Publicado em 30/09/2020 às 05:11:00
Em 2021, a Globo fará uma nova versão de Pantanal, novela da extinta Manchete que, exibida em 1990, se tornou um fenômeno como poucas vezes se viu em sete décadas da TV brasileira. A notícia do remake pegou muita gente de surpresa, incluindo a atriz Andrea Richa, a Muda da produção original. Em entrevista exclusiva ao NaTelinha, ela explica seu sumiço da televisão, opina sobre o remake deste épico de Benedito Ruy Barbosa e revela que teve dificuldade de gravar sua última cena na trama por um “bloqueio”.
Para Andrea Richa, a equipe da Globo terá um grande desafio ao refazer uma história que segue viva na memória do público. “Acho que será muito difícil atualizar Pantanal criando a mesma atmosfera. O que aconteceu naquela época foi uma conjuntura estelar e divina, difícil de recriar. Porém, desejo muita sorte a todos os envolvidos no projeto, e que eles tenham uma experiência maravilhosa como a que tivemos há 30 anos”, diz.
Muda era o apelido de Maria Ruth, que surge na trama com o objetivo de vingar o assassinato de sua família. Planeja a morte de Maria Marruá (Cássia Kiss), mãe da protagonista Juma (Cristiana Oliveira), e finge não poder falar para se fazer de frágil e conseguir guarita na casa das inimigas. Com o tempo, desenvolve amizade por Juma e se apaixona por Tibério (Sérgio Reis).
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Qual atriz poderia dar vida à personagem na nova versão? “Essa é a pergunta que vale um milhão de dólares (risos)”, brinca Andrea Richa, que aposta em uma iniciante, desconhecida do público – como era ela, em 1990. “Acredito que a fórmula encontrada pelo Jayme Monjardim [diretor da novela] foi vencedora. Os atores mais maduros da trama eram consagrados, renomados, e os jovens eram todos praticamente estreantes”, recorda.
“Ninguém sabia o que esperar daqueles rostos novos. Não havia vício nem referência marcante da nossa imagem, mas um frescor e uma química incrível que transbordava por todos os poros da novela. Posso até imaginar quais atrizes fariam bem a Muda, a Juma, a Guta, mas essas personagens vivem em um mundo tão distante do nosso. Elas têm que vir frescas. É preciso encontrar o personagem no ator, não o contrário”, opina.
“Não recebi [convite para interpretar] a Muda, eu fui atrás dela!”, revela Andrea Richa. A atriz havia participado de O Salvador da Pátria (1989), na Globo, e soube pela amiga Cristiana Oliveira (foto/acima) que a Manchete realizava testes para uma novela que seria filmada no Pantanal. “Na mesma hora, pensei: ‘Tenho que fazer parte disso, tem tudo a ver comigo’”, conta.
Ela conversou, então, com o diretor global Paulo Ubiratan – que já tinha outros projetos para ela –, avisando que tentaria uma vaga na emissora concorrente. “Era como um chamado interno. Então, meu filho, aos 20 e poucos anos, eu troquei o certo na Globo por uma chance na Manchete”, relata Andrea.
No teste com os diretores, quando o elenco já estava quase inteiramente fechado, Andrea foi desafiada a imaginar que estava com um bebê no colo e teve que reagir a tudo que os diretores Jayme Monjardim e Carlos Magalhães narrassem. Com um porém: não poderia falar nada, atuando apenas com o olhar.
“No fim daquele teste, me perguntaram se eu teria problemas em fazer cenas de nudez. Ali, fiquei muda de verdade (risos). Mas explicaram que seria tudo dentro de um contexto de ambiente natural, então entendi na hora.” Dias depois, ela ficou com a personagem inicialmente destinada a Cristiana Oliveira, que foi remanejada no elenco para viver Juma Marruá.
Em poucos capítulos, Pantanal já havia se tornado um megasucesso, conquistando o primeiro lugar de audiência para a Manchete e transformando os atores em estrelas instantâneas. “Pantanal foi exibida em vários países e não houve um pedaço de chão em que passei, na América do Sul, na Europa e nos EUA, que não viesse, em um determinado momento, um estrangeiro me abordando e falando da novela com o maior carinho. Poucos atores conhecem essa emoção, que é muito gratificante”, avalia Andrea.
As filmagens no coração do Brasil foram inesquecíveis, segundo a atriz. “A cada chegada do elenco, o Pantanal tinha um colorido diferente, como se as estações mudassem o tempo todo. Víamos a vida pulsando, as mudanças na época do cio dos bichos, as árvores alagadas até o topo, com tuiuiús nas copas... Tudo se transformava diante dos nossos olhos.”
Não faltam histórias para contar daqueles bastidores. “Estávamos cercados por piranhas, jacarés, sucuris, onça… Teve gente que se perdeu de barco naqueles veios dos rios, que encontrou cobra no quarto em que dormia... E a primeira vez pelada em um rio de piranha, a gente nunca esquece”, se diverte.
Ela lembra que sua última gravação foi em estúdio, longe do Pantanal, mas enfrentou um bloqueio por não querer se desligar da novela. “Entrava em cena e começava a chorar. Não conseguia falar uma frase. Repeti várias vezes e, quando consegui, já estava com o rosto inchado. Quando lembro desse momento, ainda me emociono. Foi como se eu falasse para mim mesma: ‘Não entra! Vai acabar se você entrar!’.”
A experiência da novela, é certo, será diferente para o elenco de três décadas depois. O Pantanal enfrenta, neste ano, uma das maiores devastações da história, com queimadas que já duram mais de dois meses e vêm causando a destruição da flora e a morte de animais, inclusive os ameaçados de extinção. Estima-se que 3,5 milhões de hectares já foram destruídos.
“O que mais maltrata o Pantanal é a falta de entendimento das autoridades de que quem conhece aquele lugar é o homem pantaneiro. É preciso respeitar aquele que conhece o manejo, que sabe como e o que fazer, para realmente proteger o Pantanal. Por exemplo: em época de seca, quando as baías secam, os bichos se socorrem nas piletas criadas por quem vive lá.”
Ela torce para que a nova versão da novela possa despertar a atenção necessária a essa que é uma das maiores biodiversidades do planeta. “Espero que os atores, ao se depararem com esse cenário desolador, escutem a voz dos pantaneiros e, como formadores de opinião, disseminem e ampliem essa voz. O remake pode ser um ponto de convergência importante.”
A atriz está longe da televisão há 22 anos. Após a Muda de Pantanal, ela seguiu nas novelas, mas fez sua última participação em Mandacaru (1997-98), também na Manchete. “A vida me levou para outros caminhos. Fui morar em Brasília por conta de um relacionamento, depois vivi entre os EUA e o Brasil. Fui me ocupando com outras atividades. Sou formada em jornalismo, tenho outros interesses, tive negócios… Acabei me afastando naturalmente da TV”, explica.
Com a pandemia do coronavírus, ela desengavetou projetos culturais que pretende tocar em breve. “O campo de atuação se expandiu muito nos últimos tempos, o mercado de arte e de cultura explodiu com tantas mídias”, avalia. Aos 56 anos, voltar às novelas não está nos planos, mas a veterana não afasta essa possibilidade caso convites apareçam. “As telas do cinema e da TV sempre foram minha paixão, então nunca vou dizer que não”, conclui Andrea Richa.
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