Entrevista exclusiva

Kika em Renascer, Juliane Araújo afirma: "Toda mulher já viveu uma relação abusiva"

Atriz avalia abordagem no remake e compara sua personagem com a original, vivida por Claudia Lira em 1993

"Kika era uma personagem muito revolucionária", diz Juliane Araújo sobre papel na versão original de Renascer, de 1993 - Foto: Globo/Paulo Barros
Por Walter Felix

Publicado em 27/02/2024 às 05:00:00

Em Renascer, Juliane Araújo interpreta Kika, uma mulher bem-sucedida, esclarecida e independente que, mesmo assim, vive uma relação tóxica com José Bento, papel de Marcello Melo Jr. Em entrevista exclusiva ao NaTelinha, a atriz avalia a abordagem dada ao tema pela novela da Globo e compara sua personagem no remake com a “original”, vivida por Claudia Lira na primeira versão da história, em 1993.

“A maior diferença da estrutura da personagem é o tempo. Kika em 1993 era uma personagem muito revolucionária. Me lembro de uma cena em que vi Claudia com uma gravatinha e calça, com os pés na mesa. Era um arquétipo que não se via com facilidade: uma mulherona assim, com um figurino mais transgressor comparado ao das outras personagens”, comenta Juliane Araújo.

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A atriz compara: “A personagem segue assim, só que em 2024 isso já não salta mais aos olhos, e que bom! Hoje, vemos mais mulheres nesse lugar, ocupando um cargo importante, donas de si, com opiniões fortes”. Além de atriz, ela também é roteirista e tem experiência atrás das câmeras, como assistente de direção. Em 2020, lançou um livro de poesias, Chão Vermelho.

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Aos 34 anos, ela diz que “toda mulher já viveu uma relação abusiva ou algum grau de toxicidade em uma relação”. E acrescenta: “Quando não é vivido por nós mesmas, ouvimos relatos de pessoas próximas: mães, irmãs, amigas. É muito penoso saber que isso ainda é o cotidiano da mulher, as narrativas abusivas dentro de relacionamentos”.

“Não foi difícil buscar na minha trajetória, ou em relatos que ouvi a vida inteira, para a construção da Kika. Acho que narrativas assim, ou parecidas com essa, são um ponto em comum para quase todas as mulheres.”

Juliane Araújo

Engana-se quem pensa que o tema é coisa do passado, diz Juliane. “Falar sobre independência, feminismo e tudo que isso abrange ainda é importante e necessário. Ainda temos barreiras imensas e diversas, e ainda existem muitas normas sociais, culturais e institucionais em que mulheres são prejudicadas.”

Leia, na íntegra, a entrevista com Juliane Araújo, a Kika de Renascer

NaTelinha: Kika vive uma relação tóxica com José Bento em Renascer. Você buscou inspirações na vida real para mostrar esse tema na ficção?

Juliane Araújo: Toda mulher já viveu uma relação abusiva ou algum grau de toxicidade em uma relação, ou em mais de uma, infelizmente. Quando não é vivido por nós mesmas, ouvimos relatos de pessoas próximas: mães, irmãs, amigas. É muito penoso saber que isso ainda é o cotidiano da mulher, as narrativas abusivas dentro de relacionamentos.

A Kika vive uma relação de muitos anos com o Bento; ela se sente frustrada, explorada financeiramente, e por muitos motivos não consegue virar a página. Existe um percurso que uma pessoa que vive em uma relação assim percorre, e é sempre doloroso. A novela começa com uma tentativa de recomeço deles; esse é o ponto em que estamos.

Essas relações são sempre baseadas em ciclos assim: brigas, términos, promessas e tentativas. Não foi difícil buscar na minha trajetória, ou em relatos que ouvi a vida inteira, para a construção da Kika. Acho que narrativas assim, ou parecidas com essa, são um ponto em comum para quase todas as mulheres.

