Publicado em 26/06/2020 às 05:20:00
Chris Flores admite: planejar nunca foi seu forte. "Até meu filho aconteceu por acaso", brinca. Desta vez, foi o coronavírus que afetou o maior planejamento da apresentadora em 2020. A quarta temporada do reality Fábrica de Casamentos irá ao ar no SBT pela metade, a partir deste sábado (27). Sete dos 13 episódios conseguiram ficar prontos antes do agravamento da pandemia.
Para piorar, Chris ainda assume a missão diária de apresentar um dos programas mais criticados do ano: Triturando, que começou como Fofocalizando, trocou elenco e horário, e até ganhou reprise nas madrugadas. Todas as mudanças saem da cabeça de Silvio Santos, isolado em sua mansão no Morumbi (SP). Na mexida mais recente, resgatou o nome Fofocalizando e interrompeu as férias de Lívia Andrade, para desfazer a alteração horas antes de o programa ir ao ar.
Como manter a saúde em meio à tensão pelo reality incompleto e as ofensas pelo programa manipulado quase ao vivo pelo patrão, e ainda proteger a si própria e à família (o marido, o filho de 14 anos e cachorra Pretinha) de um vírus mortal? Estes são alguns dos desafios que Chris Flores jamais pensou em enfrentar neste ano. Segundo ela, é possível com equilíbrio, resiliência e muita fé.
Em entrevista exclusiva ao NaTelinha, a apresentadora fala sobre a interrupção das gravações do Fábrica de Casamentos e reconhece ser quase impossível voltar a produzir o reality em 2020 por causa da pandemia: "Gravamos o último em uma tensão muito grande. Não dá para fazer um programa em que você não possa beijar e abraçar as pessoas. Não tenho como me distanciar da noiva".
Sobre o Triturando, que pode virar Fofocalizando ou até sair do ar a qualquer momento, Chris defende o dono do SBT e suas mudanças inesperadas na programação, e rebate críticos que torcem pelo fim da atração: "Confio cegamente no Silvio. Quando uma pessoa diz: 'Tire esse programa do ar', ela diz o seguinte: 'Deixem dezenas de pessoas desempregadas'".
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Vamos falar do seu xodó, o Fábrica de Casamentos. O programa consolidou você, que é jornalista, como apresentadora de entretenimento?
Chris Flores - As pessoas, principalmente na TV, fazem muitos planos, sabem aonde querem chegar, e e eu nunca tive isso na vida profissional e pessoal. Até meu filho aconteceu por acaso (risos). Nunca tive isso porque a frustração vem e você se sente péssimo, a pior pessoa do mundo. O Fábrica foi um presente porque é um projeto que caiu no colo e eu jamais imaginaria criar e fazer. SBT, Discovery e Formata são muito democráticos, todos podem dar ideias, e acho que isso fez o sucesso do Fábrica. Os profissionais são consagrados e não faziam televisão, não tinham o vício da TV, vieram cruas. As pessoas se encantaram justamente por elas serem quem são. Foi um “casamento” entre nós que deu muito certo. A princípio, era um programa para agradar principalmente as mulheres, mas caiu no gosto das crianças, das famílias, e entendemos a psique do negócio. As pessoas estavam muito desacreditadas na vida, por causa de tudo: cenário político, economia… o programa veio para dar um alento: ainda dá para sonhar, você pode acreditar no amor e na família, seja ela qual for. O programa realmente foi um presente, porque li eu também consigo ser jornalista, isso é um diferencial. Consigo entrar na vida das pessoas, é muito intenso, e levamos a relação com as famílias para fora do reality.
Como foi receber a notícia da suspensão do programa no meio da pandemia?
Chris Flores - Para nós todos, foi muito triste, porque a gente grava a toque de caixa. Como é uma produção externa, temos que otimizar custos. Gravamos de domingo a domingo, várias horas por dia, um casamento atrás do outro. Quando estreia, estamos com quase toda a temporada fechada. Começamos a produzir em janeiro e gravaríamos até abril. Quando estávamos finalizando o sétimo episódio, já preparando os outros, com os casais já escolhidos e encaminhados, veio a Covid-19. No início, ninguém entendia muito bem o que era, não sabíamos as medidas restritivas. Gravamos o último casamento em uma tensão muito grande. Fábrica é de contato físico, de emoção. Não dá para fazer um programa em que você não possa beijar e abraçar as pessoas. Não tenho como me distanciar da noiva. Na tenda, ficam em média 300 pessoas, dos convidados aos fornecedores. Foi triste para todo mundo, principalmente porque todos os envolvidos tiveram que ser dispensados, porque são terceirizados e o trabalho terminou. Para voltar a gravar, temos que ter a vacina ou um remédio muito eficaz. Tudo está voltando aos poucos, mas festas, aglomerações não estão. Ou melhor, só para quem não tem responsabilidade.
Inclusive você já "triturou" casamentos durante a pandemia no programa Triturando.
