ruschel, Neto, Jackson Follmann e Rafael Henzel foram as grandes estrelas celebradas pelos módicos 18 mil presentes, mas também por tantos milhões de brasileiros.

Distante do Engenhão, de sua casa em Cianorte, no interior do Paraná, estava dona Ilaídes. Seu filho Danilo inicialmente teve a mesma sorte dos demais sobreviventes, mas não resistiu. Desde então, porém, ela se tornou uma mãe para muitas pessoas.

Uma delas é o repórter Guido Nunes, a quem consolou durante um link pensando já estar fora do ar, numa das cenas mais icônicas registradas durante os dias de luto na Arena Condá. Eles puderam conversar novamente com o Brasil como testemunha.

O link também foi utilizado pela Globo. No começo do segundo tempo, depois de um Show do Intervalo repleto de emoções, Galvão preferiu seguir a conversa com dona Ilaídes por alguns instantes, por exemplo.

Foi um diferencial. O time do Brasil, que treinou apenas uma vez e jogava somente com atletas que atuam no país, não brilhou na sétima vitória seguida de Tite. E mesmo que desse um espetáculo, a atuação em campo era o que menos importava na noite. O próprio treinador rechaçou parabéns pela conquista durante a entrevista coletiva, dizendo que preferia um empate como resultado mais justo, numa noite com todos sendo igualmente vencedores.

Os momentos tocantes da transmissão global não se restringiram a ser apenas via satélite. Alan Ruschel foi o primeiro a visitar a calorenta cabine, que rendeu pedidos de Galvão para que o Botafogo, atual locatário do estádio, providenciasse o ar-condicionado do espaço.

Visivelmente o jogador mais próximo de voltar aos gramados tamanho o avanço da sua recuperação, ele acabou ficando como comentarista até o fim do jogo.

Após, especialmente no intervalo, a conversa principal foi com Jackson Follmann, que recebeu alta hospitalar apenas um dia antes do jogo. O goleiro chegou até mesmo a providenciar uma boa cantoria gospel para celebrar a vida.

Para Galvão, “em 42 anos de profissão, esses últimos dias tem sido uma prova de força realmente”. Era preciso mesmo muita força para não se emocionar. Júnior e Casagrande relatavam a vontade de entrar em campo e até mesmo Leonardo Gaciba, comentarista de arbitragem, dizia que sairia da aposentadoria para apitar o confronto.
 
Ao contrário dos ex-jogadores e do ex-árbitro, um dos presentes ali na cabine fazia exatamente o que mais gosta e deseja: Rafael Henzel, já citado alguns parágrafos atrás, mas que merece uma menção mais longa.

Sem carreira fixa narrando na televisão, tendo feito apenas uma breve passagem no SporTV para o Pan 2007, o locutor que mostra uma serenidade incrível desde as primeiras entrevistas dominou os microfones da Globo como se fossem os da Rádio Oeste Capital.

O gol em si ele narrou apenas no replay. Mas mesmo um 0 a 0 já o teria consagrado.

A carga emocional, o nervosismo natural, a inexperiência no meio, o ritmo “quebrado”... Nada disso chegou ao conhecimento do radialista, que brilhou. Ajudado pela generosidade de Galvão na dobradinha, que sempre o entregava nas chances de gols, ele se mostrou um grande narrador, pronto para a função também na TV. Voz e postura boas em qualquer contexto. Ainda mais para quem estava em um avião caído há menos de dois meses.
 
Menos tempo ainda tem o filho do jornalista Guilherme Van der Laars, morto no desastre. Gabriel nasceu no último dia 3. E ganhou uma homenagem no encerramento da transmissão que pode ser marcada pelo repetido lema de que “nós torcemos juntos, nós choramos juntos, mas também nos levantamos juntos”.

Assim como o nascimento do bebê, os jogos de sábado e de ontem estabelecem esse marco. É o começo de uma nova Chape, que terá a Libertadores, a emocionante Recopa e até um duelo com o Barcelona no Camp Nou pela frente. Haja emoção. Aquele fatídico dia de 2016 jamais será esquecido, mas agora dividindo espaço com a chance de se olhar também ao futuro.
 

O colunista Lucas Félix mostra um panorama desse surpreendente território que é a TV brasileira. Ele também edita o https://territoriodeideias.blogspot.com.br e está no Twitter (@lucasfelix)

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