Publicado em 01/04/2017 às 00:52:03
Canta Maria Bethânia na música "Era Pra Ser", por acaso presente na trilha de "A Lei do Amor", novela que se encerrou nesta sexta (31): “Era pra ser canção de amor, era o amor em versos”.
A belíssima composição embalou lindas cenas da trama, mas serve, também, para que se faça uma analogia com a trajetória da novela, estreia no horário das 21 horas de Maria Adelaide Amaral e Vincent Villari, juntamente com seus seis colaboradores (mais Silvio de Abreu, mais Ricardo Linhares. Ufa!).
"A Lei do Amor" começou com a promessa de ser uma novela sobre uma linda história de amor. Sua primeira fase, trazendo Isabelle Drummond e Chay Suede nos papéis principais, deixou o público otimista: parecia estar ali uma trama que, enfim, voltaria a cair no gosto dos telespectadores, coisa que as anteriores não haviam conseguido. Mas o que era pra ser ficou na promessa.
Canta a música mais pra frente: “O amor soprou de outro lugar pra derrubar o que houvesse pela frente. Tenho que te falar: essa canção não fala mais da gente”.
A grande promessa de "A Lei do Amor" havia ficado pelo caminho, com todos os núcleos caminhando por rumos tortos, sem chances de recuperação. E assim ela terminou.
Se o romance de Helô (Claudia Abreu) e Pedro (Reynaldo Gianecchini) parecia tão puro em outros tempos, ele terminou a novela sem o mesmo entusiasmo. Não por causa de seus intérpretes (principalmente Claudia Abreu, que mais uma vez mostrou a grande atriz que é), mas por causa do caminho que os autores fizeram esses personagens percorrerem até o fim. Protagonistas por meses sem função, traições descabidas e repetição de histórias podem ajudar a explicar. A cena final rememorando momentos marcantes da história de ambos, embalada pela emblemática "Maior", de Dani Black e Milton Nascimento, serviu para aumentar a sensação de que o casal merecia mais.
Se o enlace amoroso de Tiago (Humberto Carrão) e Isabela (Alice Wegmann) até agradou o público inicialmente, segundo os nebulosos grupos de pesquisa, ele terminou sem o mesmo brilho que pode ter tido antes. A falta de qualquer resquício de dignidade dos personagens ao longo desses meses ajudou a chegar até ali. Tiago se apaixonou por Isabela quando ainda estava namorando Letícia (Isabella Santoni), àquela época insuportável, é verdade. Mas eis que Tiago perde Isabela, reaproxima-se de Letícia, casa-se com ela, Isabela volta como Marina (num mistério com o qual poucas pessoas se importaram) e o núcleo que era ruim fica pior ainda, terminando cheio de furos e com uma espécie de final em aberto, numa tentativa dos autores de repetirem o desfecho de Amora (Sophie Charlotte) e Bento (Marco Pigossi) em "Sangue Bom". Sem qualquer sucesso.
Na novela que fala sobre o amor (os autores lembraram disso num discurso de Helô e Pedro na galeria quase no final do capítulo), Hércules (ou Cucu, papel de Danilo Granghéia), então apaixonado por Luciane (Grazi Massafera), terminou sua trajetória nas ruas de São Paulo ao lado de Aline (Arianne Botelho), ainda garota de programa, porém sem nenhum luxo, numa clara inspiração em Bebel, de Camila Pitanga em "Paraíso Tropical". Por incrível que pareça, foi o melhor deste último capítulo.
Flávia (Maria Flor) voltou após se descobrir lésbica. E Salete (Claudia Raia) teve mesmo um final feliz ao lado de Gustavo (Daniel Rocha). Regenerado ou mal construído? Fica a questão. Mileide (Heloisa Périssé), charlatona, ficou com Venturini - personagem de Otávio Augusto que também acabou ficando pelo caminho. Luciane, excelente trabalho de Grazi Massafera, terminou sonhando com o cargo de primeira drama. Com o sorriso no rosto, a bela, mas nada recatada e muito menos do lar, pode se sentir satisfeita por ter conseguido se livrar da onda de mudanças e descaracterizações que assombrou a novela.
E quem muito assombrou durante a novela terminou debaixo do trem, numa cena sem qualquer tipo de capricho por parte da direção – que muito pecou durante esses meses e, neste último capítulo, não foi diferente. Magnólia (Vera Holtz) preferiu morrer a se entregar.
"A Lei do Amor" termina, assim, como uma bela analogia da belíssima música presente na sua caprichada trilha sonora. Era pra ser tanta coisa, principalmente canção de amor, mas alguma coisa soprou de outro lugar e derrubou o que havia pela frente e “tenho que te falar, essa canção não fala mais da gente”.
João Paulo Belmok é advogado mas há vários anos acompanha e discute diversas produções da dramaturgia da Globo, como novelas, séries e minisséries. Encontre-o no Twitter, @jupabelmok.
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