Aconteceu em Sob Pressão

Queridinha das séries, plano-sequência causa calafrios em produção de novelas

Equipes não gostam nem de ouvir falar na ideia


Marjorie Estiano segura um equipamento em "Sob Pressão"
Marjorie Estiano foi um dos destaques do episódio em plano-sequência de "Sob Pressão"

Após o episódio de "Sob Pressão", exibido nessa quarta-feira (26) na Globo, muito começou a se falar sobre o plano-sequência, uma técnica de direção em que uma longa cena é gravada com uma única câmera e sem cortes. O modelo, novo no Brasil, se tornou uma espécie de queridinho das séries americanas e vem se repetindo ao longo dos últimos anos, mas causa calafrios em produtores de telenovelas.

Quem é acostumado a assistir diversas séries oriundas de outros países não estranhou o décimo episódio da última temporada de "Sob Pressão". É que, ao menos duas séries utilizaram a mesma estratégia nos últimos tempos. 

Em 2017, "Mr Robot" levou ao ar um episódio inteiro em plano sequência e chocou o mundo por conta de sua agilidade. O sexto episódio da terceira temporada da série protagonizada por Rami Maleck, vencedor do Oscar ao interpretar Freddy Mercury no cinema, foi considerado um dos melhores daquele ano em termos de direção.

No ano passado, algo semelhante ao episódio de "Sob Pressão" foi visto numa série da Netflix. "The Haunting of Hill House" levou ao ar três grandes planos-sequência no sexto episódio da primeira temporada. As mudanças se deram apenas ao mudar as cenas do presente para o passado.

Queridinha das séries, plano-sequência causa calafrios em produção de novelas

Mas se "Sob Pressão" apresentou um episódio que chamou a atenção para um estilo de direção inovador, ele parece estar longe das novelas brasileiras. Isso porque todos os profissionais envolvidos no formato consideram inviável capítulos nesses moldes.

Para diretores e autores, o plano-sequência encontra uma dificuldade básica para uma gênero: o tempo necessário para sua realização. Em "Sob Pressão", envolvidos na gravação do episódio confirmaram que foram dispensadas oito horas de ensaio até a gravação, que levou um dia inteiro. O mesmo aconteceu com "The Haunting of Hill House", cujos ensaios foram de três dias.

"Numa novela é impossível se levar quase uma semana entre ensaio e gravação de um único capítulo. Se a gente considerar que é obrigatório gravar seis capítulos na semana, porque é o que vai ao ar", comentou um produtor que trabalha em "Órfãos da Terra", novela das seis da Globo. 

Aliás, "Órfãos da Terra" é justamente a novela que já tentou brincar com a situação. Em algumas cenas, o diretor Gustavo Fernández optou por planos-sequência. Embora sejam cenas curtas que não chegam a atrapalhar o ritmo das gravações, no ar é possível notar a diferença.

Queridinha das séries, plano-sequência causa calafrios em produção de novelas

Há quem acredite, no entanto, que é possível realizar um plano-sequência em uma novela. "Seria necessário o roteiro já ser pensado nisso e haver muito tempo para gravar, ou seja, provavelmente nos primeiros capítulos", comentou Carlos Lombardi, autor responsável por obras como "Kubanacan" (2003), "Pé na Jaca" (2006) e "Pecado Mortal" (2013).

De fato, todos os planos-sequência executados em séries lá fora tiveram em comum que o roteiro foi escrito para este formato. Essa facilitação se dá porque há uma diferença fundamental, os chamados showrunners. Eles são uma espécie de diretores artísticos das séries, mas além de contratarem os diretores e os roteiristas, são essas figuras quem comandam toda a estrutura das produções, inclusive a amarração de histórias.

Tanto que esse estilo considerado inovador surgiu no cinema e foi importado para as séries. Produções como "Filhos da Esperança" (Alfonso Cuarón, 2006) e a mais conhecida delas, "Os Bons Companheiros" (Martin Scorsese, 1990), fizeram sucesso com longos planos-sequência para cenas específicas. 

No mundo das séries, a primeira vez que se falou com maior atenção desta linguagem foi em "True Detective". O quarto episódio da primeira temporada, exibida em 2017, levou ao ar seis minutos de um plano-sequência com direito a perseguição e tiroteio.

No Brasil, a figura do showrunner não existe, ao menos não na TV aberta. A produção é quase sempre dividida entre o roteirista e o diretor artístico, cada um responsável por uma área distante. Tanto que o episódio de "Sob Pressão" teve direção de Andrucha Waddington, um dos responsáveis pela obra, mas também do ator Júlio Andrade, que estreou na função justamente neste episódio. Ele teria sido responsável pela preparação do elenco para a sequência.

No Brasil, "Sob Pressão" apresentou um modelo nunca visto isto e acabou levantando o debate nas redes sociais sobre o chamado plano-sequência, mas ao que parece, dificilmente algo semelhante será visto tão cedo nas novelas brasileiras.

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