Moda

Raquel Acioli de Vale Tudo: Por que a Globo acha que pobre só usa roupa estampada?

Se tem coisa que não falta na dramaturgia brasileira é estampa no figurino de personagem pobre


Raquel Acioli, personagem de Taís Araújo na novela Vale Tudo, com suas roupas estampadas
Raquel Acioli (Taís Araújo) em 3 momentos
Por Drika Oliveira

Publicado em 06/06/2025 às 15:49,
atualizado em 06/06/2025 às 16:37

Raquel Acioli, de Vale Tudo, interpretada pela atriz Tais Araújo, tem dado o que falar com seu figurino. Tudo porque mesmo em eventos mais chiques ou formais, a bela não larga mão dos vestidos ultra estampados.

Se tem coisa que não falta na dramaturgia brasileira é estampa no figurino de personagem pobre. Parece que nos Estúdios Globo a regra é clara: quanto menos dinheiro, mais flor, listrado e oncinha no look.  E muitas vezes dão estampas nada com nada, enormes, confusas com padrões e costuras que não harmonizam, né? Tudo junto e misturado. Mas e na vida real, será que é assim? 

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Parece existir  uma entidade mística nas novelas que deve trabalhar assim: abre o  Pinterest, digita “pobre brasileiro + alegria + estampa + tecido molenga + brega controlado”... e plim! Tá feito o figurino da classe operária das novelas...

É batata. Você piscou e lá está a personagem humilde - geralmente batalhadora, mãe solo, dona de quiosque ou camelô licenciada -, vestindo aquela blusa de de malha fina cheia de hibiscos, tucanos ou flores enormes que nem o Saara (comércio popular do Rio de Janeiro) quis mais vender.

Mas calma, isso não é de hoje, nem começou ontem.  O uso de muitas estampas diferentes no mesmo visual parece mesmo estar no subconsciente/ imaginário coletivo o que pode refletir nas novelas.

Revisitando a primeira versão de Vale Tudo, de 1988, a gente consegue ver que Raquel Acioli (vendedora de sanduíche natural na praia), começou com roupas de estampas chamativas, meio desconexas , cores vibrantes, chamativas e acessórios de baixa qualidade.. até dar certo na vida. Aí, depois, terno branco, cabelo engomado, sapato combinando — o combo do sucesso na dramaturgia global. Então podemos esperar que o mesmo aconteça nessa nova versão.

E não é só com a Raquel em Vale Tudo que o excesso de estampas se faz presente,  isso aconteceu com várias outras personagens pobres e batalhadoras como Dona Lurdes de amor de Mãe, Maria da Paz de Dona do Pedaço entre tantas outras...

Quando a gente olha pro núcleo mais humilde da novela, é certo que terá estampa de girassol, xadrez, listrado, poá, tudo junto e misturado. Parece que quanto menos dinheiro, mais cor o povo tem que carregar nas costas. É como se a paleta Pantone dissesse: “Lascados sim, porém muito alegres”.

E essa lógica persiste, viu? Na reprise de qualquer novela no Vale a Pena Ver de Novo e joga bingo:

  • Vestidos simples porém super floridos
  • Regata de malha com estampa de coqueiro 
  • Chinelo de dedo com florzinha 
  • Bolsa de palha, independente se é praia ou centro da cidade. 

A pergunta que fica: quem foi que decretou que ser classe média baixa vem obrigatoriamente com combo de estampa? Existe um decreto escondido, uma lei não escrita, um manual de dramaturgia que diz: “Se não tiver uma blusa de oncinha, ou com big flores não é periférico o suficiente”?

Enquanto isso, o núcleo rico vem todo na paleta do Pinterest chic: bege, off-white, cinza, preto e branco. No máximo uma bolsa vermelha pra “ousar”. Roupa que não amassa, não desbota, não tem etiqueta das lojas de departamentos ou do Brás. Grife, grife até no pijama.

Aliás, falando em Brás - pólo de comércio popular em São Paulo -, podemos ver que tem muita roupa legal para nós (pobres mortais) mas com tons neutros como as "brusinhas", vestidos e outras peças em branco, preto, roxo, etc... E também roupas coloridas que não precisam necessariamente ser tão espalhafatosas.

E olha, não é questão de não gostar de estampa não, viu? A gente ama uma oncinha, adora um floral, respeita um animal print. Mas é sobre escolha, e não sobre carimbo social. Porque na vida real, quem tem menos também faz sua moda, também ama um básico, também gosta do liso, do monocromático, do minimalista. E quem tem muito, às vezes, tá na estampa também — mas na novela, não. 

Na novela, estampa virou sinônimo de boleto atrasado, ônibus lotado, sofrimento, dureza e falta de Pix...

A onda de "roupas de rica" na internet

Numa época em que a gente vê centenas de postagens no Instagram com influencers mostrando " bermuda de rica, calça de rica, camisa de rica gastando pouco, a gente percebe que  a moda está se tornando cada vez mais democrática  e também acessível.

Ah, e não vamos esquecer a estampa de rica, ( sim elas existem e fazem muito sucesso) que muitas especialistas de estilo mostram na internet, para que as pessoas não errem na hora de se vestir. E olha que tem lojas caríssimas também especializadas em roupas estampadas.

Um exemplo é a personagem Celina, que usa e abusa de estampas mas sóbrias e combinadas utilizando tecidos mais nobres e uma combinação que fica extremamente elegante.

Então, fica o questionamento, será que não tá na hora de rever essa paleta de estereótipos? Porque, sinceramente, a vida real anda dando aula de styling que nem o figurino das novelas está acompanhando.

Pelo que sabemos, Raquel dará uma grande virada na vida e ficará rica e com isso, lógico, mudará o estilo, a paleta de cores, o visual inteiro, e confesso, não vejo a hora de ver a linda Tais Araújo em um visual mais neutro e moderno.

Mayra Soares, consultora de imagem e estilo e especialista em coloração pessoal do Imagem em Cena, nos deu uma explicação sobre o assunto: 

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