NaTelinha: Como você avalia a abordagem do machismo e do lugar do feminino na sociedade por meio da sua personagem? De que forma esses temas se revelam com a Kika?

Juliane Araújo: Ela tem um discurso aprimorado, claramente uma mulher que tem uma observação ativa para isso. O Bento é o ponto fraco em seu discurso (risos). Ele quase nega qualquer empoderamento dela em relação ao feminismo, já que é um cara muito equivocado e ela está com ele há mais de 10 anos, entre idas e vindas, mas isso também é muito comum.

"Ainda é uma desconstrução grandiosa e diária, até para mulheres que se informam e praticam mais ativamente o feminismo; fomos criadas em um formato, e é sempre muito batalhado sair dele."

Juliane Araújo

Para Kika, também é assim. O que ela fala para Mariana (Theresa Fonseca), para Eliana (Sophie Charlotte), é o que ela realmente acredita, mas na prática as coisas se confundem um pouco. Mas ela ainda assim tem o olho aberto, propõe e provoca outras mulheres. Ela também está em exercício, tentando levar mais na prática o que acredita, tanto que terão muitas cenas de brigas, discussões e conversas com o Bento.

NaTelinha: Chegou a assistir à primeira versão de Renascer? Em caso positivo, quais suas impressões e, na sua opinião, qual a principal mudança no remake?

Juliane Araújo: Assisti muito pouco, mas sim. O que me chama atenção em Renascer, mesmo na primeira versão, é a poesia. É lindo ver o que foi filmado lá em 1993, mesmo com menos aparatos tecnológicos. A narrativa visual não envelheceu; é bonito, conta história.

O que mudou foram as abordagens, a preocupação de contar essa história com mais cuidado e respeito, seguindo a época que estamos, as discussões que hoje elaboramos e que são necessárias. Bruno Luperi tem feito isso; é bonito ver que o ser humano se aprimora, a sociedade também, mesmo aos trancos e barrancos.

As histórias ganham mais rostos, a realidade salta; é uma forma de fazer política, contar histórias e abrir discursos para os avanços de gêneros, de multiplicidade de povos, de lutas, de culturas. A escalação do elenco também foi muito acertada; Marcela Bergamo é uma gênia.

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NaTelinha: Teve algum contato com Claudia Lira, que interpretou a personagem em 1993?

Juliane Araújo: Ainda não, mas o que vi da primeira versão, Claudia fez um trabalho muito bonito, será um prazer conhecê-la qualquer hora.

NaTelinha: O que a Kika de 2024 tem de diferente da de 1993?

Juliane Araújo: A maior diferença da estrutura da personagem é o tempo. Kika em 1993 era uma personagem muito revolucionária. Me lembro de uma cena em que vi Claudia com uma gravatinha e calça, com os pés na mesa. Era um arquétipo que não se via com facilidade: uma mulherona assim, com um figurino mais transgressor comparado ao das outras personagens.

A personagem segue assim, só que em 2024 isso já não salta mais aos olhos, e que bom! Hoje, vemos mais mulheres nesse lugar, ocupando um cargo importante, donas de si, com opiniões fortes.

Mas engana-se quem pensa que o tema é passado. Falar sobre independência, feminismo e tudo que isso abrange ainda é importante e necessário. Ainda temos barreiras imensas e diversas, e ainda existem muitas normas sociais, culturais e institucionais em que mulheres são prejudicadas.

Fora isso, somos atrizes diferentes que vivenciaram processos diferentes, e que, consequentemente, elaboram a personagem de formas diferentes, nunca será igual.

NaTelinha: O que pode nos adiantar sobre o destino da sua personagem na novela?

Juliane Araújo: Por ser um remake, acho que muita coisa já foi dita e vista. Qualquer coisa que eu disser entrará no campo do spoiler (risos). A novela é linda, grandiosa, vale a pena acompanhar em tempo real. A Kika é uma personagem por quem tenho muito amor; está sendo um prazer contar essa história.

Assista à abertura de Renascer:

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