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TV Crítica: Criatividade em série, o novo trunfo da TV nacional


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Cena da série "3%" - Divulgação

É estranho pensar que, no país da teledramaturgia, o gênero seriado tenha uma representatividade tão tímida na programação. Pelo menos essa era a nossa realidade até pouco tempo. Felizmente, o telespectador brasileiro ampliou seus horizontes e passou a valorizar outros formatos que não a telenovela. Embora o gênero ainda seja preferência nacional, outras fontes de entretenimento ganharam força, em especial no primetime. Sim, caras pálidas, o melodrama tradicional está aos poucos convergindo com outras linguagens e com outras estéticas. O público está mais exigente, mais crítico e mais aberto às inovações. E diante dessa demanda, a TV brasileira reagiu e investiu em novas fórmulas.

Somente este ano, a Rede Globo, a maior exportadora brasileira de teledramaturgia, trouxe de uma só vez cinco novas propostas de seriado. Uma estratégia audaciosa, visto que tais produções possuem custos elevados e necessitam de uma equipe técnica altamente especializada.

A safra das novas séries nacionais da Globo estreou em abril com a exibição do malfadado "Batendo Ponto", aos domingos. A comédia, que mostrava a rotina de uma secretária e seus colegas de trabalho em uma empresa, não rendeu os índices esperados pela emissora e teve seu fim decretado antes mesmo do término da primeira – e certamente última – temporada.

Apesar do fracasso da história estrelada por Ingrid Guimarães, a emissora obteve bons resultados com a exibição dos demais seriados. "Tapas & Beijos", sobre duas amigas que trabalham em uma loja de vestidos de noivas, conquistou índices compatíveis com o horário. O mesmo desempenho teve a versão seriada do filme “Divã”, de José Alvarenga, estrelado pela atriz Lilia Cabral. Completado o cardápio, mas com uma repercussão um pouco mais fria, estrearam "Lara com Z", protagonizado por Suzana Vieira, e "Macho Man", com Jorge Fernando e Marisa Orth.

Novas fontes, novos incentivos

Não é só de Globo que sobrevive a dramaturgia brasileira. Vários canais a cabo estão criando conteúdo próprio e de qualidade, muitas vezes viabilizado por produtores independentes, financiado pela Lei Rounet de incentivo à cultura e por outros agentes públicos e privados.

Com o objetivo de fomentar a teledramaturgia independente e a produção de minisséries voltadas para jovens das classes C, D e E, o FICTV/Mais Cultura custeou a produção de oito episódios piloto, exibidos pela TV Brasil para todo o país.

A primeira etapa recebeu 225 projetos de minisséries. Desses, oito foram premiados com R$ 250 mil para produzir o piloto. Três projetos receberam o prêmio final de R$ 2,6 milhões para a finalização de 13 episódios com 26 minutos cada e a exibição em TVs públicas: "Brilhante Futebol Clube", "Natália" e "Vida de Estagiário".

3% - uma série ambiciosamente qualificada

Dos oito finalistas do FICTV/Mais Cultura, um deles se destaca pelo ineditismo de sua proposta: a série “3%” (lê-se: três por cento). Explorando o universo jovem de forma ficcional e inovadora, a história aborda um processo seletivo bastante perturbador. Nesta maratona, restrita apenas para jovens de 20 anos, apenas 3% dos inscritos serão aprovados e aceitos em um mundo com oportunidades e com a promessa de uma vida digna. A escolha, contudo, é cruel, composta por provas cheias de tensão e situações limites de estresse, medo e dilemas morais.

A série é permeada pelo suspense vivenciado pelos personagens que lutam para fazer parte dos 3% vencedores. O projeto se diferencia justamente por tratar das dificuldades do cotidiano dos adolescentes reais. As situações vividas na ficção, repletas de ansiedade e inseguranças, são comuns aos jovens do mundo de hoje. O jogo cênico, contudo, não atrai somente o público teen. A argumentação, forte e incisiva, parece ter sido inspirada no roteiro transgressor de “1984”, de George Welles.

Na série "3%", nota-se um cuidado especial na montagem, na cenografia e na direção dos atores. Quem entende um pouco da linguagem cinematográfica percebe que os elementos cênicos foram todos arquitetados. Nada está ali de graça, nem a cor acinzentada dos ambientes, tampouco os elementos semióticos que alguns personagens carregam em seu vestuário. A complexidade dos personagens também é bem explorada pelo elenco da série, que conta com artistas jovens e talentosos, bastante à vontade com a temática e com o enredo.

O piloto do seriado está disponível no You Tube, dividido em três partes. A continuidade da série só será possível caso alguma emissora invista na proposta e custeie a produção da primeira temporada, o que é bastante provável, já que se trata de um produto que tem tudo para estourar e garantir público cativo. Confira:



Um mercado em franca expansão

O gênero seriado no nosso país está crescendo a passos largos. Capacidade técnica e qualificação profissional nós temos. Vontade de fazer bem feito, então, nem se fala. Temos público, demanda, atores brilhantes e roteiristas audaciosos. Dentro da Rede Globo, essa combinação é suficiente para viabilizar um novo seriado. Fora dela, a realidade castiga a ficção. Muitas vezes vira uma novela. Que sequer sai do papel.


João Claudio Lins
é bacharel em Publicidade, especialista em Propaganda e Marketing e em Novas Mídias, Rádio e TV. Autor do Blog Circo Eletrônico: www.circoeletronico.blogspot.com. Contato: joaoclins@yahoo.com.br. Twitter: @joaoclaudiolins

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