Publicado em 08/07/2017 às 16:10:46
A música de uma novela, série ou minissérie tem sempre que “casar” com a proposta da história. Parece óbvio, mas é importante ressaltar esse ponto. É o que conta Eduardo Queiroz, produtor musical de obras como “Avenida Brasil”, “A Regra do Jogo”, “Cordel Encantado” e “A Cura” e personagem desta parte do especial “Emoção que se ouve”.
Parte 1: Um pouco do mundo das trilhas instrumentais na TV
“Um tema musical ou um fundo instrumental para TV ou cinema deve sempre procurar ampliar a experiência do espectador, aprofundar o personagem e a dramaturgia”, explica o músico, que assina junto a Victor Pozas a trilha de “Os Dias Eram Assim”, às 23h.
“Não se deve escolher canções ou criar temas instrumentais sem esta perspectiva. Procuro sempre criar primeiro um conceito musical, que engloba esses aspectos gerais. Isso vale para a música original e para a escolha das canções. As duas andam juntas na minha opinião”, completa.
Seu rosto não é conhecido - não há fotografias disponíveis do músico, que mora em Portugal. Apesar do aspecto “anônimo”, seus temas já marcam a cabeça dos telespectadores.
Que o diga o tango da vilã Atena (Giovanna Antonelli), ou os temas dos jogos de vingança de Nina (Débora Falabella) e Carminha (Adriana Esteves). “Meu trabalho é de bastidor, mas percebo que várias pessoas se interessam pela trilha instrumental dos projetos que participo. Sempre é bom ter um feedback do público”, diz Eduardo.
Antes de entrar para a televisão aberta, já assinava a música de filmes como “Bellini e a Esfinge” (2001). Recentemente, foi disponibilizado quase todos os seus trabalhos musicais na Globo, por meio das plataformas digitais, como o Spotify, iTunes e Google Play Música.
Confira a entrevista completa:
Você basicamente estreou na TV aberta, na dramaturgia, assinando a produção musical da série "A Cura", de 2010. Como foi o convite para participar da obra, bem como a criação desta trilha?
Eduardo Queiroz - O convite partiu do autor João Emanuel Carneiro, com quem já havia trabalhado alguns anos antes. O Ricardo Waddignton, que era o diretor de núcleo na época, abraçou a ideia e surgiu assim uma longa parceria, tanto com o João como com o Ricardo.
Procurei desenvolver a trilha de “A Cura” como a música de um filme de Hitchcock, ou seja, muita música instrumental participando ativamente na dramaturgia da história. Essa abordagem agradou a direção que soube explorar o material original de uma maneira diferente do usual.
“A Cura” tem um tema principal, uma melodia marcante, que foi a base de todos os outros temas. Fui desenvolvendo as músicas sempre em torno desse tema principal, e acredito que ele tenha ficado impregnado na história. “A Cura” tem aproximadamente 80 músicas originais e não tem canções. Apenas música instrumental.
Lendo um pouco seu histórico, antes da "estreia" em "A Cura", vi que uma das trilhas que embalavam as vinhetas interprogramas da Globo entre 2000 e 2004 era sua. Você lembra dela?
Eduardo Queiroz - Vagamente... Acho que tinha uma de um palhaço... faz bastante tempo.
Como foi realizar a música original de “Avenida Brasil”? Em entrevistas, você chegou a declarar que a trilha instrumental, séria e tensa, era um contraponto às músicas da trilha comum, alegres e populares. Por que essa opção?
Eduardo Queiroz - O João Emanuel gosta muito de trilhas sonoras. Ele participa ativamente do desenvolvimento das trilhas. Essa estratégia foi criada para que a história tivesse uma maior perspectiva dramatúrgica. Os dramas são verdadeiros e profundos, e a trilha busca ampliar essa percepção. Do outro lado, temos uma música vibrante, popular e irreverente. Como o João Emanuel sempre diz, as canções devem comentar os personagens, como uma extensão do texto.
Entre 2013 e 2014, você chegou a assinar a produção musical de três produtos ao mesmo tempo - "Joia Rara", "Além do Horizonte" e a minissérie "Amores Roubados". Como foi isso?
Eduardo Queiroz - Foi desafiante e uma enorme responsabilidade. Gosto muito do resultado dos três projetos. Adoro o cabaré de “Joia Rara” e dos temas da Pérola, dirigido pela Amora Mautner; das trilhas de ação e das canções de "Além do Horizonte", dirigido pelo Gustavo Fernandez; e realmente acho que "Amores Roubados" é um belo trabalho que mostra a sinergia entre direção e compositor.
Ela é muito particular e casou perfeitamente com a fotografia do Walter Carvalho, com a interpretação do elenco e a direção do (José Luiz) Villamarim.
O mérito da boa trilha também é do diretor, que sabe dar liberdade ao compositor e tomar decisões criativas em momentos cruciais. Enfim, é uma parceria profunda e muito íntima, e tive isso nos três projetos. Um privilégio!
É recorrente participação sua em obras escritas pelo João Emanuel Carneiro; ou dirigidas por Amora Mautner ou José Luiz Villamarim. Como é a parceria entre vocês?
Eduardo Queiroz - Criar uma trilha sonora não é algo simples, exige uma mente aberta, ousadia e muito, mas muito, experimento. Acho que meu processo de trabalho se alinha às expectativas desses que você citou, e de outros diretores e autores que tive a oportunidade de trabalhar.
Em "A Regra do Jogo", virou febre o tango da vilã "Atena" (Giovanna Antonelli)...
Eduardo Queiroz - Foi bom ver que o tema da Atena deu certo. O João Emanuel gosta muito de tangos modernos para as suas vilãs. Usou em todas as suas novelas: Bajofondo, Gothan Project, etc.
Quando estávamos no início do projeto, o João pensou em um tango para Atena. Ele queria algo inédito e marcante. Fiz, juntamente com o Guilherme Rios, um rascunho inicial e todos gostaram muito do resultado. O tema tem 12 variações diferentes, o que possibilitou que a música participasse cinematograficamente das cenas, uma das vantagens de ter sido uma música original ao invés de uma canção já existente.
Diogo Cavalcante é formando em jornalismo. Amante de televisão e apaixonado por novelas, fala sobre o assunto desde 2013. É um dos maiores especialistas sobre Classificação Indicativa na internet.
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