Colunas

Desde Odorico Paraguaçu, as novelas retratam o Brasil nas urnas

Estação NT


OdoricoParaguacu-OBemAmado.jpg
Odorico Paraguaçu marcou a história da teledramaturgia em "O Bem Amado"

Há 25 anos, Marco Aurélio, o corrupto vivido por Reginaldo Faria na novela “Vale Tudo”, fechou o último capítulo com a famosa cena em que dá uma banana para a Baía de Guanabara enquanto foge em um jatinho.

No mesmo ano, em 1989, o ingênuo Sassá Mutema (Lima Duarte) se tornava marionete na mão de políticos na trama de “O Salvador da Pátria”.

Uma década antes, Odorico Paraguaçu (Paulo Gracindo) colocava no imaginário do telespectador brasileiro a figura do prefeito cheio de artimanhas em “O Bem Amado”, enquanto na atual novela das 21h da Globo, “A Lei do Amor”, o núcleo principal é uma família que criou a sua fortuna a partir da corrupção política.

A lista de exemplos é extensa, já que a novela no Brasil retrata políticos inescrupulosos desde a sua modernização, quando começou a mostrar personagens e enredos mais próximos ao cotidiano nacional. Prefeitos de cidadezinhas fictícias (especialidade de Aguinaldo Silva e Dias Gomes), vereadores (seara na qual Aguinaldo Silva já se divertiu também), senadores (como o senador idealista vivido por Carlos Vereza em “O Rei do Gado” de Benedito Ruy Barbosa) e coronéis do sertão (outro tema constante de Ruy Barbosa) estão tão presentes quanto o núcleo humorístico e o par romântico.

Sob o pretexto de retratarem a realidade ou de conscientizar o público, os autores de novelas costumam criar personagens políticos como caricaturas, ora esbravejando em palanques ora sussurrando em gabinetes. Os raros personagens honestos são representados de modo ingênuo, e frequentemente os desonestos repetem diálogos do tipo “chegarei à presidência”.

Na vida real, mais uma eleição municipal se passou este ano, e se o resultado das urnas não foi assustador para uns (vitória de candidatos machistas e racistas, por exemplo), não surpreendeu outros (a reeleição de candidatos com ficha criminal).

Vários fatores influenciam a decisão das eleições, e o espaço da coluna não seria adequado para esmiuçá-los. Porém, se as novelas servem como denúncia (assim acreditam muitos dos seus autores), por que elas não parecem surtir efeito, mesmo após tantas cenas e personagens políticos impactantes?

A resposta pode começar pela pergunta: até que ponto o telespectador brasileiro gosta de se ver retratado nas novelas? Mesmo que façam sucesso, muitas das tramas são acusadas de imoralidade pelos telespectadores, pelas cenas de sexo e violência. Mas não é só isto: ao assistir Marco Aurélio, Sassá Mutema, Odorico e outros políticos na tela, o telespectador se reconhece nela e, ao mesmo tempo, os rejeita. O reflexo se vê nas urnas, nos quais os candidatos alvos de acusações no dia a dia são reeleitos.

O Brasil, como diz a frase, não é para principiantes. Muito antes da série americana “House of Cards”, nossas novelas já davam o recado.


Ariane Fabreti é colunista do NaTelinha. Formada em Publicidade e em Letras, adora TV desde que se conhece por gente. Escreve sobre o assunto há sete anos.

Mais Notícias

Enviar notícia por e-mail


Compartilhe com um amigo


Reportar erro


Descreva o problema encontrado