"Oscar 2019" comprova que muitos conceitos da Academia ainda precisam ser revistos
Publicado em 25/02/2019 às 19:41
A noite de domingo (24) foi marcada por mais uma cerimônia de entrega do Oscar. Em sua 91ª edição, a maior e mais importante premiação do cinema mundial teve algumas surpresas agradáveis e outras nem tanto assim.
Quem curte acaba se frustrando, mas a verdade é que a Academia de Hollywood ainda tem muito o que evoluir. É inegável que de uns anos para cá os resultados têm sido mais distribuídos, aumentando as chances dos contemplados.
Além disso, este talvez tenha sido a edição de maior representatividade. Tivemos o primeiro longa de super-herói concorrendo na categoria principal. Com um elenco praticamente formado apenas por atores negros, “Pantera Negra” faturou três estatuetas, todos prêmios técnicos como o esperado.
Enquanto isso, “A Favorita”, filme que se destacou com um elenco feminino muito forte, deu o prêmio de Melhor Atriz para Olivia Colman. Destaque ainda para Rachel Weisz e Emma Stone, que concorreram como Melhor Atriz Coadjuvante, mas perderam para Regina King de “Se a Rua Beale Falasse”.
Com a vitória de Colman, Glenn Close (“A Esposa”) mais uma vez foi injustiçada por Hollywood. Agora, a atriz entra para uma lista que tem, ainda, Judy Garland (“O Mágico de Oz”, 1939, Ingrid Bergman (“Casablanca”, 1942) e Mia Farrow (“O Bebê de Rosemary”, 1968).
Seguindo a sina de Close, WillenDafoe, que interpretou o artista plástico Van Gogh em “O Portal da Eternidade”, tinha grandes chances de ser contemplado como Melhor Ator, não que Rami Malek não merecesse por seu Freddie Mercury em “BohemianRhapsody”, que acabou levando 4 estatuetas.
Entretanto, assim como o veterano ator de “Platoon” (1986), Humphrey Bogart (“Relíquia Macabra”, 1941, James Dean (“Juventude Transviada”, 1955, Anthony Perkins “Psicose”, 1960 e Jack Nicholson “O Iluminado”, 1980. Já estiveram na mesma posição que o colega.
Em um momento de revolta, Spike Lee não ficou na cerimônia para ouvir o discurso de Peter Farrely, diretor de “Green Book – O Guia”. O longa foi o grande vencedor da noite, faturando a estatueta de Melhor Filme.
Para quem não entendeu sua reação a gente dá uma ajudinha. Imagina o quanto deve ser difícil para um cineasta do seu gabarito, homem negro e com posicionamento político bem definido, profissional que sempre apostou em obras que discutem questões raciais, perder para um título que também aborda, mesmo que de forma mais poética, o racismo, feito através dos olhos de um cineasta branco.
O diretor que aposta sempre na mensagem subliminar “Wake Up!” (Acorde!), a fim de chamar as pessoas para uma maturidade social, não venceu na categoria a que concorria, assim como seu “Infiltrado na Klan” não levou como Melhor Filme.
Por outro lado, embora o prêmio como Melhor Roteiro Adaptado tenha soado mais como de consolação, Spike foi ovacionado pela plateia e pelo colega Samuel l. Jackson, com quem trabalhou mais de uma vez.
Agora, o cineasta entra para uma lista amarga de diretores renomados, porém ignorados pela Academia, como Alfred Hitchcock (5 indicações), Federico Fellini (4 indicações), Ingmar Bergman (3 indicações), François Truffaut (1 indicação), Akira Kurosawa (1 indicação) e Orson Welles (1 indicação).
Sem contar àqueles que sequer foram mencionados, mesmo tendo contribuído brilhantemente para o crescimento da indústria cinematográfica de Hollywood, como Tim Burton, Brian De Palma e Jean-Luc Godard, entre tantos outros.
Caminhando em passos curtos
E no meio dessa briga de foice ainda temos que nos contentar com grandes promessas que se tornam verdadeiros fiascos durante a cerimônia. Com foi o caso de “A Favorita” este ano, que embora tivesse recebido 10 indicações, incluindo a de Melhor Filme, levou apenas um.
A situação poderia ser pior caso o filme se juntasse aos que foram recorde de indicações, mas saíram da festa sem uma estatueta nas mãos como “A Cor Púrpura”, de Steven Spielberg (11 indicações), O Homem Elefante, de David Lynch (8); Tempo de Liberdade, de Frank Darabont (7); Anatomia de um Crime, de Otto Preminger (7) e Gata em Teto de Zinco Quente, de Richard Brooks (6).
Ou, ainda, quando um grande diretor vê suas melhores obras esquecidas no quartinho dos fundos, como já aconteceu inúmeras vezes com Martin Scorsese. Sim, não podemos nos esquecer de que ele levou o prêmio em 2007 pelo seu “Infiltrados”.
No entanto, antes o veterano cineasta teve que amargar a derrota de três de suas maiores obras-primas. Em 1977, “Táxi Driver” perdeu o título para “Rock, um lutador”. Já em 1981, foi a vez de “Touro Indomável” ser passado para trás por “Gente Como a Gente”. E como esquecer o vacilo de quem preferiu dar a estatueta para “Dança com Lobos” ao invés de “Os Bons Companheiros”, em 1991?
Aliás, os quase 100 anos de premiação nos faz crer que nem sempre os melhores de Hollywood são necessariamente bons. Até hoje, há quem critique o equívoco da Academia ao eleger “Shakespeare Apaixonado” (1999) e “Crash, No Limite” (2006).
Por outro lado, ter “Roma”, filme monocromático idealizado por Alfonso Cuarón, cineasta mexicano que levou o título de Melhor Diretor, concorrer também como Melhor Filme, se tratando de uma produção da Netflix, dá uma esperança de que bons ventos estão a soprar em Los Angeles, mesmo que caminhando em passos curtos.
Falada no idioma espanhol e toda feita em película preto e branco, a obra concorria ao todo em 10 categorias. Além de direção, o longa faturou os prêmios de “Melhor Filme de Língua Estrangeira” e Melhor Fotografia, totalizando três estatuetas. Bravo!