Entrevista exclusiva

Matheus Nachtergaele: "A duração das novelas é o principal motivo pelo qual eu faço poucas"

Ator exalta Renascer, detalha como surgiu a interação de Norberto com o telespectador e comenta a repercussão de O Auto da Compadecida 2, que estreia em breve


Matheus Nachtergaele
"É muito vívido, é muito intenso o processo de uma novela para quem está fazendo com paixão, com amor", diz Matheus Nachtergaele - Foto: Fábio Rocha/Globo
Por Walter Felix

Publicado em 21/06/2024 às 06:40,
atualizado em 21/06/2024 às 14:17

Matheus Nachtergaele tem tido a “oportunidade rara de participar do maior espetáculo do Brasil”. É como o ator, bissexto em novelas, define as tramas do horário nobre da Globo – a atração da vez é Renascer, em que ele dá vida a Norberto. O artista falou ao NaTelinha durante uma pausa nas gravações, que começaram no ano passado e só devem terminar em setembro.

“A duração das novelas é o principal motivo pelo qual eu faço poucas”, revela Matheus Nachtergaele, que decidiu "descansar carregando pedra" após um longo período dedicado ao cinema e ao teatro. Ele não era visto no formato há 11 anos, quando fez Saramandaia (2013). Antes, esteve em Da Cor do Pecado (2004), América (2005) e Cordel Encantado (2011).

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No ar desde janeiro, Renascer deverá ter 197 capítulos, aproximadamente. “Sim, é algo assustador, mas há que se pensar também pelo outro lado: são quase 200 capítulos de interação intensa com o Brasil, com o Brasil como um todo”, ressalta o veterano.

Das conversas nos bastidores, surgiu a ideia de fazer com que Norberto “quebrasse a quarta parede” – ou seja, dialogasse diretamente com o público, olhando para a câmera. O recurso tem roubado a cena e divertido a audiência desde o início. Os telespectadores, freguesia de todas as noites, são a melhor companhia para aquele típico dono de bar, segundo o ator.

Em dezembro, João Grilo, um de seus personagens mais marcantes, retorna aos cinemas em O Auto da Compadecida 2, dirigido por Guel Arraes e Flávia Lacerda. O projeto, aguardado por muitos fãs, também recebeu críticas: há o argumento de que Ariano Suassuna (1927-2014), o autor da peça original que deu origem ao filme, não tenha escrito uma continuação.

“É uma grande homenagem ao Ariano, que sabia da existência do projeto e o apoiava”, defende Matheus. Ele celebra a chance de reviver o papel 25 anos depois. “Estou muito feliz por ter podido experimentar no meu corpo mais envelhecido, mais experiente, mas talvez não mais sábio, não sei”, diz. “Foi a oportunidade de trabalhar de novo com o meu melhor palhaço.”

Leia a entrevista com Matheus Nachtergaele

Matheus Nachtergaele: \"A duração das novelas é o principal motivo pelo qual eu faço poucas\"

NaTelinha: Você já disse que aceitou o convite para Renascer por um desejo de "fazer cinema em novela". Na sua opinião, o tipo de novela que se faz hoje no Brasil se aproxima do cinema?

Matheus Nachtergaele: Eu sempre tenho desejos de cinema e sempre tenho desejos de teatro. Em Renascer, tenho uma oportunidade rara de participar de uma novela das nove, que é o maior espetáculo do Brasil, desde sempre e por muito tempo ainda. A novela é considerada o maior texto de Benedito Ruy Barbosa [autor da primeira versão, exibida em 1993], com direção artística de Gustavo Fernández, que é um homem oriundo do cinema e que pilota uma equipe de diretores e diretoras altamente artistas.

Quebrar a quarta parede é procedimento do cinema, mas é um recurso extremamente teatral. Os procedimentos cinematográficos são muito comuns em Renascer, e isso faz todo o sentido. Primeiro, porque a novela há muito tempo vem competindo com streamings, com o cinema norte-americano, e ela precisou se reinventar esteticamente. Segundo, porque, de qualquer maneira, a maior parte do povo brasileiro só tem acesso ao cinema através da televisão aberta. E a novela é uma dessas janelas. E terceiro, porque, depois da pandemia, a relação do público no mundo todo com o cinema está modificada.

“Renascer é tão cinematográfica que até pessoas que já não viam mais novelas, fãs de cinema, amigos meus, assistem. Assistem para ver qual será a cada capítulo a nova invenção, a nova beleza que Renascer pode oferecer. Eu estou muito feliz.”

NaTelinha: Uma das críticas feitas às novelas, por artistas e até mesmo pelo público, é em relação à duração. Renascer vai ter quase 200 capítulos. Como você lida com isso?

