Está na hora de buscarmos um novo formato para a telenovela. Um formato que recupere a qualidade de outros tempos. Talvez seja bom observar e analisar as boas séries produzidas pela televisão americana, inglesa, francesa ...
Publicado em 24/03/2019 às 07:33:11
O debate sobre o tamanho das telenovelas brasileiras é antigo e parece que voltou à tona em 2019. Antenada com o movimento internacional, a Globo tem evitado realizar novelas acima de 200 capítulos. Contudo, a emissora se posiciona oficialmente como uma empresa que experimenta e testa diversos estilos de trabalho, sem necessariamente se prender a uma fórmula.
Segundo reportagem publicada pelo jornalista Ricardo Feltrin, do UOL, recentemente, teria ocorrido uma reunião entre diretores e artistas veteranos da Globo, onde pela primeira vez falaram sobre uma possível possível diminuição das novelas num futuro próximo.
A intenção do canal seria de que as produções do gênero não ultrapassassem a marca de 100 capítulos. O NaTelinha confirmou a informação com pelo menos dois autores diferentes. Porém, nos bastidores, o assunto é tratado como sigiloso e a mudança seria gradual a fim de evitar impacto comercial e de pessoal num primeiro momento.
Está na hora de buscarmos um novo formato para a telenovela. Um formato que recupere a qualidade de outros tempos. Talvez seja bom observar e analisar as boas séries produzidas pela televisão americana, inglesa, francesa ...
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Vale lembrar que, no universo da Globo, novelas com menos de 100 capítulos já foram testadas no horário das 23h nesta década. Atualmente, porém, a emissora trata as produções do horário como superséries.
Novelas curtas é um assunto debatido há muito tempo. Desde 1999, quando a dramaturgia era de responsabilidade de Daniel Filho, o tema era discutido. O diretor apresentou à cúpula da emissora estudos que apontavam a possibilidade de uma novela se pagar após 80 capítulos e o retorno financeiro acontecia por volta do capítulo 100.
Em setembro daquele ano, o jornal Folha de S.Paulo publicou reportagem do jornalista Alexandre Maron sobre o desejo da Globo investir em tramas curtas. A matéria relatava a insatisfação de alguns autores em relação ao número de capítulos das novelas e Lauro César Muniz fazia parte deste grupo.
"Há alguns anos, o Boni me pediu que fizesse um relatório provando que seria possível fazer novelas menores e mais baratas. Eu tentei mostrar que, com menos personagens, tramas paralelas, cenários e locações, seria possível reduzir o preço. Mas na época foi arquivado", explicou Muniz em 1999.
Após a saída de Boni e de Daniel Filho, o plano não foi levado adiante e as novelas passaram a ser ainda maiores, ultrapassando a barreira dos 180 capítulos. “Kubanacan” (2003), de Carlos Lombardi, é um dos casos mais emblemáticos, chegando à marca de 227 episódios.
Vai melhorar muito a qualidade das telenovelas. Em novelas longas de 200 capítulos sempre teremos 'barrigas', trechos de ação artificial, para preencher o absurdo número de 200 capítulos ou mais
Lauro César Muniz
Na década passada, praticamente todas as novelas das 21h tiveram mais de 200 capítulos. Entre 2000/2001 e 2010, a Globo exibiu 15 tramas no horário, dessas, apenas duas tiveram duração menor, uma delas, “A Favorita”, fechou com 197. A outra foi “Paraíso Tropical”, que contou com 179.
Porém, desde o início desta década, a emissora tem feito essa diminuição gradativamente. As novelas das 21h, por exemplo, não têm passado dos 180 capítulos desde “Império” (2014).
O indício de que a Globo parece sinalizar para diminuir a quantidade de capítulos de seus folhetins vai de encontro ao que tem feito outros países. O Reino Unido, por exemplo, optou por dividir novelas longas em temporadas, como acontece com as séries. O México, inclusive, parece caminhar para produzir séries baseadas em telenovelas.
Mas no Brasil, a visão não é consenso. O SBT exibe novelas infantis que quebram recordes de número de capítulos. No ar, “As Aventuras de Poliana” deve se tornar a trama com o maior número de capítulos da história, serão mais de 600. E, ao menos até o momento, a audiência tem retribuído.
A Record já vem em processo semelhante ao da Globo. Após “Ribeirão do Tempo”, que teve 250 episódios em 2011, apenas “Vitória” ultrapassou a marca dos 200 capítulos nesta década na emissora. “Apocalipse” terminou com 155, enquanto “Jesus” chegará ao fim em abril com 188.
Procurada pelo NaTelinha, a Comunicação da Globo informou que a duração das produções variam de acordo com a demanda da obra, ou seja, o número de capítulos é definido através da história que a novela está contando, seguindo estratégia de programação, entre outros detalhes.
O tamanho do elenco da obra também é definido pelo que a história pede. Isso significa que uma novela das 21h pode contar com mais de 100 atores, como também pode não passar da casa dos 50, por exemplo.
Confira a íntegra da nota enviada pela emissora:
“Não é novidade que a Globo está em movimento, testando, experimentando, implementando formatos variados, seja de dramaturgia ou de variedades, só pra falar do entretenimento.
As novelas já têm duração variada e isso tem a ver com a história que está sendo contada, com a estratégia de programação, entre outros fatores.
O número de atores de cada obra também obedece às necessidades da história”.
Durante muitos anos, o principal fator defendido para tramas mais longas foi justamente o alto valor da produção que exigia muitos capítulos para que a produção se tornasse viável comercialmente. Lauro César Muniz pensa diferente.
“Há muitos anos defendo a ideia de diminuir o número de capítulos. Em um artigo de 2013, entre outras coisas, escrevi: 'eu me referia que as novelas não poderiam ultrapassar 120 capítulos'”, disse o autor com exclusividade para o NaTelinha.
A tese defendida pelo roteirista é que, com menos capítulos, o formato deve recuperar a qualidade de outros tempos. Ele apontou para as séries internacionais, que conseguem ter uma dinâmica parecida com a de cinema, mantendo o interesse do público e sem perder a excelência.
Vale lembrar que Lauro César liderou um movimento para tentar diminuir o tamanho das novelas no início desta década, logo após ele escrever “Poder Paralelo” na Record, que contou com 238 capítulos.
“Está na hora de buscarmos um novo formato para a telenovela. Um formato que recupere a qualidade de outros tempos. Talvez seja bom observar e analisar as boas séries produzidas pela televisão americana, inglesa, francesa, alemã e mais recentemente a mexicana. A dramaturgia dessas séries tem a mesma dinâmica do cinema, com passagens de tempo ágeis, elipses adequadas, sincronicidade de ações, edição sempre ativa e inusitada, bons diálogos”, listou o escritor.
Lauro aproveitou e explicou como a emissora pode investir em novelas mais curtas sem ter prejuízo: “Não precisaremos de tantos núcleos paralelos, o que concentra a narrativa na história central, como nas boas séries. Assim, com menos pessoal e produção reduzida, o ponto de equilíbrio financeiro será proporcional ao da novela de 200 capítulos, que se paga depois do capítulo 100. Com 120 capítulos o ponto de equilíbrio financeiro de uma novela recua para 60 capítulos, ou em volta de”.
Com menos capítulos, o autor acredita que haverão novelas com maior qualidade. “Vai melhorar muito a qualidade das telenovelas. Em novelas longas de 200 capítulos sempre teremos 'barrigas', trechos de ação artificial, para preencher o absurdo número de 200 capítulos ou mais”, finalizou em conversa com a reportagem.
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