A gente achava que ia ser fácil, mas não foi fácil. Depois que eu tive noção da mudança que a gente fez, e do esforço que a gente teve que fazer
Joana Treptow sobre vinda ao BrasilPublicado em 25/09/2018 às 06:15:32
Quem acorda cedo e sintoniza a Band, tem visto desde o fim de julho uma jovem jornalista no comando do "Café com Jornal". Trata-se de Joana Treptow, de apenas 24 anos.
Portuguesa de nascimento, Treptow está no Brasil desde 2008. Se formou aqui e já passou pela Globo News como estagiária, mas foi na Band onde rapidamente se destacou. Começou no Rio de Janeiro, onde foi repórter e apresentadora do local "Jornal do Rio".
Depois, acabou se transferindo para São Paulo ao agradar a direção. Pouco mais de um ano, ela já é âncora do telejornal matinal e tem ganhado cada vez mais prestígio. Mas o início da vida de Joana Treptow no Brasil foi difícil.
"Eu sou portuguesa, minha mãe é portuguesa, meu pai é brasileiro. Eles se conheceram aqui, tem uma história de vida super legal sobre tudo... Mas ele não se adaptou, foi morar nos Estados Unidos, e em Portugal tinha eu, minha avó e os dois irmãos da minha mãe. Minha tia veio para o Brasil, e o tio também veio. A gente sempre teve uma ligação com o Brasil", relembra Treptow em conversa com o NaTelinha.
Em 2008, a crise econômica mundial atingiu Portugal em cheio. A desigualdade no país aumentou, o serviços básicos começaram a ser cortados e o número de empresas que faliram disparou - no pico da crise, eram 52 falências decretadas pelo judiciário português por dia.
É nesse cenário que Treptow e sua família tiveram que se deparar antes de deixar Portugal: "Portugal entrou em crise, e nós morávamos as três sozinhas (Joana, sua mãe e sua avó). Eu tinha 15 anos, minha mãe sempre trabalhou em agência de viagens, mas a crise começou, Portugal começou a dar sinais que a crise ia ficar feia... Na época do Natal de 2008, decidimos que iríamos nos mudar para o Brasil, pra ficar mais perto da família. Mas isso aconteceu pela necessidade de mudar, de começar do zero, porque em algum momento minha mãe ia ficar sem emprego, já tinham avisado pra ela".
A gente achava que ia ser fácil, mas não foi fácil. Depois que eu tive noção da mudança que a gente fez, e do esforço que a gente teve que fazer
Joana Treptow sobre vinda ao Brasil
Joana revela que sua família tentou vender seus bens em Portugal pelo preço de mercado para ter um começo mais tranquilo no Brasil, mas não conseguiu: "Demoramos quatro meses para vir para cá. Nesse tempo, tudo piorou. Vendemos dois apartamentos pelo preço de um, e um carro a preço de banana. A gente sabia quanto dinheiro a gente tinha, mas não imaginávamos que ia dar para tão pouco".
Em 2009, Joana Treptow, sua mãe e sua avó começavam a recontar as suas histórias no quarto do tio que tinha vindo morar no Brasil. O lugar era Vargem Grande, Zona Oeste do Rio de Janeiro, uma área afastada do centro da cidade maravilhosa.
De lá, elas decidiram tocar a vida e procurar um lugar para morar. Mas a procura foi mais difícil do que se imaginava, tanto para uma nova choupana, quanto para emprego: "Foram quatro meses de pegar várias conduções para ir pro centro do Rio e cuidar de toda a papelada, porque eu tenho nacionalidade e minha mãe tinha que pedir nacionalidade através de mim, e minha avó precisava pedir pelo meu tio. É uma burocracia imensa. A venda das coisas em Portugal ficou um pouco pendente quando viemos, então manda procuração, manda não sei o que, vai pra cartório, vai pra consulado português.... E nesse tempo, começamos a procurar terreno, porque minha mãe queria construir uma casa. Nós achávamos que iríamos conseguir na Barra, alguma coisa assim, mas não. Na verdade, o dinheiro não dava pra isso e minha mãe não conseguia emprego".
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A mãe de Joana já tinha mais de 40 anos, e só conseguiu um emprego como vendedora da loja de lembranças do Maracanã. O terreno encontrado ficava em Niterói, cidade da Grande Rio de Janeiro, um lugar longe de tudo e que elas não conheciam. Salário baixo, avó sem trabalhar e a jovem também tinha um problema: não conseguia estudar, porque o ano letivo de Portugal não condizia com o do Brasil.
