Orientação

Globo muda regra para criminosos em coberturas de massacres

Mesmo sem condenação, autores serão chamados de “assassinos” e “criminosos”


William Bonner e Renata Vasconcellos sérios
William Bonner e Renata Vasconcellos no "Jornal Nacional" - Reprodução/Globo

A direção da Globo ordenou que não seja dado nenhum tipo de destaque a criminosos envolvidos em massacres. Em comunicado interno, enviado aos funcionários do Jornalismo, a emissora estabelece novas regras para a cobertura desses casos. A medida tem por objetivo evitar qualquer tipo de glamourização do crime em fóruns virtuais.

“Nosso foco será sempre nas vítimas; nunca, nos assassinos. Não daremos notoriedade ao criminoso”, diz a rede em trecho do comunicado, obtido pelo NaTelinha. O nome e a foto do assassino, bem como sua qualificação, só será dado no primeiro dia, seja por fins informativos ou para ajudar em sua prisão.

Do dia posterior em diante, a citação deverá ser feita em termos genéricos – jamais pela identidade real. Se houver mais de um envolvido direto na morte, o nome poderá ser dado apenas uma vez, caso existam novidades no assunto.

O crime deverá ser tratado com adjetivos negativos, como ação covarde, perversa, monstruosa etc. Os autores serão chamados de “assassinos” e “criminosos”, independentemente de haver condenação, como acontece em situações cotidianas. A Globo também orienta que a memória das vítimas e atos heroicos de cidadãos comuns sejam enaltecidos.

Imagens do massacre devem ser exibidas o mínimo possível nas reportagens, tal como já acontece. A repetição só será aceita quando houver necessidade de explicar descobertas da Polícia. Ainda não haverá veiculação de vídeos de situações correlatas, como compra de armas e deslocamento ao local do crime.

A medida já pôde ser sentida nesta sexta-feira (24) no “Diário TV”, jornal equivalente ao “SP1” na TV Diário de Mogi das Cruzes, Grande São Paulo. As últimas descobertas do massacre ocorrido em Suzano foram dadas sem identificar os acusados, com citação genérica.

Fama torta

Em março, época do massacre em Suzano, a Folha de S. Paulo revelou que o ato foi comemorado em páginas da deep web (área da internet difícil de ser rastreada). Os autores do crime foram tratados como “heróis” pelos frequentadores desse setor.

De acordo com a ONG Safernet, estudos da Associação Americana de Psicologia evidenciam que há uma busca por notoriedade e fama nesses episódios. “A exposição massiva na imprensa é o troféu para grupos que estimulam ataques violentos na internet”, explica a instituição, em nota divulgada em seu site.

Procurada, a Globo confirmou os parâmetros. "A orientação de enaltecer vítimas e sobreviventes de massacres e evitar notoriedade ao criminoso é antiga - esteve em vigor nas coberturas dos massacres de Suzano (SP), Paracatu (MG) e Nova Zelândia. O Jornalismo da Globo cobre, e sempre cobriu, casos deste tipo com um olhar mais humano e sensível, o que o diferencia de outras emissoras", diz, em nota.

Atualizado às 17h05: Após a publicação da reportagem, a Comunicação da Globo enviou à reportagem os pontos, na íntegra, do comunicado, explicando que os segue desde o massacre de Suzano. No entanto, até a presente data não havia sido comentada publicamente. Confira as orientações, tal como foram encaminhadas às redações:

1) No primeiro dia, estando foragido, daremos nome e retrato do assassino. Para que seja preso. No primeiro dia, já estando preso ou morto, daremos o nome e a qualificação do assassino, sem a foto dele.

2) A partir do segundo dia, jamais repetir o nome (dizer apenas “o assassino do massacre tal”). Quando houver mais de um assassino, havendo novidade relativa a um deles, dar o nome apenas uma vez. 

3)Sempre tratar por assassino, criminoso e qualificar a ação de covarde, perversa, monstruosa e outros adjetivos do gênero que retratem exatamente o que um massacre do gênero é.

4)Ênfase nas vítimas, com perfis, histórias, sonhos cortados. Enaltecer possíveis heróis.

5) No desenrolar do caso, foco em tudo que possa mostrar novos envolvidos. Mas não precisamos dar vídeos de onde compraram armas, de onde estacionaram (em que os assassinos apareçam). Basta dizer que a polícia já levantou onde compraram os itens, onde estacionaram.

6) Sobre vídeo da ação, a regra é: mostrar o mínimo possível, com o mínimo de ação, frisando a imagem antes do disparo, borrar vítimas ao máximo. E não repetir mais de uma vez (apenas se for necessário para explicar uma descoberta);

7)Perfil dos assassinos não ajuda e não deve ser feito: os criminosos buscam a fama e influenciam outros;

8) Não divulgar manifestos dos assassinos, documentos, mensagens ou o que for, como deseja o assassino.

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