Entrevista

Globo convoca atores veteranos após crescer campanha pela recontratação

Marcus Montenegro é o líder por trás da campanha "Eu quero veteranos na TV", que vem crescendo e pressionando o setor. Ele concede uma entrevista exclusiva ao NaTelinha


O empresário Marcus Montenegro usando uma camisa preta escrito "ser artista"
Marcus Montenegro é quem lidera a campanha 'Eu quero veteranos na TV' - Foto: Montagem

O movimento liderado por Marcus Montenegro, empresário artístico com cerca de 40 anos de atuação no setor, para que atores veteranos voltem a ganhar espaço nas novelas e séries de TV, vem ganhando força. A iniciativa já levou a Globo a convocar novamente esses artistas. Em entrevista ao NaTelinha, Marcus explica sua luta e critica a prática de escalar atores na dramaturgia com base na quantidade de seguidores nas redes sociais.

“Eu acho uma lástima qualquer pessoa que se baseia em muitos seguidores para determinar o sucesso de alguém, principalmente no mundo da dramaturgia”, pontua.

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Marcus Montenegro defende que o artista atual precisa ser “360”, ou seja, ter uma compreensão ampla de todos os setores do mercado: “Precisa entender o desenvolvimento de projetos, seja ele no teatro, no cinema, na loja visual, no mundo digital”.

E completa: “Entender todas as etapas de desenvolvimento da carreira, passando pela assessoria de imagem, assessoria de imprensa, assessoria digital, inscrição em projetos, em editais, em leis, para você poder ter o seu próprio produto e potencializar suas chances de mercado”.

"A própria TV Globo já fez uma ação de recadastramento dos atores veteranos para ver como eles estão, e estão sendo convocados em um volume maior. Mas é uma consciência que retorna ao mercado sobre como eles são decisivos na qualidade de uma obra, importantes no desenvolvimento de uma narrativa."

Marcus Montenegro, empresário artístico

Confira a entrevista exclusiva com Marcus Montenegro:

O movimento 'Eu quero veteranos na TV' ganhou força nas redes e no meio artístico. O que mais precisa acontecer para que essa valorização dos veteranos se traduza em ações concretas nas emissoras e nas produções?

Marcus Montenegro – Acho que agora está havendo uma consciência de mercado sobre quantos veteranos fazem falta na estrutura dramatúrgica da televisão, como o público está sentindo falta deles na tela e está se afastando da televisão por causa disso. Isso é uma questão real. É uma total falta de identificação com as obras pela ausência dos grandes atores.

A própria TV Globo já fez uma ação de recadastramento dos atores veteranos para ver como eles estão, e estão sendo convocados em um volume maior. Mas é uma consciência que retorna ao mercado sobre como eles são decisivos na qualidade de uma obra, importantes no desenvolvimento de uma narrativa. E eles precisam voltar a deixar de ser personagens periféricos para serem personagens centrais. Essa discussão está na mesa, e o movimento aos poucos está ganhando força na prática.

Porque você tomou essa iniciativa de defender a importância dos veteranos na dramaturgia?

Marcus Montenegro – Eu tomei essa iniciativa porque, em 2015, percebi o início da jovialização da televisão brasileira na dramaturgia e comecei a ver a estrutura mudando. Antigamente, 80% dos elencos eram 40+, 20% eram os jovens protagonistas. Quando havia um casal jovem, havia também um casal maduro. E, aos poucos, essa proporção foi se invertendo.

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Hoje, você tem 20% de atores 50+, e o resto para baixo. E você não tem mais personagens veteranos, nem personagens de avô, pai e mãe com grande importância, acima de 60+, em quantidade. Eu vi que isso ia se agravar. E isso foi se agravando.

Eu comecei a alertar o mercado em 2015 que isso ia acontecer, mas as pessoas só tomaram consciência da gravidade da inversão em 2020.

Qual sua opinião sobre escalar elenco nas novelas com base em número de seguidores?

Marcus Montenegro – Eu acho uma lástima qualquer pessoa que se baseia em muitos seguidores para determinar o sucesso de alguém, principalmente no mundo da dramaturgia. Até porque o cinema já mostrou, inclusive, que ter seguidor não leva público. Todos os grandes influenciadores que fizeram cinema não levaram público.

Mas eu acho que hoje há uma cultura mais amadurecida para ir contra isso. Eu acho que o reconhecimento artístico está voltando aos poucos. Através de diretor de elenco, eu, pelo menos diretamente, não tenho sofrido essa pergunta: “Quantos seguidores tem o seu talento?” Então, eu acho que o mercado está se engajando, entendendo como um todo e vendo que essa questão também não agrega valores artísticos dentro de uma obra.

Como a formação artística atual pode se adaptar para preparar profissionais para o mercado?

Marcus Montenegro – Hoje é o que eu sempre falo: a formação artística, um artista precisa ser 360. Foi um termo que eu utilizei para definir, no meu livro, o que é ser artista — o artista que tem uma compreensão de todos os setores do mercado.

Não basta você só ter talento e vocação e ficar em casa esperando um convite. Você precisa saber empreender. Precisa entender o desenvolvimento de projetos, seja ele no teatro, no cinema, na loja visual, no mundo digital. Entender todas as etapas de desenvolvimento da carreira, passando pela assessoria de imagem, assessoria de imprensa, assessoria digital, inscrição em projetos, em editais, em leis, para você poder ter o seu próprio produto e potencializar suas chances de mercado.

É uma comunhão de posturas junto com o seu agente. Se você faz uma boa peça, seu agente pode potencializar o seu trabalho fazendo um network, convidando as pessoas para te assistir, fazer uma formação de opinião nas imagens, e você vai fazer um bom trabalho.

E hoje todo mundo tem que ter essa postura, como os grandes atores tinham no passado, quando se autoproduziam. Mas acho que o jovem agora está tendo muita consciência disso.

Em tempos de mudanças rápidas e algoritmos dominando o consumo cultural, como manter a arte como ferramenta de transformação social?

Marcus Montenegro – Eu acho que a arte, para se manter, tem sempre o teatro como a base de tudo. A arte milenar — o teatro nunca deixou de existir e nunca vai deixar. Graças a Deus, pós-Covid, os teatros estão lotados, bem cheios, como no pós-guerra: ficou todo mundo muito destruído e foi para o teatro se distrair.

E agora, depois de todo mundo ter ficado dentro de casa, as pessoas estão na rua para se divertir. O cinema não voltou com a força do teatro, mas o teatro está mais vivo do que nunca. Os grandes musicais aí bombando, os grandes atores indo fazer teatro.

Eu acho que o teatro é o verdadeiro celeiro não só da grande mão de obra qualificada, como também de você expor um pensamento relevante para a transformação de uma sociedade através de um conteúdo.

E acho que é o caminho, não tem outro. Acho que o teatro vai sempre resistir, revelar grandes talentos e levar a consciência da importância de como a arte transforma uma sociedade.

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