Matheus Nachtergaele: A duração das novelas é o principal motivo pelo qual eu faço poucas. Eu, como homem de teatro e de cinema, raras vezes consigo dedicar um tempo tão longo a uma telenovela. Em Renascer, foi um pouco diferente, porque eu vinha emendando trabalhos intensos no teatro e no cinema há muito tempo, e estava com vontade de, entre aspas, “descansar carregando pedra”.

Me pareceu que Norberto era o personagem ideal para isso. Pelas qualidades artísticas que a novela teria e tem, como eu citei, e também porque como é um personagem coadjuvante com um cenário praticamente fixo, mas muito espirituoso, muito especial. Na primeira versão foi feito pelo Nelson Xavier (1941-2017), para você ter uma ideia!

“Eu sabia que eu teria um cotidiano intenso, mas não massacrante. Sim, 200 capítulos é algo assustador, mas há que se pensar também pelo outro lado: são quase 200 capítulos de interação intensa com o Brasil, com o Brasil como um todo.”

E, no caso de Renascer, não só com o Brasil mais profundo ou mais desprovido de acesso a outras narrativas audiovisuais, outras narrativas literárias ou o que seja. Renascer é uma novela que atinge todas as classes, todos os sexos e todos os níveis culturais. Repetindo pela qualidade do texto do Benedito Ruy Barbosa, aliada à adaptação inteligente do Bruno Luperi [autor do remake] e à direção muito acertada cinematográfica da direção.

NaTelinha: O Norberto quebra a quarta parede e estabelece uma fala direta com o público. Como surgiu essa ideia?

Matheus Nachtergaele: Um dos diretores de Renascer é Walter Carvalho, que é um grande e fundamental fotógrafo do cinema brasileiro, inclusive a presença dele na televisão tem muito a ver com a renovação de linguagem que as novelas têm vivido nos últimos anos. Ele já era o fotógrafo da primeira Renascer e agora é um dos diretores da novela. Nós fizemos muitos filmes juntos, entre eles: Central do Brasil, do Walter Salles, e todos os filmes do Cláudio Assis. Nesses filmes do Cláudio Assis, um grande cineasta pernambucano, talvez o maior diretor da Retomada do cinema brasileiro, nós experimentamos muitas vezes a quebra da quarta parede.

E, de uma certa maneira, o Norberto estava em cena nos primeiros dias de gravação de Renascer, e a maneira como se escrevia, como o Norberto é escrito, estava dando vontade de compartilhar diretamente com o público alguns momentos do texto.

“O Norberto é um cronista, um fofoqueiro, um cara que tem um grande amor, mas é um amor perdido e que, de uma certa maneira, perde a vida atrás do balcão. É o típico dono de bar, de budega, de venda, que a gente vê tanto pelo Brasil, cuja vida é abrir o bar de manhã e conhecer todo mundo o tempo inteiro, falar sobre tudo com todos e depois fechar o bar e cair numa certa solidão. Me pareceu que o público era a melhor companhia do Norberto.”

Conversei com o Walter no primeiro ou no segundo dia de gravação, e então ele pediu licença ao Gustavo Fernández para que experimentássemos isso. Esse primeiro experimento foi ao ar logo no primeiro capítulo, e o resultado foi imediato. O público e eu criamos um vínculo, que pode ser considerado, na minha opinião, afetivo.

Matheus Nachtergaele: \"A duração das novelas é o principal motivo pelo qual eu faço poucas\"

NaTelinha: O personagem tem uma paixão insuperável pela Jacutinga (Juliana Paes). Como você define esse sentimento?

Matheus Nachtergaele: Norberto é um solteirão, cheio de amor. Coube a ele amar profundamente uma grande amiga, que é a Jacutinga. Nesse sentido, acho que o amor do Norberto é muito bonito e muito maduro. Ele ama uma pessoa com quem ele se relaciona, sim, sexualmente, mas de quem ele é muito amigo e muito afim em vários sentidos, financeiramente, socioeconomicamente, sexualmente, culturalmente.

“Jacutinga e Norberto são equivalentes. De um masculino bem brasileiro, um homem um pouco machista, mas muito cordial, dono de pequenos negócios pelo Brasil afora, e ela muito representativa da mulher, que, por não formar uma família tradicional, acaba na zona do divertimento para os homens, é uma proto-feminista, mas cujo ofício é muito determinado pelo machismo, ambos se entendem profundamente.”

De qualquer maneira, apesar da coragem da qual acabei de falar, há uma grande covardia no Norberto em movimentar, em mudar sua vida, e quando o Jacutinga ameaça partir, Norberto não consegue lutar de verdade. Portanto, ele, por passividade, na minha opinião, perde seu grande amor. Por um lado, ele deixa de cumprir o destino romântico que se espera de um casal numa telenovela, num folhetim romanesco, mas, por outro lado, isso pode gerar, nessa versão, novidades.

NaTelinha: Recentemente, Norberto também teve cenas bem bonitas com Eliana (Sophie Charlotte), e muita gente notou que há química entre os dois. O que pode nos adiantar sobre o futuro do personagem? Ele encontra um novo amor?

