Série biográfica

Globo reinventa aborto de Hebe; saiba a história real

Cena em que apresentadora perde bebê será exibida nesta quinta

Valentina Herszage interpreta Hebe em série da Globo (Foto: Reprodução/TV Globo)
Por Paulo Pacheco

Publicado em 13/08/2020 às 05:31:00

O terceiro episódio de Hebe, que irá ao ar nesta quinta-feira (13), retrata dois dos acontecimentos mais importantes na vida da dama da TV brasileira: o aborto e a inauguração da Tupi, em 1950, da qual ela não participou para sair com o amante. A história que a Globo conta, entretanto, é muito mais dramática do que a real.

A série está disponível no Globoplay, plataforma de streaming da Globo, desde 13 de dezembro, mas se você só assistirá na TV deixamos o aviso: a partir deste momento, o texto contém spoilers do capítulo que a emissora exibirá nesta noite.

O segundo episódio termina com a primeira relação sexual de Hebe (Valentina Herszage) com o namorado, Luís Ramos (Daniel de Oliveira), chefe em vários veículos de comunicação. Era diretor da rádio Excelsior e um dos donos do jornal Folha de S.Paulo. Apaixonada, a então cantora revelação é enganada pelo empresário, que estava casado e prometeu se separar.

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A série mostra que Hebe engravidou em sua primeira transa, o que realmente aconteceu de acordo com a própria apresentadora. A partir daí, a história é totalmente ficcional. Em meio ao lançamento da Tupi, primeira emissora de TV do Brasil, o casal aparece testemunhando a chegada dos televisores importados por Assis Chateaubriand ao porto de Santos, porém a relação está estremecida.

Na vida real, Hebe perdeu a noite de inauguração da Tupi, em 18 de setembro de 1950, alegando rouquidão. Anos depois, contou ter "furado" o evento de gala para passar uma noite com Luís Ramos. A série, entretanto, une o aborto sofrido pela apresentadora e o marco zero da televisão brasileira na sequência mais emocionante do terceiro episódio.

Hebe aparece animada para inaugurar a TV ao lado da amiga Lolita Rodrigues (Ana Vitória Bastos). Quando chega ao local, depara-se com Luís Ramos ao lado da mulher, Manuelita (Amanda Lyra), grávida. Desolada, ela volta para casa às pressas e provoca o aborto no banheiro, enquanto Lolita canta o Hino da Televisão Brasileira. O ralo da banheira se funde ao centro do programa Roda Viva (1987), reconstituído pela Globo, no trecho em que a apresentadora revela já ter abortado.

Aborto real e estreia da TV

Embora a Globo deixe bem claro que a série sobre Hebe é "uma obra de ficção", entrevistas da apresentadora desmentem facilmente uma de suas mais marcantes histórias pessoais. O aborto e a estreia da TV, por exemplo, aconteceram em um intervalo de mais de dois anos.

No Roda Viva, fielmente retratado na série, Hebe é questionada por Boris Casoy sobre a legalização do aborto. Desconfortável, ela diz considerar a questão “pessoal” e “delicada” das mulheres. Ruy Castro emenda perguntando se a apresentadora já tinha abortado. Ela confirma.

"Eu fiz. Fiz justamente porque eu achei que era uma coisa muito delicada esse filho ter irmã de um mesmo pai com outra mulher, outra irmã com outra mulher, outra irmã com outra mulher. Essa criança ia ficar com uma cabeça tão louca, tão louca, que ela ia ficar sem saber que mundo em que estou naquela época. Então eu acho que é uma coisa muito pessoal. Eu não aconselho as pessoas a fazerem. Não aconselho. Acho que é uma coisa que cada um tem que saber o que deve fazer. É uma coisa de conscientização própria", responde.

Dez anos após a sabatina na Cultura, em setembro de 1997, a revista Veja publica uma capa histórica, com mulheres famosas e anônimas revelando terem abortado. Hebe detalha a sessão sem anestesia, versão completamente diferente da contada pela produção da Globo.

"Eu tinha 18 anos e um corpinho lindo, sobrancelhas grandes, cabelos compridos e escuros. Começava minha carreira de cantora no rádio. Na minha primeira relação sexual fiquei grávida. Não podia contar para ninguém. Meus pais sempre foram muito severos e naquela época era uma perversão ter relação sexual sem se casar. Contei para uma amiga, uma vizinha. Ela soube de um local onde uma mulher fazia aborto. Ela não era médica. Numa sala pequena, sem anestesia, sem medicamento nenhum, fez a curetagem. A dor era tão intensa que ameacei gritar. Jamais vou esquecer-me daquela voz falando em tom alto e áspero para eu calar a boca", afirma.

Hebe tinha 18 anos três anos antes da inauguração da Tupi (completou 19 em 8 de março de 1948), portanto o aborto no dia da estreia da TV foi pura invenção da Globo. Só que a apresentadora realmente perdeu o lançamento da televisão por um motivo mais importante para ela: sair com Luís Ramos.

Diferentemente do que a série mostra, Hebe e Luis Ramos não terminaram após o aborto. A apresentadora permaneceu amante do empresário durante oito anos. Foi com ele, inclusive, que viajou pela primeira vez para os Estados Unidos e, ao voltar da excursão, decidiu adotar os cabelos loiros que se tornaram sua marca registrada.

Em entrevista ao Programa do Jô, em 2000, Hebe e Lolita Rodrigues recordaram o lançamento da Tupi. "Ela tinha um namorado, Luís Ramos, e naquele dia havia um evento ao qual ela não podia faltar porque era muito importante para ele. Ela disse que estava rouca e falou para mim: 'Você segura a história?'. Eu segurei por uns 40 e tantos anos”, disse Lolita.

"Eu estava em uma plateia distinta, era um evento no teatro Cultura Artística", complementou Hebe em resposta a uma provocação de Jô, que disse que ela perdeu a inauguração da TV para transar.

Nos anos 60, já casada com o empresário Décio Capuano, a artista sofreu dois abortos espontâneos antes de dar à luz seu único filho, Marcello, o que provocou uma crise no relacionamento porque o marido culpava o trabalho da apresentadora e exigia que ela abandonasse a carreira artística. Este assunto fica para o próximo episódio de Hebe.

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