Carol Duarte lamenta situação do país: "Parece que o professor virou inimigo"
Atriz estará em "Segunda Chamada", nova série da Globo que se passará numa escola pública
Publicado em 04/09/2019 às 05:50
Desde que estreou na TV, em “A Força do Querer” (2017) na pele de Ivana, uma jovem que ao longo da trama foi identificando sua transexualidade até tornar-se Ivan, a atriz Carol Duarte vem se destacando pelas possibilidades dramatúrgicas que suas personagens lhe proporcionam.
Já em seu segundo trabalho, viveu a prostituta Stefânia em “O Sétimo Guardião”. Pronta para estrear a série “Segunda Chamada”, ela não esconde os desafios deste novo projeto, a começar pela desconstrução romanceada que a maternidade traz à Solange, mãe solteira que retoma os estudos no período noturno e trabalha vendendo objetos no trem. “Tem as dificuldades da vida real, muitas mulheres criam os filhos sozinhos, principalmente as que não têm muita condição financeira”, pontua.
O NaTelinha acompanhou a atriz em cena no set de filmagem em São Paulo, que serviu de cenário do fictício colégio Escola Estadual Carolina Maria de Jesus. Após a gravação, conversamos com Carol Duarte, que também está no elenco do filme “A Vida Invisível”, representante do Brasil no Oscar.
Confira:
Como é a Solange em "Segunda Chamada"?
Carol Duarte - Ela tem uma filha bem pequena, praticamente a cria sozinha. Tem o desejo de voltar a estudar, mas não é tão mais velha para estar nessa escola para adultos. Ela trabalha vendendo objetos no trem, se vira como pode. Será uma participação em poucos episódios. Quando pegamos uma personagem com um período mais longo, dramaturgicamente, conseguimos construí-la. No caso da Solange, tive que construí-la nessas cenas que nós tínhamos.
"Segunda Chamada" foi gravada em um prédio desativado, que no passado já foi uma escola real, em São Paulo
O que mais te marcou no processo de construção da personagem?
Carol Duarte - Essa questão da maternidade é bem forte na Solange, foi muito trabalhado e pensado por mim; até onde ela consegue ir sozinha, pois é bem nova... Tendo que trabalhar, estudar, a filha que depende dela... Não é uma relação tão romanceada, têm as dificuldades da vida real, muitas mulheres criam os filhos sozinhos, principalmente as que não têm muita condição financeira. Vi alguns filmes. Tem um que não tem uma relação tão direta com a personagem, porém, as imagens estão muito na minha cabeça, chama-se “Cafarnaum”, que é uma criança cuidando de outra criança.
Quais recordações você traz de sua vida escolar?
Carol Duarte - Tive bons professores, que me marcaram bastante. Ser professor traz consigo essa beleza de mostrar o mundo ao aluno que transcende as matérias lecionadas. Eu estudei em escola particular, que é outro contexto da escola pública, mas não deixa de ter suas dificuldades como bullying, por exemplo. É um momento da vida de descobertas, é tudo conflituoso consigo mesmo.
Alunos e professores vão se identificar com a história?
Carol Duarte - É muito interessante a série se passar em 2019. Estamos sofrendo ataques na educação, parece que o professor virou inimigo. Talvez porque ele provoque reflexões, abra mundos, hoje vemos um desmonte cada vez mais feroz. Que a série traga reflexões, pontos que possamos discutir juntos.
Você estreou na TV em 2017, fazendo o papel da trans Ivan/Ivana em “A Força do Querer”. Vivendo sua terceira personagem, como tem sido ser a intérprete de papéis emblemáticos?
Carol Duarte - De certa maneira, venho lidando com a questão do gênero. O Ivan/Ivana, a Stefânia, uma mulher prostituta, e a Solange que é uma mulher mãe solteira. São papéis duros, embora em “O Sétimo Guardião” fosse outro tom. Mas qual papel não é difícil? Qualquer ser humano tem sua complexidade.
As pessoas te param até hoje por conta do personagem Ivan/Ivana?
Carol Duarte - O público ainda me reconhece bastante como Ivana. Foi meu primeiro trabalho na TV, um personagem muito marcante. As pessoas assistiam bastante à novela, dava uma audiência grande na época. Foi interessante a repercussão sobre o tema, tem gente que falava comigo que não sabia que transexualidade existia. Tudo foi novo para mim como atriz, e o tema. As pessoas do Portugal, Chile e Peru, onde a novela passou, me abordam bastante. Novela tem uma característica forte, porque ela atinge pessoas de todos os níveis sociais e econômicos, trazendo para discussão.
Vamos falar de cinema. Como foi a experiência de participar do filme “A Vida Invisível”?
Carol Duarte - Foi o processo mais vertical que eu já vivi. O Karim Ainouz tem uma característica como diretor de envolver o ator, a preparação em cena é muito profunda. Foram três meses intensos de filmagem. Ninguém atendia celular no set, nem me chamavam de Carol, e sim, Eurídice, minha personagem que divido com a Fernanda Montenegro. O filme fala de duas irmãs que são apaixonadas uma pela outra, mas elas são separadas. Estou empolgada para o filme ser exibido no Brasil, fala muito sobre a mulher também.
Você iniciou sua carreira artística no teatro, certo?
Carol Duarte - Sim. Comecei fazendo teatro na Prefeitura de São Bernardo do Campo (SP). Realizei muitos trabalhos públicos, estudei na Escola de Arte Dramática da USP.