Análise

Decisão da Comcast de vender seus canais a cabo é um alerta para a Globo

Decisão da Comcast de separar seus canais pegou o mercado de surpresa e pode influenciar o futuro do setor de TV paga no Brasil

Frente da sede da NBCUniversal nos EUA - Montagem/NaTelinha
Por Sandro Nascimento

Publicado em 22/11/2024 às 10:40:00

A decisão da Comcast de separar seu negócio de canais a cabo nos EUA, que incluem CNBC, USA, E! e Syfy, em busca de um comprador, pegou o mercado de surpresa. A subsidiária da NBCUniversal não acredita no potencial deste mercado e não prevê crescimento. No Brasil, esse cenário do conglomerado americano serve como um alerta para o Grupo Globo, que detém 26 canais a cabo. Se nos EUA, onde cerca de 98% dos lares já tiveram TV a cabo, um grande estúdio não quer mais o setor, imagine o futuro aqui, onde no auge chegou a apenas 30% do total de brasileiros. 

De acordo com o The Wall Street Journal, nos últimos 12 meses, MSNBC, CNBC, USA, Oxygen, E!, Syfy e Golf Channel tiveram uma receita de US$ 7 bilhões. A publicação não menciona o lucro. Ao vender esse ativo neste momento, a Comcast busca realizar o negócio enquanto ele ainda possui algum valor de mercado. Esperar de 5 a 10 anos pode resultar em uma depreciação significativa. 

RedeTV! prepara revolução para fortalecer o jornalismo, produzir novelas e busca reality 

+SBT completa 3 meses: diretora entrega novidades e faz balanço 

A Comcast fará um spin-off - a criação de uma nova empresa a partir da separação de parte de uma empresa existente - dos seus canais a cabo. A cisão levará cerca de um ano. Esse novo negócio está sendo chamado de “SpinCo” e terá capital aberto.

No Brasil, a NBCUniversal já tinha sinalizado que não acredita mais no futuro da indústria da TV a cabo. Neste ano, desistiu dos canais Telecine que foi comprado integralmente pelo Grupo Globo. A operação foi aprovada pelo Cade, conforma antecipou o NaTelinha.

Por aqui, ano após ano, o número de assinantes de TV paga vem caindo vertiginosamente, enquanto as assinaturas das plataformas de streaming estão crescendo. Em setembro, segundo a ANATEL, o país tinha 8.644.649 de assinantes, o que representa uma queda de 21% apenas nos últimos 12 meses.

VEJA TAMBÉM

Canais da Globo perdem valor 

Seguindo a estratégia dos executivos da Comcast, em aproximadamente 10 anos, o montante de venda dos canais Multishow, GNT, BIS, Gloob, Viva, Canal Brasil e Megapix, da Globo, será consideravelmente menor do que é atualmente.

Por isso, em breve, esse portfólio do Grupo Globo precisará ser reavaliado do ponto de vista do ecossistema de negócios, pois não deve funcionar da mesma maneira no futuro e seu desinteresse pelas operadoras de TV por assinatura resultará em desvalorização. O que terá valor é o conteúdo da Globo, que hoje abastece de forma robusta o Globoplay.

Esse movimento da desvalorização da programação linear na TV paga já é uma realidade. Atualmente, no Brasil, a reportagem apurou que alguns canais, de grupos de mídia menos influentes que a Globo, não estão mais sendo remunerados pelas operadoras de TV a cabo. Eles entram no line-up como uma vitrine, e o que faturam na comercialização é parcialmente repassado para essas empresas de telecomunicação.

Nos EUA, a Disney já havia sinalizado a intenção de vender seus canais por assinatura, mas recuou, alegando que o preço não seria rentável. No entanto, nos bastidores, comenta-se que essa justificativa foi usada apenas para encobrir a falta de um comprador em potencial. A TV por assinatura, como é hoje, é vista como um negócio do passado.

A estratégia da Claro TV pode indicar o futuro das operadoras de cabo. A empresa vem integrando todas as plataformas em seu box, permitindo que o cliente tenha acesso aos aplicativos por um único valor. Em julho, em entrevista ao NaTelinha, Alessandro Maluf, diretor de produto de vídeo da Claro, explicou a estratégia da empresa.

“É um combinação mais econômica e a conveniência do conforto de estar tudo num lugar só. A analogia que eu faço nossa função aqui é como se fosse um shopping center. E dentro do meu shopping center eu tenho que ter as lojas e principalmente as âncoras. A questão aqui é encontrar um modelo de negócio que seja bom para o consumidor no final. Então tem uma série de negociações acontecendo com todo mundo. A gente quer ter todos (os apps).”

Alessandro Maluf, diretor de produto de vídeo da Claro

TV a cabo é a nova Blockbuster?

Não por acaso, a NBCUniversal continuará investindo na Peacock, sua plataforma de streaming. No início do mês, a Walt Disney divulgou que a Disney+, Hulu e ESPN+ alcançaram um lucro de US$ 321 milhões no trimestre, o que ajudou a compensar uma queda de 38% na receita operacional das suas redes de televisão.

O mercado de TV por assinatura está em transição, e a decisão da Comcast deve, de alguma forma, influenciar o setor no Brasil. A expectativa agora é sobre quais serão os próximos passos da Globo.

Em resumo, você compraria hoje o modelo de negócio de videolocadora da Blockbuster? Esse é o problema que a Comcast quer evitar ao se desfazer agora de seus canais a cabo.

TAGS:
NOTÍCIAS RELACIONADAS
MAIS NOTÍCIAS