No fim, depois de alguma luta, a mãe da jornalista conseguiu um emprego melhor. Hoje, Joana confessa que as três achavam que tudo iria ser fácil: "A gente achava que ia ser fácil, mas não foi fácil. Depois que eu tive noção da mudança que a gente fez, e do esforço que a gente teve que fazer. Demorou muito pra gente ficar um pouco mais à vontade. As contas eram sempre muito apertadas. Sempre foi tudo muito difícil nesse início. E daqui, a gente via como estava a crise em Portugal: cada vez pior".
O sonho do jornalismo quase acabou
Joana Treptow sempre quis ser jornalista, desde a época em que morava em Portugal. Na Terrinha, para quem não sabe, se escolhe a área que você quer seguir já no nono ano do ensino fundamental. Por escolher algo de humanas, ela já foi para o estudo específico - mas por conta da mudança para o Brasil, estudou apenas um ano e meio nesse esquema.
"Era um sonho de criança. Antes de saber o que era o jornalismo, eu pensava em ser veterinária, mas era coisa de criança (risos). Quando comecei a entender o que era mundo, escolher profissão, sempre quis fazer jornalismo. Pensava em ser escritora também, escrevia um monte de coisa... Minha avó tem até hoje umas histórias que eu inventava, que escrevia e tudo. Mas sempre gostei muito de ler e escrever, e eu sabia que era isso que eu queria pra vida", explica.
Joana, mesmo com as dificuldades, teve o apoio de sua mãe e avó para entrar no jornalismo. Mas ela quase desistiu: no terceiro período, já estava em seu primeiro estágio, mas ganhava mal, trabalhava muito e parecia estar desiludida com a profissão. Foi quando, novamente, sua matriarca fez tudo acontecer.
"Ganhava pouco, trabalhava muito e não via um mercado com muita oportunidades. Eu tive uma crise. Eu lembro até hoje, chegando em casa chorando, dizendo pra minha mãe que não queria mais, que iria fazer Direito, que com Direito dava pra fazer concurso, que iria ganhar mais dinheiro... Ela me respondeu: 'Joana, nem pensar'. Eu tinha bolsa na faculdade, e foi isso que me permitiu fazer. Ela me disse que, se eu quisesse, iria fazer Direito depois que terminasse jornalismo. 'Você não vai, com 17 anos, dar chilique, dizendo que você não ganha quanto você gostaria de ganhar. Agora é a hora de ralar. Nesse momento, não vou te deixar fazer isso', ela disse", conta com detalhes a jornalista.
Realmente, não aconteceu. Treptow continuou estagiando - passou pelas redações de Globo News e Band - antes de se formar e ser contratada pela mesma Band. No Rio de Janeiro, começou como escuta, mas quando ainda estava na Globo News, ela notou que queria mesmo era reportagem. "Eu pedi pra ir mais para a rua, porque queria aprimorar. Quando cheguei na Band, mesmo na apuração, eu já sabia fechar matéria", diz.
Seguindo conselhos de pessoas que sempre falavam para ela insistir com o seu chefe em dizer o que queria, ela foi mostrando material na Band. Certo dia, fez uma reportagem muito elogiada pelo seu superior sobre economia, e com isso, conseguiu sair mais ainda na Band.
Daí pra frente, as coisas aconteceram bem rápido. Ao fim do contrato de estágio, ela virou repórter trainee na emissora. Começou a fazer todo o tipo de matéria, dançando em todos os horários no Rio. Além disso, suas primeiras oportunidades em rede chegaram: ela começou a aparecer no "Brasil Urgente" e no "Jornal da Band".
Com isso, passou a ser convidada para passar semanas em São Paulo e também ser chamada para cobrir férias, atestados e licenças. Ainda nesse tempo, também começou a apresentar o local "Jornal do Rio", noturno exibido no início da noite na Band. "Hoje em dia, se eu olhar o que eu apresentava, eu vejo muito amadorismo... Muito! (risos) Mas o Rodolfo [Schneider, diretor de jornalismo do Grupo Bandeirantes no Rio de Janeiro] confiou e achava que era assim que eu ia me construir e era assim que tinha que dar os primeiros passos. Foram três anos que aconteceram tudo muito rápido!", relembra.
A mudança definitiva para São Paulo e o possível preconceito
A Band convidou Joana Treptow para ir para São Paulo no ano passado, logo quando ela começou a se estabilizar. Ficou com medo, porque não conhecia nada e nem ninguém na capital paulista.
Sem amigos na cidade, ela colocou a cara no trabalho e aproveitou as brechas e oportunidades que tinha para crescer. "Brasil Urgente", "Café com Jornal" e apresentação do "Band Folia" em São Paulo. Além disso tudo, Joana falava: "Eu topo tudo, falava isso. Acho que eu me colocar a disposição, fez com que essas oportunidades fossem surgindo, eu agarrei todas as oportunidades. Passei a virada do Natal trabalhando, não passei com ninguém (risos)".
