Publicado em 13/10/2019 às 09:49:47
Segunda Chamada é uma série binária. Ela bebe da fonte dos extremismos que têm sido o norte da sociedade brasileira e escolhe um lado e vilaniza o outro. Mesmo assim, com um olhar poluído sobre um tema tão complexo, Débora Bloch dribla os maneirismos e brilhou no primeiro episódio.
A série que estreou na Globo na última terça-feira (08) acompanha a vida de uma professora, Lúcia (Débora), que volta a lecionar após um tempo afastada e seu retorno é marcado por um novo desafio: dar aulas para o EJA (Educação de Jovens e Adultos) do horário noturno.
Segunda Chamada peca e muito ao longo do primeiro episódio ao seguir a cartilha do politicamente correto de que professores são heróis. É o caso de Lúcia, uma mulher que tem seus próprios fantasmas, mas que coloca a vida em segundo plano para defender seus alunos e trata a pedagogia como um ato heroico.
Professor não é herói. Muito menos vilão. Assim como em toda profissão existem os mais diversos profissionais na classe e muitos dos problemas da educação do país passam justamente pela classe, mas essa não é uma discussão num ambiente de dramaturgia, importante no entanto, é que deveria ter sido tratado na obra.
Se Lúcia é uma espécie de heroína que vive os desmandos de uma sociedade que diminui o professorado e precisa combater os malvados que querem destruir sonhos de jovens e adultos, Débora traça o caminho oposto dessa obviedade narrativa e construiu uma personagem rica em nuances.
Embora os diálogos de Segunda Chamada enganem muito bem e ofereçam texto forte e que finge produzir reflexão - mentira, o enredo vem com a opinião pronta, você nem precisa pensar, só concordar - Débora criou pequenos trejeitos e olhares que tiram o ar de endeusamento desse ser e lembra ao público o que Lúcia realmente é: um ser humano.
A escolha da atriz para ser a protagonista de uma produção tão politicamente correta que grita na tela qual deve ser a opinião do telespectador foi perfeita. Débora sempre fugiu de composição maniqueísta em suas personagens e, por isso, conseguiu equilibrar o que tinha tudo para ser mais uma ode a grupos com um mesmo pensamento e ódio no antagonismo.
É preciso aqui se fazer um adendo: a crítica a Segunda Chamada não significa que professores devam ser mostrados como vilões, filmados ou o quer que seja. O mundo entrou num antagonismo exacerbado que foi levado para as telas de nossas produções e é preciso combater essa binaridade.
Se falta a Segunda Chamada uma engenharia inteligente para se propor uma reflexão sobre as condições pedagógicas do Brasil, sobra em Débora Bloch capacidade de interpretar uma personagem rasa e que é salva por uma poderosa construção em uma árvore que, na verdade, é oca. Por conta das dificuldades em interpretar uma personagem tão pobre em nuances e com resultado de tela louvável é que Débora Bloch é a atuação da semana.
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