Violentada

Klara Castanho: "Carência no ensino de médicos para lidar com vítimas", diz ginecologista

Ginecologista explicou que falta ensino para médicos residentes

Klara Castanho revelou que sofreu violência médica após estupro e gravidez - Foto: Reprodução
Por Daniel César

Publicado em 26/06/2022 às 18:05:00,
atualizado em 26/06/2022 às 18:39:01

Se Klara Castanho virou símbolo de uma luta silenciosa das mulheres, a dor sofrida pela atriz trouxe à tona outro dado importante: a forma como médicos e profissionais de saúde lidam com a situação. A jovem de 21 anos afirmou não ter recebido nenhuma empatia por parte da equipe médica que a atendeu e isso é muito mais comum do que parece e a culpa disso é a falta de instrução a profissionais que estão chegando ao mercado. A afirmação é da ginecologista e obstetra Camila Curado, em conversa com o NaTelinha.

Em seu sofrido depoimento, Klara Castanho falou que foi estuprada e que, meses depois, se descobriu grávida durante um exame de rotina. "O médico não teve nenhuma empatia por mim. Eu não era uma mulher que estava grávida por vontade e desejo, eu tinha sofrido uma violência. E mesmo assim, esse profissional me obrigou a ouvir o coração da criança, disse que 50% do DNA eram meus e que eu seria obrigado a amá-lo", escreveu em sua carta aberta pouco antes de receber apoio massivo de diversos artistas.

Embora pareça absurda a afirmação do médico, ela é mais comum do que deveria e, segundo a doutora Camila, a culpa é da formação dos profissionais.

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"Infelizmente, ainda existe uma carência no ensino dos médicos residentes a lidar com vítimas de violência, ou mesmo mulheres que não desejam a gestação por outros motivos. O que deve prevalecer em uma situação como essa, assim como em qualquer atendimento médico, é o respeito ao desejo da paciente"

Doutora Camila Curado


Segundo a médica, no entanto, é importante ponderar que o procedimento é comum. "Faz parte do exame da gestante ouvir o coração do bebê. Mas se a paciente expressa que não deseja ouvi-lo, esse desejo deve ser respeitado. O que o médico deve fazer é informar o motivo do exame (ouvir a frequência coração é um dos meios de avaliar o bem estar do bebê) e oferecer, quando disponível, outra forma de avaliação do bebê, sem que precise expor a mulher ao som dos batimentos", revela.

Grávida, como Klara Castanho, menstrua?

Outro ponto que surgiu após o doloroso desabafo da atriz Klara Castanho é se uma mulher grávida pode menstruar. Segundo a doutora Camila Curado, não pode. "Durante a gravidez a mulher não menstrua. O que acontece é que algumas mulheres podem apresentar sangramentos (na maior parte das vezes leve) durante a gestação, o que é mais comum nos primeiros meses. E esses sangramentos podem ser confundidos com menstruação, principalmente se a mulher já tinha os ciclos irregulares".

Sobre o fato da atriz ter dito que seguiu menstruando, a médica tem uma explicação. "Existem diversas causas de sangramento na gestação, como descolamento subcoriônico, alterações no colo do útero, infecções, placenta baixa, entre outras. O estresse psicológico afeta o organismo de diversas formas, e estudos mostram que ele pode estar associado ao aumento de risco de eventos adversos durante a gravidez, como sangramentos, aborto, entre outros".

Questionada se o estupro pode ter sido o causador do sangramento confundido com a menstruação, ela acha difícil. "Não. A menos que o estupro tenha resultado em uma infeção no colo do útero (visto que ocorreu relação sem protecao), que poderia estar causando o sangramento. Mas esse caso é menos provável".

Quantas Klara Castanho existem?

Dados oficiais mostram que, a cada 10 minutos, uma mulher é estuprada no Brasil e quantos dessas acabam gerando gravidez indesejada. A doutora Camila, mesmo tendo trabalhado em outra área, já esteve em hospital referência sobre o tema e mostra dados chocantes. "Eu fiz um ano de especialização no Hospital Pérola Byington, em São Paulo. O hospital é referencia lá em atendimento a vítimas de violência sexual e em realização de aborto legal. Infelizmente o numero de atendimento a mulheres vitimas de violência, e toda semana eram realizados abortos legais", lamenta.

Enquanto mulheres continuam sendo vítimas, como Klara Castanho, e ainda engravidam, a maioria absoluta dos estupradores ficam livres. Dados oficiais do Governo Federal mostram que 99% dos casos de estupro denunciados ficam sem solução, enquanto o país discute se a mulher grávida após ser violada, deve ou não doar a criança, pode ou não praticar o aborto e ela terá que lidar com os traumas para sempre.



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