Chris Flores - Trituro qualquer pessoa a favor de aglomeração neste momento, porque, além se ser uma irresponsabilidade, você vai comemorar o quê neste momento? Mais de 50 mil mortos? Eu não tenho motivo para comemorar. Está terrível o período em que estamos vivendo. Não consigo entender essas pessoas que conseguem fazer festas, encher a cara, sair rindo, tirando fotos e filmando. Tudo por um like? A vida virou isso? Para mim, é inconcebível. São mais de 50 mil famílias chorando, sofrendo por um ente que foi embora, de todas as idades, condições sociais, lugares. E vai piorar, porque está chegando ao interior. Todos os fornecedores do programa já falaram para os noivos remarcarem datas, eles seguram o orçamento, fazem um desconto. Está difícil para todos eles. É uma angústia geral, mas temos que ter responsabilidade. É triste, é um grande problema, mas temos que pensar na vida e na saúde de todos. Não é porque você já pegou que vai andar sem máscara. Cadê a solidariedade? Cadê a empatai? Cadê a responsabilidade? A sociedade está com os valores muito invertidos. A pandemia descortinou a podridão moral em que estamos vivendo. As pessoas estão amorais. A ética foi para as cucuias. Eu acho muito difícil a gente voltar a gravar este ano, porque os outros programas estão voltando com várias medidas restritivas e conseguem manter o distanciamento. No nosso caso, casamento sem gente não é casamento.
Na sua rede social, você tem participado de lives, falando de relacionamento, feminismo, violência doméstica, racismo. Abriu seu Instagram para conversar sobre isso. É uma forma de passar o tempo aprendendo coisas novas e dialogando com outras pessoas. Você se sente bem fazendo isso na pandemia? Como é a recepção do público?
Chris Flores - A recepção do público está sendo muito boa. Gosto de conversar, entrevistar as pessoas, e precisamos trazer à luz, ao protagonismo, e mostrar o conteúdo delas. Todo mundo está buscando conteúdo para passar o tempo, melhorar como pessoa e profissionalmente, e estão abrindo os olhos e o coração para temas que antes julgavam espinhosos. Por exemplo, o fascismo, a violência contra a mulher, vou fazer uma live sobre LGBTs. São temas que, obviamente, estão sempre aí para serem discutidos e mereciam isso, mas por todos os acontecimentos, o George Floyd e a mulherada na quarentena sofrendo uma violência em um grau muito mais acentuado, as pessoas estão querendo ouvir sobre esses temas e entendê-los. É um trabalho de formiguinha: se uma pessoa tiver o coração tocado e for ajudado de alguma maneira, para mim já valeu. A ideia é tentar ajudar alguém que está assistindo e precisa de uma mão estendida. Por exemplo, no Triturando, uma senhora gostava muito das músicas que o Silvio colocava…
Encontramos uma pessoa que gosta das músicas! (risos)
Chris Flores - Encontramos várias (risos). Uma senhora de 92 anos, a coisa mais querida. O neto escreveu para a gente e colocou um vídeo dela cantando junto. Ele agradeceu, porque falou que ela ficava esperando o programa começar para poder ouvir as músicas da sua época. Pedi autorização a ele para colocar no ar, porque estávamos em uma maré de tanto ódio, tanto xingamento por causa das músicas, e uma coisa que você acha que causa um mal enorme para as pessoas causa um bem enorme para outra que talvez mereça muito mais! Eu entendo também quem não gosta. Aceito críticas, são muito importantes, mas não aceito humilhação, xingamento, porque foge do propósito de querer que a pessoa evolua. Há coisas que não me dizem respeito e eu não posso mudar, infelizmente…
Houve pessoas que te apoiaram e ficaram do seu lado durante as mudanças no Triturando. As pessoas se preocuparam com você, perguntaram se você apareceria no programa no dia seguinte?
Chris Flores - Muitas pessoas me escrevem, falam "você merece um programa melhor", "saia disso", "tire esse programa do ar", "esse programa é um lixo", "pior programa que eu já vi". Vemos entre os críticos que escrevem sobre isso e no público, e fica essa onda, porque um fala, outro fala, e tem gente que nunca viu o programa mas fala também. A gente percebe quem assiste e quem não assiste. Não consigo ver esse lado negativo. Sou meio poliana mesmo. Posso fazer a avó da Poliana na novela (risos), mas eu não pedi para estar ali. Fui colocada no Fofocalizando, para mim estava ótimo, eu me divertia muito. Quando virou Triturando, também não estávamos esperando. Quando vem uma missão, a gente tem que cumprir da melhor maneira possível. Existe um porquê para tudo que está acontecendo, e talvez as pessoas não saibam. Existe o dono da emissora, o Silvio, que é genial, uma pessoa criativa, o maior comunicador do Brasil, tanto que todos os outros apresentadores ou imitam ou bebem da fonte dele. Ele é a maior referência que temos como apresentador. Quase tudo que a gente vê no ar saiu da cabeça do Silvio. Temos que entender essa sua generalidade e saber que ele vai chegar a algum lugar. Ele está criando um programa no ar. Hoje as pessoas não têm paciência e querem que dê certo e seja do jeito que elas gostam no primeiro momento, mas quando ouvi a história dessa senhorinha eu entendi.