Matheus Nachtergaele: Bom, eu amo a Sophie Charlotte loucamente! É sempre uma graça, no maior sentido da palavra, estar com ela. Meu encontro com a Juliana Paes foi muito forte. Nós tivemos poucas cenas de amor e a coisa se estabeleceu para nós e para o público de maneira definitiva. Rapidamente entendeu-se quem eles são, qual tipo de relação que eles têm e o público aguarda que eles se encontrem novamente.

Eliana faz lembrar Norberto o tipo de mulher que Jacutinga é. Magoada, mais forte, extremamente bonita, inteligente, que não tem medo dos homens e, obviamente, isso faz com que ele a ame por tabela. Não sei se isso tem destino romântico na trama, acredito que não, mas de qualquer maneira para o Norberto, a Eliana é um estopim para que ele permaneça apaixonado pela Jacutinga, que está ausente.

NaTelinha: Você acompanha e compartilha a repercussão de Renascer nas redes sociais. Ver as reações do público é importante para o seu trabalho como ator?

Matheus Nachtergaele: É muito importante acompanhar a repercussão da novela dia a dia. Nesse sentido, esse espetáculo que é a novela das nove, é muito forte na vivência dos atores e diariamente você sente, não ao vivo, não na hora exata da feitura da obra, como no teatro, mas ao longo de cada dia, as reações das pessoas do teu país ao que foi feito, ao que foi ao ar na noite anterior.

É muito vívido, é muito intenso o processo de uma novela para quem está fazendo com paixão, com amor, e eu estou adorando a interação do Norberto e do público. Criou-se um vínculo afetivo, as pessoas esperam que o Norberto converse com elas e esse código, dentro de uma folhetim de novela das nove, é muito arriscado e muito delicioso.

“Eu saio da narrativa e abro uma nova porta, que é direto com as pessoas. Para isso, só o amor mútuo e a combinação artística poderiam fazer a coisa acontecer e dar certo. Se você reparar bem, é bem elaborado, na verdade, a relação que está se estabelecendo entre Norberto e o espectador.”

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NaTelinha: O Auto da Compadecida 2 está vindo aí. Como foi reviver o João Grilo? Vinte anos depois, o personagem deve voltar diferente, já que você, hoje, é um ator diferente. Ou não?

Matheus Nachtergaele: Essa é uma pergunta que duraria horas para que eu respondesse! Tem sido muito intenso e parte do trabalho foi reviver meu melhor palhaço, que é o João Grilo, reencontrar meu parceiro, Selton Mello [que interpreta Chicó nos dois filmes], reencontrar com o mundo de Ariana Suassuna, com o diretor Guel Arraes e toda a equipe. Isso é uma parte do trabalho, acho que ficou muito bonito que nós filmamos.

O roteiro é divino, a fotografia do Gustavo Hadba é impressionante, todo o trabalho de arte da Yurika Yamasaki é impressionante. Vocês vão ver a caracterização e os figurinos como são deslumbrantes. Há um uso da tecnologia de uma maneira nunca vista no Brasil, mas o processo ainda não se concluiu. Esse processo vai se concluir quando a obra estrear. E, poder sentir, como que o João Grilo ainda bate no coração das pessoas. Em resumo, foi a oportunidade de trabalhar de novo com o meu melhor palhaço.

NaTelinha: A continuação dividiu opiniões nas redes sociais. Alguns argumentaram que o filme original é uma obra do Ariano Suassuna e que não houve uma continuação escrita por ele. Como encara essa crítica?

Matheus Nachtergaele: Sempre haverá as críticas, mas O Auto da Compadecida 2 vai estrear 25 anos depois do “Auto 1”. São as bodas de prata desta obra. É uma grande homenagem ao Ariano, que sabia da existência do projeto e o apoiava. A família do Ariano está muito feliz, todos nós estamos muito felizes por voltar a esse universo 25 anos depois, com as novas linguagens do cinema. Eu estou muito feliz por ter podido experimentar no meu corpo mais envelhecido, mais experiente, mas talvez não mais sábio, não sei. Será um espetáculo deslumbrante, eu garanto a vocês.

O clássico, O Auto da Compadecida, é intocável. Estará lá para sempre. Desde o dia da sua estreia, ele é o filme mais visto pelo povo brasileiro em todos os tempos. Continuará sendo assim. Acredito que o “Auto 2” é uma linda homenagem. Um filme belíssimo que vai encantar as pessoas e que conta com 25 anos de amizade profunda dos personagens com o povo do Brasil. E, espero, vai injetar um pouco do carinho que nós sentimos por nós, de novo. Vai ser como uma vacina de afeto, de respeito à cultura brasileira, e a lembrança dos tempos em que nós queríamos ser mais felizes.


Assista à abertura de Renascer:

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