Pela visibilidade, em julho, ela acabou assumindo a apresentação do "Café com Jornal". Joana admite a insegurança, mas respirou e sabia que poderia dar conta do recado: "Eu sei que se eu não agarrar essas chances com tudo, essas oportunidades vão acabar passando. Então, não tem como não dar certo. Quando você se propõe aquilo, vai acontecer o melhor possível".
Falar as pessoas sempre vão falar. De fato, eu comecei muito nova na Band, com 21 anos
Joana Treptow sobre preconceito
Joana, como dissemos, tem 24 anos e é uma mulher inegavelmente bonita - o que acaba virando só um detalhe. Os comentários maldosos acabam surgindo, já que cresceu em três anos de forma rápida. Mas ela não se importa.
"Falar as pessoas sempre vão falar. De fato, eu comecei muito nova na Band, com 21 anos. Então em três anos eu passei de estagiária para repórter e apresentadora de um jornal de rede nacional. Faço tudo na casa, apresentei programa no Carnaval, faço reportagem no 'Jornal da Band'. Isso, claro, pode gerar algum incômodo para qualquer pessoa que, do nada, veja que eu estou em uma bancada. Mas nunca sofri diretamente com isso, acho que eu sempre me preocupei em demonstrar o meu profissionalismo, também por conta disso. Eu sei que estamos em uma sociedade machista, e eu sei que existe uma linha bem tênue entre uma profissional e uma menina moleca. Eu sei que as brincadeiras, a exposição da vida pessoal tem que ter um limite. Você tem que se construir profissionalmente. Eu sempre me preocupei em construir uma Joana profissional. Tive sorte em relação aos chefes que eu tive, agarrei as oportunidades", confessa.
"Já sofri preconceito por ser muito nova. Você sabe, todo mundo que começa novo na profissão novo e vai fazer uma entrevista, é descreditado. Mas nada que me fizesse me sentir desvalorizada. Eu sempre aprendo. Quando algo ruim acontece, eu sempre tento tirar uma lição, tento dar uma volta por cima. Mas que existe machismo na sociedade, que se reflete no mercado de trabalho, existe. A pessoa que é machista em casa é machista no trabalho. O preconceito e o machismo com as mulheres no mercado de trabalho existe sim, mas é só um reflexo da sociedade", conclui a jornalista.
Da política ao sonho
As vésperas de uma eleição eleitoral, Joana Treptow deu a sua opinião sobre o pleito deste ano. Ela sonha que a mudança venha, mas nota que, pelo menos neste ano, parece que não vai acontecer.
"Eu vejo um envolvimento crescente da população como um todo para com a política. O que resultou numa polarização do país, cada vez mais nítida. Acho legal que desde os mais novos aos mais velhos se interessem e se envolvam, só não me conformo com a falta de diálogo. Isso eu acho um retrocesso. Parece que andamos para o lado, tipo siris. Era suposto avançarmos mas essa intolerância e ódio em relação a quem é diferente tem me chamado muito a atenção. As pessoas se colocam uma contra as outras por causa de políticos e políticas que nem as alcançam de fato", diz a jornalista.
"Vemos o Brasil sendo saqueado, roubado, gozado... E uma parcela grande da sociedade deixa que a ideologia tape os olhos para o diálogo, premissa básica da democracia e da vida em sociedade. Era isso que deveríamos procurar hoje em dia. Falta muito para muitos. É triste. De partir o coração. Você para e vê que a renovação tende a ser pouca... A sensação é de que a mudança pode demorar a vir. Tenho fé, esperança de que venha. Todos nós precisamos disso", completa Treptow.
Por fim, ela diz qual o seu sonho na carreira, mesmo tendo tão pouca idade: ter um programa de entrevistas quando estiver mais madura, dar aula de jornalismo e escrever livros, quando for possível.
"Eu sou muito nova. Em três anos, já tive o prazer de experimentar muita coisa. Eu acho que é muito cedo para falar onde eu quero estar quando completar... Sei lá... 20 anos de carreira. É claro, eu gostaria, quando for experiente, de ter um programa meu, um programa de entrevista. Adoro entrevista! Mas antes ainda quero fazer muitas matérias especiais, viajar, descobrir conhecer... Eu queria muito dar aula. Tô fazendo pós-graduação, tive que parar um pouquinho, mas queria muito dar aula. E escrever um livro... Ou dois, ou três... Não sei se isso vai ser possível na vida, mas é um sonho", finaliza Joana.
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