Publicado em 23/08/2017 às 10:41:29
Resgatando uma das cenas do filme “Trumbo” (2015), que conta a história do roteirista Dalton Trumbo, perseguido pelo governo dos Estados Unidos durante a Guerra Fria pelo seu envolvimento com o comunismo, o personagem, interpretado por Bryan Cranston de “Breaking Bad”, está às voltas com a adaptação para o cinema do livro épico “Spartacus”, quando diz a máxima a um produtor ansioso: se todas as cenas do filme fossem memoráveis, como esse produtor gostaria, então nenhuma delas acabaria sendo memorável.
No Brasil, onde as novelas improvisam a sua própria Hollywood, mais especificamente as produções da Globo, a fórmula preconizada por Trumbo parece ter sido alcançada, finalmente, por Glória Perez, autora de “A Força do Querer”, uma das maiores audiências recentes da emissora carioca na faixa das 21h.
Com um currículo extenso de novelas, séries e minisséries, além de vencedora do Emmy de melhor trama por “Caminho das Índias” (2009), Perez parecia não ter mais nada a provar para um público familiarizado com o seu estilo, nem sempre acertado, que unia fantasia, trama urbana e merchandising social, estilo herdado de Janete Clair, de quem foi pupila. Mas enquanto Clair tinha grande aceitação, Perez entrou em carreira solo na aridez das décadas de 1980 e 1990, quando as crises econômicas e políticas faziam o público aceitar o fantástico apenas nas cidades cenográficas das novelas regionais.
Na antítese do conselho de Dalton Trumbo, Glória Perez enxergava as próprias tramas como viagem literária e bandeira ativista, tudo ao mesmo tempo. O seu gosto por retratar tipos populares, hábitos cariocas, bordões, tecnologia, mudanças de costumes e povos de países tão longínquos quanto Índia e Marrocos, a tornaram um paradoxo ambulante: suas histórias atingiam certo êxito no Ibope, mas começaram a marcar a autora como uma caricatura de si mesma.
Prova maior foi “Salve Jorge”, novela de 2012 cuja história sobre o tráfico de mulheres se perdeu em meio a vários núcleos na ponte Rio de Janeiro-Turquia e às inconsistências tão grandes que a frase da autora em uma entrevista à época, dizendo para o público “aprender a voar”, jogou pimenta na discussão sobre o desgaste do seu estilo.
Em relação a “Força do Querer”, o tapete voador de Glória Perez está ali, rasante: merchandising social discutindo os personagens transgêneros, o cosplayer e o vício em jogo, o sereísmo como estilo de vida, a vida real entrando pela adaptação da história sobre a “baronesa das drogas”, além dos truques clássicos de folhetim (testes de DNA, casais que vão e voltam, adultério e etc.).
A diferença, além dos núcleos mais coesos, do texto mais maduro, do apego menor ao exotismo e da direção sóbria de Rogério Gomes, parece estar na máxima do roteirista perseguido pela intolerância de décadas (nem tão) passadas: em tempos de aperto e de desilusão da audiência, o menos é mais.
Ariane Fabreti é colunista do NaTelinha. Formada em Publicidade e em Letras, adora TV desde que se conhece por gente. Escreve sobre o assunto há oito anos.
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