Em dose dupla

Atuação da semana: Em papeis diferentes, Fabiula Nascimento se destaca nos detalhes

Atriz está em "Bom Sucesso" e em "Sessão de Terapia"

Fabiula Nascimento em "Sessão de Terapia" e "Bom Sucesso"
Por Daniel César

Publicado em 29/09/2019 às 09:11:54

Uma novela das sete e uma série intimista não tem quase nada em comum. "Bom Sucesso" e "Sessão de Terapia", no entanto, convergem não apenas pela qualidade de texto em suas respectivas propostas, mas em uma feliz coincidência: os nuances do trabalho de Fabiula Nascimento.

Na trama da Globo, Nana é uma espécie de anti-heroína, tipo incomum nas telenovelas. A personagem é cheia de boas intenções com todos ao seu redor, mas invariavelmente toma decisões equivocadas e os resultados são inversamente proporcionais a seus desejos. Quanto mais ela quer ajudar a família e o trabalho, mais prejudica.

Carente de amor, sem a mãe que faleceu há anos, e com um pai ranzinza, vivido brilhantemente por Antônio Fagundes - já destacado aqui na Atuação da Semana -, ela focou todos os seus esforços na empresa e se tornou austera. Com tantos sentimentos sufocados, era evidente que viveria num casamento fracassado com o vilão Diogo (Armando Babaioff).

Nana costuma tomar tantas decisões erradas que seria difícil torcer pela personagem não fosse pela construção cuidadosa de Fabiula, que imprimiu olhar e movimento doce e caloroso contrariando seu próprio texto. Se os diálogos prometem uma mulher amarga, ela foge do arquétipo e se mostra carente. 

A inocência quase pueril da mulher que confia tanto no marido quanto na secretária falsiane Gisele (Sheron Menezzes) não a torna a boboca comum tão vista nos últimos tempos na dramaturgia brasileira e isso se dá também por sua resistência juvenil em ceder à tentação dos sentimentos confusos com Mario (Lúcio Mauro Filho). É a caricatura da mulher confusa numa comédia romântica sem carregar nas tintas, promovendo credibilidade ao que se vê na tela.

Tão difícil quanto Nana é Chiara, ou Joana, de "Sessão de Terapia". Na série do Globoplay, a atriz vive uma comediante estafada com a profissão. Chiara é um espelho forjado de Joana, a verdadeira mulher por trás da comediante e que foi sufocada para dar espaço à celebridade amada por todos. Se Chiara é uma personalidade querida pela mídia, Joana é sem graça e sem traços de amor próprio.

Cheia de nuances e quase refém do texto, a proposta da produção é de diálogo constante com praticamente movimentação zero, Fabiula novamente lança mão dos detalhes ao criar sua Chiara. Uma mulher cuja vida é uma espécie de reality show constante, com os olhos da mídia a observando constantemente, mas na verdade está prestes a explodir porque não aguenta mais esconder sua verdadeira identidade.

Diferente de "Bom Sucesso" em que Nana oferece mais oportunidades, até pelo conceito da novela - uma comédia romântica - em "Sessão de Terapia" Fabiula é dependente do texto e criou maneirismo para não tornar o bate-bola com Selton Mello tedioso. Tom de voz mudando constantemente e até oferecendo posições distintas quando se senta no divã do terapeuta, tudo são pistas para o público sobre a personalidade de sua Chiara/Joana. E é preciso dizer, sem recorrer a caricaturas ou truques que poderiam transformar a personagem numa histérica depressiva.

Em tempos de composições industriais quase idênticas e superficiais, além de gritaria e caras e bocas, Fabiula Nascimento em dose dupla, ou tripla, se considerarmos que são duas em uma em "Sessão de Terapia", é um alento para os amantes na arte da interpretação e a tornou a Atuação da Semana.

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