"Uma pessoa tava ganhando mais que a outra. E houve uma confusão. Depois acertaram tudo isso, e ele entrou pra dar essa reunião, onde ele colocou que iria normalizar pra todo mundo e que todos ganhariam igual."
Publicado em 28/10/2021 às 04:30:00,
atualizado em 28/10/2021 às 09:39:43
Dia 28 de outubro de 2001. Há exatos 20 anos, estreava o primeiro reality show de confinamento do Brasil, a Casa dos Artistas, apresentado por Silvio Santos no SBT. O Homem do Baú, que meses antes chegou a negociar o formato do Big Brother com os holandeses da Endemol, surpreendeu o público brasileiro ao confinar famosos por sete semanas. O programa se transformou em mania nacional, derrotou o até então imbatível Fantástico e fez até O Clone (2001-02) - atualmente em reprise - passar apuros.
Silvio Santos não é bobo e não escolheu a data de estreia por acaso. Projeto sigiloso e guardado a sete chaves, apenas o dono da emissora e pouquíssimos executivos sabiam do que estava por vir. A Casa dos Artistas estreou um dia após a edição do Teleton daquele ano, que foi ao ar nos dias 26 e 27 de outubro. Aliás, foi justamente naquele Teleton que Silvio deu o tão famoso selinho no cantor Gilberto Gil.
A maratona beneficente que ocorre anualmente no SBT é sempre sinônimo de movimentação, entra e sai de jornalistas, artistas, funcionários, voluntários. A estreia ter ocorrido no domingo seguinte não foi um mero acaso e todo esse "tumulto" do Teleton colaborou para que nada vazasse.
Foi Silvio Santos quem comandou pessoalmente a contratação dos 12 artistas (Bárbara Paz, Supla, Mari Alexandre, Patrícia Coelho, Alexandre Frota, Mateus Carrieri, Taiguara Nazareth, Nana Gouvêa, Núbia Óliver, Marco Mastronelli, Leandro Lehart e Alessandra Scatena) para entrar na casa e exigiu o termo de confidencialidade. Absolutamente ninguém noticiou que um reality de confinamento estrearia naquele 28 de outubro de 2001.
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A programação daquele dia era, de acordo com arquivos do jornal Folha de S. Paulo, simplesmente:
12h45 - Programa Silvio Santos
00h15 - Freedom: Além de Qualquer Liberdade
Era bastante comum não denominar os "quadros" do Programa Silvio Santos, que ainda no começo dos anos 2000 era intitulado desta forma, com atrações em formatos de programas dentro dele. Naquele domingo, especialmente, a surra que o SBT aplicou na Globo no Ibope começou desde cedo com o Qual é a Música?, batendo o Gente Inocente e o Planeta Xuxa no período da tarde.
Durante o game é que começaram a pipocar as chamadas da Casa dos Artistas com um texto, aparentemente, redigido pelo próprio Silvio Santos. "O que será que vai acontecer esta noite na Casa dos Artistas? Você vai olhar pelo buraco da fechadura e vai ver o que fazem os artistas, na intimidade do dia-a-dia. Hoje, logo após o Domingo Legal do Gugu, não perca o programa mais audacioso da televisão", prometia.
Às 20h40, Gugu Liberato dizia: "E vem aí, a Casa dos Artistas, com Silvio Santos!". E o loiro mal sabia o que era. Depois disso, os dois ainda fariam várias interações épicas antes do reality começar.
Posteriormente, Gugu e Silvio Santos conversavam por alguns minutos para fazer o Ibope subir, e sempre dava certo. Das 20h40 às 21h43, Silvio Santos apresentou, de maneira pré-gravada, os 12 artistas confinados, e deu um banho de audiência na Globo: 33 pontos ante 25 do Fantástico. Cada ponto, naquela época, equivalia a 44 mil lares na Grande São Paulo (hoje são 76.500 mil). Rodrigo Carelli, diretor da Casa dos Artistas e atualmente de A Fazenda, contou numa entrevista recente à Celso Zucatelli que o dono do SBT não se animou no início e fez essa primeira parte de certa maneira, murcho. "É só isso?", perguntou o Homem do Baú ao constatar que o vencedor levaria "apenas" R$ 300 mil depois de sete semanas, acreditando que o formato era demasiado simples. A injeção de ânimo veio depois, ao vivo, quando soube que tinha vencido a Globo.
