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Sangue na novela e risadas no programa policial. A TV parece um tanto confusa

Estação NT


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Reprodução

Em sua entrevista ao “Roda Viva”, da TV Cultura, no último dia 11 e também ao jornalista Nilson Xavier, do UOL, o autor Aguinaldo Silva divulgava o seu novo livro, “Turno da Noite”, no qual conta as suas experiências como repórter policial, quando soltou que os programas policiais televisivos são “circos trágicos” e que “a indignação de certos apresentadores lhe soava falsa”.

No dia seguinte, Datena respondeu acidamente durante o “Brasil Urgente”: trágicas eram as cenas escritas pelo autor em suas novelas, “que banalizavam a família e as relações sociais”.

No chumbo trocado entre o novelista e o apresentador, são colocados em campos opostos dois formatos que ajudaram a moldar os costumes televisivos dos brasileiros, ou seja, as novelas e os programas policialescos. Estes últimos importados dos Estados Unidos, onde são levados a sério, enquanto as atrações policiais por aqui ganharam uma característica bem local: o uso do humor, ainda que beirando o constrangedor. As novelas, por sua vez, se lançam cada vez mais do chamado “realismo”.

À frente do “Cidade Alerta” na Record, Marcelo Rezende populariza bordões, faz piadas com os repórteres antes de noticiar homicídios, dá apelidos a criminosos e troca piadas (usando inclusive o cenário da atração) com Percival de Souza, veterano do jornalismo investigativo. A atmosfera humorística resvalou para as atrações regionais, e o reality “Polícia 24h”, da Band, produz edições que ressaltam o cômico por trás dos atendimentos policiais mostrados na tela, a ponto de se tornarem memes na internet. Mais sóbrio, Datena também abre espaço discretamente para o humor na mesma emissora. Em todos os casos, a audiência responde, entusiasmada.

Os programas “mundo cão”, que tomaram conta da TV brasileira no início dos anos 80, já usavam o exagero e o ridículo para se aproximarem daquele que acreditavam ser o telespectador ideal (com pouca escolaridade e sem ter meios para denunciar a violência que sofria nas grandes cidades).

A narração teatral de Gil Gomes no “Aqui Agora”, do SBT, e as explosões de fúria de Alborghetti moldaram toda uma geração.

Mas como apontado antes, o problema é o curto-circuito entre os gêneros. Produtos de ficção que exibem cenas cruas em nome da verossimilhança (o último capítulo de “Império”, novela de Aguinaldo Silva, foi um banho de sangue em família), enquanto as atrações policiais e investigativas se apoiam no cômico e no verniz de ficção para conquistarem um público talvez cansado da brutalidade urbana (tal categoria inclui o “Profissão Repórter” da Globo com suas câmeras apressadas estilo MTV).

Antes de trazer respostas, a coluna quer, neste caso, levantar perguntas. Mas o caminho talvez seja analisar a mistura entre público e privado que sempre pautou as relações no Brasil, desde que a ligação entre os colonizados e os exploradores ficou pouco clara por aqui, e a violência deu o tom. A televisão apenas espelharia toda esta confusão.


Ariane Fabreti é colunista do NaTelinha. Formada em Publicidade e em Letras, adora TV desde que se conhece por gente. Escreve sobre o assunto há sete anos.

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