Até você descobrir pessoas que gostam do Triturando, você se ‘envenenou' com os comentários? As críticas te abalaram?
Chris Flores - Não me abalo quando as pessoas falam mal ou xingam, porque isso diz mais sobre as pessoas do que sobre a gente. O que me entristece é em relação à equipe. Quando uma pessoa diz: "Tire esse programa do ar", "é o pior programa que tem", "esse programa é um lixo", essa pessoa está dizendo o seguinte: 'Deixem dezenas de pessoas desempregadas’'. Ela não está sendo construtiva. Convivo com pessoas que ontem estavam trabalhando e tiveram que sair correndo para levar a mãe ao hospital porque ela estava sangrando em tratamento de câncer. Esta pessoa, se o programa acabar, não vai ter condição de pagar um plano de saúde para a mãe. Gostaria muito que as pessoas refletissem sobre essa desumanidade, essa falta de senso do que fazem com essas pessoas que saem de casa de madrugada, pegam condução no meio de uma pandemia e chegam para trabalhar. Se o programa sair do ar, muita gente vai para casa, vai ficar sem trabalho. É um ódio que pode ser direcionado a mim, à Ana Paula [Renault], ao Gabriel [Cartolano], à Flor, à Lívia [Andrade], à Mara [Maravilha], ao Leão [Lobo], ao Decio [Piccinini], à Mamma [Bruschetta], ao Leo [Dias], todos que passaram por ali.
Temos um respeito profundo pelo dono da emissora. Eu confio demais no Silvio. Confio cegamente no Silvio. Quero ser instrumento do que ele quiser, não há problema nenhum. É um privilégio ser dirigida por ele à distância, que é o que acontece comigo. Ao dar uma ordem, ao pedir alguma coisa, ao falar do jeito que ele gosta, ao elogiar, que graças a Deus ele tem elogiado bastante, estou, por tabela, sendo dirigida por ele. Claro, quando você vê uma pessoa indo embora, como foi com a Flor e com a Lívia, sofro porque gosto dessas pessoas, mas até isso tem um porquê. É importante que a Lívia saiba que eu a amo, gosto dela, a admiro, quero vê-la lá, em pé, apresentando. Quero aplaudi-la. Não sou pessoa de rede social, eu digo para a pessoa. Para nós todos, trabalhando em televisão, é muito tranquilo, mesmo com essa instabilidade, entendermos que faz parte do jogo entrar no ar, sair do ar, mudar de horário, de nome e de conteúdo. É que a velocidade que acontece é rápido, mas vai nos levar para algum lugar. Por enquanto, estamos no meio o processo. Daqui a pouco, todos nós vamos entender.
Você falou no começo da entrevista que nada na sua vida foi planejado. Você consegue planejar um futuro dentro do Triturando, por exemplo?
Chris Flores - Trabalhar em televisão é isso. Uma hora você está em um lugar, outra hora está em outro. Amo fazer as matérias para a Eliana, adoro levar torta na cara no Passa ou Repassa, e as novas estão mais gostosas (risos). Não acho demérito. Tenho saúde, estou trabalhando e recebendo, em um momento em que há muita gente sem um prato de comida na mesa. Vou reclamar do quê? Deus me perdoe, não posso reclamar, tenho que ajoelhar e agradecer a Deus. A Flor também é assim, fazemos uma oração antes de começar o programa. A gente tem que se preocupar em fazer o melhor. Audiência, números, faturamento são preocupações da direção. A gente tem que fazer o que é pedido e oferecer o melhor. Só quando vejo injustiça, como quando vejo essa gente toda fazendo festa, aí eu boto a boca no trombone. Quando sou mais incisiva no ar, as pessoas até estranham, por que me veem em uma posição que não estão acostumadas. "Nossa, ela fala grosso também!".
Você pratica alguma atividade ou mantém algum hábito para manter o seu bem-estar e a sua saúde mental?
Chris Flores - Primeiramente, acho muito importante ter fé, qualquer uma, seja qual for sua religião ou espiritualidade, porque ela te segura quando você está desistindo. Faço orações todos os dias, sigo pessoas que passam mensagens positivas, que têm bom humor nas mensagens, como o padre Fábio de Melo. Converso com Deus ao acordar e ao dormir. Só agradeço, nada peço: "Obrigada por tudo e o que tiver que ser será". A respiração é fundamental, daí vem a calma e a paciência de se conhecer e se autoconcentrar. Pilates é um exercício que me faz muito bem, não faço no momento mas pedi para voltar, e quase voltei à ioga quando veio a pandemia, mas vou tentar fazer virtualmente. A viagem que fiz à Índia no ano passado foi decisiva para mim. A conexão com a espiritualidade que eles têm é muito forte, muito bonita. Eles não têm uma conformidade com a vida, e sim uma aceitação. São palavras totalmente diferentes. Conformar te paralisa. Aceitar é ver as condições e saber que elas são importantes para sua evolução. Não que eu não fique nervosa, mas não desconto nos outros.
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