Entre 21h43 e 22h45 foi exibido uma edição do Show do Milhão, que também estava no auge: empatou em 30 pontos com o Show da Vida. Logo depois, das 22h45 às 23h32, entrou uma segunda parte da Casa dos Artistas, que perdeu para o No Limite 3, por 27 pontos a 31.
Domingo histórico para o SBT, que viu nascer o reality de maior sucesso da história da TV até hoje, se tornando em fenômeno. A Casa dos Artistas virou pauta de programas e de todo o público brasileiro, que parava para acompanhar Silvio Santos interagindo com os artistas, além da intimidade dessas 12 pessoas diariamente, às 21h.
Em um tempo onde tudo era "mato", Silvio Santos não se furtava em dar informações privilegiadas aos seus moradores. Na primeira votação, o apresentador permitiu que todos eles escutassem os votos dos telespectadores em uma dinâmica de eliminação que hoje é inimaginável. Veio daí a acusação de que Alexandre Frota era manipulador. A chuva de informações caiu como uma bomba no confinamento, o que ajudou Frota a pedir o boné e sair da casa.
O atual deputado encarava a Casa dos Artistas como um grande jogo e se viu vulnerável. Apesar de ter saído, Silvio o convenceu a voltar, e munido de informações extras, não hesitou em alardear no sucesso que o reality se transformou.
O próprio dono do SBT também, em visita aos moradores, naquela que virou uma das capas da revista Veja, falou sobre a audiência da Casa e fez um pedido. "O Silvio pediu pra gente ter mais cuidado com a nossa imagem, porque a gente ficava sem maquiagem. A gente ficava toda descabelada, meio que desleixada. Foi alguma coisa direcionada a nós", destacou recentemente Nubia Oliiver ao NaTelinha, que também se recordou que houve um conflito por cachês na ocasião.
"Uma pessoa tava ganhando mais que a outra. E houve uma confusão. Depois acertaram tudo isso, e ele entrou pra dar essa reunião, onde ele colocou que iria normalizar pra todo mundo e que todos ganhariam igual."
Nubia Oliivercontinua depois da publicidade
Silvio dava informações externas ao vivo no domingo sem cerimônia. Ele lia os jornais e fazia daquilo um show. Lia os favoritos do público e chegou até a comentar que o Brasil se classificou para a Copa do Mundo de 2002, numa conversa com Mateus Carrieri em edição de 18 de novembro de 2001.
O ator perguntou se o Brasil havia se classificado. A seleção então treinada pelo técnico Luiz Felipe Scolari, o Felipão, estava desacreditada e correndo riscos de não ir para a Coreia do Sul e Japão. Carrieri mencionou que não ouviu fogos ou nada parecido, e por isso indagou o apresentador.
Prontamente, Silvio Santos informou que o jogo do Brasil não aconteceu naquele domingo que o participante se referia, por isso não ouviu fogos. A seleção entrou em campo quatro dias antes, em 14 de novembro. "O Brasil se classificou para a Copa, vencemos por três a zero a Venezuela", anunciou, para delírio dos participantes.
Em 2002, com a segunda e terceira temporada quase coladas, Silvio apelou nas mudanças de regras e acabou desgastando o formato, que nunca mais voltou ao ar como conhecemos. Houve, em 2004, o resgate do título, mas se tratava de um formato hispânico, que também acabou não vingando.
Na terceira edição, Silvio inventou uma regra que a eliminação havia sido simplesmente abolida. Agnaldo Timóteo era quem mais causava no confinamento, e no terceiro programa, quando Solange Frazão e o cantor foram para a berlinda, o dono do SBT declarou que "só teria a perder com a saída de um dos dois". E instigava o público a empatar a votação ao vivo, para que ninguém saísse. Resultado: oito participantes, dos 12, foram para a final, que consagrou Sérgio como campeão.
Em 2015, depois do processo da Globo e Endemol contra o SBT ter passado por todas as instâncias, a Justiça entendeu que a Casa dos Artistas era plágio do BBB. A ação girava em torno dos R$ 18 milhões.
Silvio teve o formato nas mãos no ano 2000, mas comenta-se que ele achou os custos altos. Nas negociações, obteve acesso a toda mecânica do reality e um manual de como realizar o programa, os melhores lugares para colocar câmeras e que tipo de participantes chamar.
Com o trato não feito, os representantes da emissora assinaram um acordo com a Endemol, garantindo que mesmo que não tivessem aceito a atração, as informações obtidas sobre o programa não seriam usadas. O resultado, já conhecemos. A Casa dos Artistas entrou para a história da TV.
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