Mesmo em grave crise, Manchete foi gravar "novela salvadora" na Irlanda
Publicado em 13/06/2016 às 15:59
Há 18 anos, um fato no mínimo inusitado para uma emissora que estava em grave crise financeira acontecia. Em 13 de junho de 1998, a novela "Brida", da Manchete, começava a ser gravada.
A trama foi confirmada em abril do mesmo ano, e foi uma adaptação de um dos livros mais famosos do escritor Paulo Coelho. Na época, Walter Avancini, diretor de dramaturgia da Manchete, afirmava que a escolha havia sido de forma cuidadosa, e que Paulo Coelho havia concordado em ceder os direitos sob o livro sem interferir na adaptação para a televisão. Walter se escorava no sucesso de vendagem: "Brida" vendeu 800 mil exemplares no Brasil e 8 milhões em 36 países de língua portuguesa e espanhola em que foi lançado, um recorde na época.
A intenção da Manchete era fazer o mesmo que "Xica da Silva": obter boa audiência com uma novela, recuperar o seu prestígio e vender a trama com força para o mercado exterior - naquela altura, "Xica" já havia sido vendida para mais de 35 países, um recorde para a Manchete se tratando de uma produção que havia se encerrado apenas um ano atrás.
As primeiras cenas foram gravadas no Rio de Janeiro, nos estúdios da Manchete e em locações externas, como a Lagoa Rodrigo de Freitas. O problema foi o que ocorreu pouco depois: em agosto, numa atitude ousada para quem estava quase fechando e para quem tinha um orçamento de 45 mil dólares por capítulo - na época, 40% do que a Globo gastava na novela das 21h da época, "Torre de Babel" -, uma comitiva de 18 pessoas foi para a Irlanda, mais exatamente na capital, Dublin, gravar cenas de "Brida".
Inclui-se nesta comitiva a protagonista Carolina Kasting, além dos atores Guilhermina Guinle, Rubens de Falco, Wanessa Bonelli, Fabiana Amorim e Manuela Dias. As cenas gravadas voltavam ao século XIV, para seguir à risca a obra de Paulo Coelho. Entre os cenários, estava um grande castelo medieval em Limerick, cidade próxima à capital. Todo o equipamento composto por câmeras, cabos, figurino e perucas, foi embarcado num voo de carga, para reduzir custos.
Na época, não só a imprensa, mas também dentro da Manchete, criticou a direção da emissora por permitir a viagem. O principal argumento era que, como o canal estava em dificuldades, era melhor reduzir custos ao máximo. Como "Brida" envolvia recursos de efeitos especiais e figurinos elaborados, o custo era alto para uma TV em dificuldades. Logo, a grande maioria achou a escolha errada, fadando a novela a fracassar.
E foi o que de fato aconteceu. "Brida" fechou com média de 3 pontos de audiência na Grande São Paulo. O contrato de risco com os patrocinadores estipulava que o dinheiro não entraria se não fossem atingidos pelo menos 5 pontos. O azar de "Brida", além de sua falta de apelo, foi o auge dos programas popules: a novela batia de frente com a "guerra da baixaria" das 21 horas, protagonizada pelo "Programa do Ratinho", do SBT, e o "Leão Livre", da Record. Enquanto os popularescos chegavam aos 20 pontos, "Brida" penava para ganhar da Band - o seu recorde durante os 54 capítulos foi de 4 pontos.
Sem dinheiro para pagar os atores e técnicos e sem Ibope, "Brida" foi cancelada e teve um final narrado pelo locutor oficial da Manchete, Eloy de Castro. O fim da história todos conhecem: a emissora fechou, foi vendida e virou a RedeTV!.
O último capítulo de "Brida" pode ser visto na íntegra, inclusive com o seu "fim narrado" por um locutor, aqui.